quinta-feira, 29 de setembro de 2022

A eleição começa a se despolarizar

O movimento de Lula ao centro e do centro em direção a ele criou outra dinâmica nesta eleição, enquanto Jair Bolsonaro se isola em seu radicalismo

Os candidatos a presidente Lula (PT) e Bolsonaro (PL)Os candidatos a presidente Lula (PT) e Bolsonaro (PL) Arquivo

A eleição está se despolarizando. Não é mais apenas dois grupos opostos que se enfrentam. Formou-se uma onda de declarações de voto em favor de Lula que reúne ex-ministros do Supremo, economistas de diversas tendências, cientistas sociais, ex-ministros do governo Fernando Henrique, artistas que não votariam no PT, milhões de cidadãos e cidadãs. A natureza desse movimento, que não se viu em outras campanhas, vai além do próprio Lula. É o corpo da democracia reagindo aos ataques. Foram tantos, tão constantes, estão ainda presentes no ar que, mesmo sem articulação, formou-se esse arco de autoproteção nestes dias prévios da escolha coletiva.

Escrevi aqui algumas vezes que nesta eleição nunca houve dois extremos se enfrentando. Havia e há apenas um único extremista. Jair Bolsonaro, ao longo do tempo, só confirmou essa visão com seus atos e palavras. Lula, por seu lado, fez movimentos ao centro, e o centro caminhou em direção a ele.

Muitos dos que declaram apoio não deixam de lembrar que têm, eventualmente, divergências, como acontece com os economistas, mas todos afirmam que Lula reúne as melhores condições para derrotar o projeto autoritário encarnado por Bolsonaro. O presidente alimentou esse isolamento com os seus seguidores. Mesmo nestes tempos finais, seu partido, seu entorno, os militares a ele ligados permanecem afligindo a nação com problemas inexistentes no sistema eleitoral.

Ontem, o TSE abriu a sala da totalização dos votos à visitação, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, ciceroneou os fiscalizadores e observadores que quiseram entender todos os detalhes. A primeira evidência que saltava aos olhos era que a sala era clara e transparente. O ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, circulavam entre os visitantes. O notório presidente do PL admitiu que realmente não há “sala escura”, para horas depois o seu partido colocar em dúvida de novo as urnas eletrônicas, recebendo de volta uma forte nota do TSE. O general não disse nada às claras, mas continua rondando o Tribunal, como uma sombra sinistra de outros tempos.

Hoje, os candidatos estarão frente a frente no debate da TV Globo, última chance de Bolsonaro levar a disputa para o segundo turno, e Lula garantir a vitória no primeiro turno. Um por cento que se mova para um lado ou para o outro, e o resultado será diferente. Por isso, todas as atenções do país estarão voltadas para o debate. Bolsonaro terá o auxílio de um suposto padre que a lei eleitoral permite que participe. Kelmon atuou como um ajudante de ordens de Bolsonaro no debate da semana passada. Bolsonaro pode ter também a ajuda de Ciro Gomes, se o pedetista insistir na sua estratégia de atacar mais a Lula.

Bolsonaro chega ao debate com uma intenção de votos menor do que sua votação em 2018, em 14 estados e no Distrito Federal, segundo levantamento do Pulso, publicado neste jornal no último domingo. Em 11 estados, manteve ou cresceu. Está atrás de Lula em estados mais populosos. Em São Paulo, perde por 11 pontos, em Minas, por 18 pontos, no Ipec.

Lula chega ao debate em um momento surpreendente nos últimos dias com a série de declarações de votos a seu favor, um movimento que transcende a ele mesmo. Há sempre ondas de última hora, e a que se formou nesses dias favorece Lula.

Ciro chega muito menor politicamente do que já foi. Ele encerrou o primeiro turno de 2018 tendo 12%dos votos, mas a última pesquisa Ipec deu 6%. Teve 40% dos votos no Ceará, agora tem 10% das intenções de votos em seu estado. Nesta quarta campanha presidencial da qual participa, Ciro acumula derrotas.

Simone chega ao debate com o mesmo percentual de votos de Ciro, mas em um momento inteiramente diferente. É a primeira vez que se candidata, é a primeira vez que seu partido lança uma mulher, e ela tem tido excelente desempenho nos debates.

No meu livro “Democracia na Armadilha”, coletânea de colunas aqui publicadas sobre o governo Bolsonaro, há um texto sobre o discurso de posse do atual presidente em que o título foi “Dividir até na hora de somar”. Bolsonaro optou desde o começo pelo conflito. A última coluna do livro tem o título “A democracia morre no fim desse enredo”. O que a sociedade brasileira está fazendo, em tempo real, é tecendo uma rede de proteção à democracia para evitar esse final trágico.

Miriam Leitão com Alvaro Gribel (de São Paulo) para O Globo, em 29.09.22 às 04h31  

Já passou da hora de cobrar que Lula detalhe suas promessas

Eleição é para Presidente da República, não para santo

Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa de ato com artistas e apoiadores em São PauloEx-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa de ato com artistas e apoiadores em São Paulo Ricardo Stuckert

Estamos a poucos dias de um voto para presidente que pode até ser definitivo, dado que as pesquisas de opinião mostram haver chance de Luiz Inácio Lula da Silva ganhar a eleição já no primeiro turno. Nos bastidores da campanha bolsonarista, o desânimo é flagrante, e até os meninos da outrora olavista Brasil Paralelo foram dar uma pinta no jantar de Lula com os empresários.

Pode até ser que nos grotões esteja acontecendo algo diferente e que Bolsonaro esteja ganhando força para virar o jogo e vencer a eleição no segundo turno. Mas o visível, agora, é que as elites do país estão se rendendo a Lula sem dificuldade nem prurido.

Para aqueles que já tinham boas relações com o petismo, o momento é de glória. Nos bastidores do jantar com os empresários, penúltimo ato da campanha lulista (o último será o debate da TV Globo, hoje), o dono do BTG, André Esteves, e o presidente do conselho do Bradesco, Luiz Trabuco, foram tratados com carinho, como velhos amigos que são.

Outros registraram presença apenas para poder dizer no futuro que nunca foram de fato antilulistas — estavam só defendendo os próprios negócios. Como um integrante do Centrão que me ligou outro dia, às gargalhadas: "Será que você poderia registrar aí que, quando Lula estava preso, eu fui dez vezes a Curitiba, incógnito, gritar 'bom dia, Lula; boa noite, Lula'?".

Quem conhece a forma como as placas tectônicas do poder se arranjam conforme a necessidade não tem por que se espantar. Há quase dois anos, Arthur Lira definiu num artigo que o Centrão é uma “força moderadora”, a “quilha da nau da democracia”. Vai ver é isso mesmo, e talvez seja o caso de comemorarmos.

Não fosse o Centrão o que é, poderíamos ter uma crise de grandes proporções com a chegada de Lula ao Planalto, uma revolta da maioria parlamentar conservadora contra um esquerdista em minoria.

Como o Centrão é o que é, muito provavelmente o que se verá em Brasília, uma vez proclamado o resultado das urnas — agora ou no segundo turno —, será uma acomodação. Para que seja razoavelmente tranquila, dependerá apenas de que se acerte quanto custará.

Não é mais novidade, nem chega a ser escandaloso. Quem assiste aos debates e entrevistas com os candidatos fica com a impressão de que é a coisa mais normal do mundo Lula se defender de acusações a respeito do mensalão retrucando que “o orçamento secreto é muito pior”.

De outro lado, quem já não ouviu aí algum bolsonarista dizer que as rachadinhas dos Bolsonaros ou a propina do Ministério da Educação depositada em pneus não chegam a ser problema porque, no petrolão dos governos petistas, a corrupção ocorria em escala muito maior?

Desinformação na reta final: Grupos bolsonaristas disseminam fake news sobre urnas ‘abertas’ em sindicato de SP

"O povo está cansado de discutir corrupção", disse um analista que ouvi no rádio outro dia. "Isso não comove mais ninguém".

É compreensível que a corrupção tenha se tornado um problema menor diante do avanço da pobreza, da debacle educacional e da deterioração institucional que temos presenciado. A desorganização no tecido social produzida pelo bolsonarismo é tão grande que muitas coisas tomaram a frente na lista de prioridades.

O que deveria preocupar é essa mesma desorganização ter geraado em setores da sociedade certo espírito bovino, que impede qualquer debate mais profundo sobre o que se pode esperar de um eventual governo Lula.

Tensão na Polícia Federal: Reta final da eleição provoca fogo cruzado entre delegados

O PT divulgou um programa cheio de compromissos genéricos, como “colocar o povo no orçamento”, fazer uma “reforma do Estado” ou voltar a investir em educação. Prometeu depois trazer um texto mais detalhado. Contudo não trouxe.

O próprio Lula explicou que não precisa fazer promessas, porque todos já sabemos como foi seu governo e conhecemos o legado que deixou. Dizer que já passaram 20 anos de sua primeira eleição e que o Brasil já mudou muito é chover no molhado, mas nem por isso deixa de ser verdade.

Eleições 2022: Brasil tem recorde de pesquisas eleitorais, mostram registros do TSE

Ainda assim, virou lugar-comum dizer que não é hora de cobrar ou de criticar Lula, porque há algo maior em jogo — restabelecer a própria democracia. Em nome da democracia, estão combinando que o Brasil dará um cheque em branco ao petista, porque cobrar ao líder nas pesquisas que detalhe suas propostas é uma atitude antidemocrática.

É bom lembrar apenas que esta não é uma eleição para santo ou para escolher um novo mito. Os problemas continuam, e o dia seguinte será duro. A esta altura, já deveríamos ter aprendido que a luta do bem contra o mal só existe nas histórias em quadrinhos ou nos vídeos toscos da extrema direita.

Os empresários que foram ao jantar com Lula sabem muito bem disso. Mas sabem se defender. A nossa democracia, talvez não.

Malu Gaspar para O Globo, em 29.09.22 às 04h30  

Aperfeiçoando os privilégios

Militares têm participado de ‘cursos de aperfeiçoamento’ não para melhor servir ao País, mas para engordar seu holerite

Um levantamento do Estadão com base em dados do Ministério da Defesa mostrou que, entre 2019 e agosto deste ano, 4.349 militares, sobretudo da Marinha, concluíram o curso de aperfeiçoamento para “Assessoria em Estado-Maior para Suboficiais”, que dura, em média, oito semanas. Desse total, 1.932 militares (44%) já se aposentaram e outros 178 (4%) estão em processo de transição para a reserva. Ou seja, quase a metade desses oficiais e suboficiais, qualificados às expensas dos contribuintes, deixou de prestar serviços ao País pouco após obter a qualificação. É lícito inferir, portanto, que muitos militares possam ter frequentado esses cursos apenas como meio para melhorar a remuneração na aposentadoria. 

A manobra está assentada na reforma da previdência dos militares, aprovada em 2019 sob os auspícios do presidente Jair Bolsonaro, político que fez carreira na defesa dos interesses das Forças Armadas. Portanto, esse acréscimo de vencimentos às portas da aposentadoria não é ilegal, mas é claramente imoral. Trata-se de inaceitável privilégio, algo que não se coaduna com a ideia de República que este jornal defende.

A respeito desse tratamento especial que as Forças Armadas recebem do governo, o Ministério da Defesa argumenta que o destino de mais recursos públicos para os militares serve para que as Forças se capacitem para melhor servir ao País. É uma contradição: afinal, os recursos extraordinários – que representam até 66% de aumento nos rendimentos desses militares – não servirão para capacitar os oficiais para seu serviço ao País, e sim para lhes garantir uma aposentadoria mais confortável, já que, diferentemente da maioria absoluta dos brasileiros, recebem o salário integral quando deixam de trabalhar.

Não se trata de um benefício isolado. Ao contrário do que ocorreu com quase todas as categorias do serviço público – sem falar nas discrepâncias em relação aos trabalhadores da iniciativa privada –, as Forças Armadas têm sido amplamente agraciadas pelo atual governo.

Desde a já referida reforma da previdência específica para a categoria, extremamente benevolente em relação às normas previstas para os demais servidores públicos, até a criação de mecanismos para permitir o pagamento de salários muito acima do teto constitucional para alguns oficiais, foram muitos os instrumentos gestados no Palácio do Planalto para privilegiar os militares. Enquanto pastas cruciais para o desenvolvimento humano, como Educação e Saúde, perderam recursos para investimentos, por exemplo, o Ministério da Defesa viu seu orçamento crescer substancialmente em relação a governos anteriores.

A crítica a esse tratamento diferenciado dado aos militares pelo atual governo não significa, por óbvio, defender o contrário, ou seja, que os militares deveriam ser simplesmente negligenciados no Orçamento. Trata-se de enfatizar que um bom governante tem discernimento para fazer boas escolhas políticas diante da escassez de recursos. Mas sabedoria e espírito público são atributos que Bolsonaro jamais teve – ou terá. 

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo, em 29.09.22às 03h05

A intolerável ameaça de Bolsonaro

A poucos dias da eleição, o presidente continua ameaçando descumprir a vontade do eleitor. O País não pode ser refém do golpismo. As instituições têm os instrumentos para puni-lo

   O presidente da República, Jair Bolsonaro, manifestou mais uma vez sua disposição de não respeitar a vontade do eleitor caso esta lhe seja desfavorável. Este jornal, que considera a alternância no poder e o respeito às instituições como algumas das mais preciosas bases da democracia, entende que é inaceitável que qualquer candidato, sobretudo na condição de presidente da República, lance suspeitas infundadas sobre o processo eleitoral e sobre a lisura da Justiça Eleitoral, tentando, assim, deslegitimar o resultado das urnas. 

No Jornal da Record, quando o repórter lhe perguntou se aceitará o resultado das eleições caso seja derrotado, Bolsonaro respondeu: “Olha, eu vou esperar os resultados”. Na sequência, ainda levantou suspeitas sobre a imparcialidade da Justiça Eleitoral. Escancaram-se, assim, suas pretensões golpistas. As instituições precisam estar em alerta máximo.

Seguindo a cartilha do mau perdedor, Bolsonaro começou já em 2020 suas agressões ao sistema eleitoral, afirmando que as urnas eletrônicas eram suscetíveis de fraude. Depois, foi além, e, sem nenhum indício digno de nota, muito menos prova, disse que as eleições de 2014 e as de 2018 foram fraudadas.

Bolsonaro afirma que as urnas não são auditáveis. Mentira: elas têm 10 camadas de auditoria e seu código-fonte é aberto à inspeção das instituições. Afirma que as urnas são vulneráveis a ataques de hackers. Mentira: elas não entram em rede nem são acessíveis remotamente.

Se é lamentável que as instituições e as inúmeras demonstrações de integridade das urnas não tenham contido a estratégia sediciosa do presidente da República, é também um sinal do fracasso do bolsonarismo que ele não tenha logrado arrastar o mundo-político institucional para suas teses – e práticas – conspiratórias. Nenhum ator político relevante – nem sequer seus asseclas do Centrão –, nenhum dos Poderes da República, nenhuma instituição da sociedade civil corrobora sua desconfiança. Ainda assim, o presidente incitou o Ministério da Defesa, na tentativa de implicar as Forças Armadas, a realizar uma “apuração paralela” e flagrantemente inconstitucional das urnas. Chegou ao absurdo de convocar embaixadores internacionais para declarar que nossa democracia é fraudulenta.

É paradigmático que em 2021, quando o coronavírus ainda dizimava a vida de milhares de brasileiros e fustigava a economia do País, Bolsonaro tenha sequestrado a agenda do Congresso para uma pauta natimorta e sem nenhum clamor popular: o voto impresso. “Vai ter voto impresso em 2022 e ponto final”, disse na ocasião em mais um arroubo autoritário. “Se não tiver voto impresso, é sinal de que não vai ter eleição.” Nada exprime melhor, quase que literalmente, a cortina de fumaça ininterruptamente regurgitada pelo Palácio do Planalto para disfarçar o seu desgoverno que a fuligem preta dos blindados mobilizados por Bolsonaro para intimidar o Parlamento no dia da votação sobre o voto impresso.

A ex-presidente Dilma Rousseff exprimiu os sentimentos de muitos políticos – incluindo o do próprio clã Bolsonaro – ao afirmar que “pode fazer o diabo quando é hora das eleições”. O presidente vai além, e se mostra disposto a fazer o diabo para subvertê-las. Bolsonaro, que encerrou sua carreira militar com ameaças de bombas a quarteis, agora ameaça implodir o resultado das urnas.

É inaceitável que paire, após três décadas de redemocratização, o fantasma do golpe sobre as eleições. Ainda que Bolsonaro reedite com estonteante frequência suas acusações fraudulentas, não é tolerável normalizar esta atmosfera de exceção. 

Mas só notas de repúdio não bastam. Há meios legais para punir eventuais atentados ao processo eleitoral. Há a legislação eleitoral, há a Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito e há a Lei dos Crimes de Responsabilidade. Bolsonaro já é investigado pelo TSE por difundir informações falsas sobre o processo eleitoral. A Constituição legou ao Ministério Público, à Polícia Federal, ao Judiciário e ao Congresso todos os instrumentos necessários para impedir que as ameaças de Bolsonaro à liberdade política dos brasileiros e seus crimes contra a vontade do eleitor não fiquem impunes. 

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo, em 29.09.22 às 03h00

Quando se começa a normalizar o autoritarismo, fica muito difícil reverter, diz analista americano

Brian Klaas, autor do livro ‘Corruptíveis’, fala sobre os perigos à democracia vividos em países como Brasil e EUA e avalia como agem os líderes políticos desses locais

Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e Jair Bolsonaro, presidente do Brasil  Foto: Tom Brenner / Reuters

“Quando você começa a normalizar o autoritarismo, a corrupção e as violações anti-democráticas, as pessoas começam a aceitar isso e fica muito difícil reverter”. Essa frase do analista político americano Brian Klaas reflete a preocupação de muitos eleitores no Brasil e em diferentes países que passaram por testes democráticos nos últimos tempos, entre eles os Estados Unidos, que viram o Capitólio ser invadido por partidários de Donald Trump no dia 6 de janeiro, data em que o Congresso estava reunido para certificar a vitória de Joe Biden como novo presidente americano.

No livro “Corruptíveis: o que é o poder, que tipos de pessoas o conquistam e o que acontece quando chegam ao topo’', Klaas discute a necessidade de se reformar sistemas para evitar que a corrupção seja uma prática daqueles que detêm o poder. Em conversa com o Estadão, o analista avalia o cenário eleitoral brasileiro, o impacto do discurso anticorrupção e como líderes internacionais continuam colocando a democracia em xeque em seus países.

Por que decidiu escrever esse livro?

Quando eu penso em todo o progresso que fizemos em todas as áreas da sociedade, vejo o quanto avançamos. Mas quando se trata de poder, temos ainda a mesma pergunta que tinham os gregos e romanos na Antiguidade: ‘como colocamos as pessoas erradas no poder?’. Eu queria prover o máximo possível de evidências científicas sobre esse problema e mostrar que é solucionável. Alguns pensam que é um problema inerente à humanidade, mas acho que podemos reformar os sistemas e fazer com que eles funcionem e, assim, ter melhores pessoas no poder.

Mas a corrupção está presente em todos os níveis de nossa sociedade.

Quando se tem a cultura da corrupção e sistemas que permitem a corrupção, isso atrai pessoas corruptas. De maneira geral, eu digo, sistemas errados atraem pessoas erradas. As pessoas tendem a culpar o outro, mas seria muito mais útil se a gente começasse a pensar nos sistemas que criam esse outro nessas posições de poder. O ditado diz que o poder corrompe. O livro fala que isso é totalmente verdadeiro, mas acredito que há uma necessidade de reformar o sistema primeiro para que ele funcione direito. Se você não é corrupto, precisa achar esse sistema atrativo. Os políticos brasileiros modernos não parecem tão atrativos porque temos um sistema que está afetando a estrutura de poder. E essas reformas podem vir de um líder que está disposto a fazê-las ou por pressão da sociedade.

Qual é o impacto das fake news nesse processo?

A política está se tornando disfuncional porque as pessoas não concordam mais sobre o que é real e o que é falso. A democracia requer o compartilhamento de um senso de realidade, no qual temos de concordar sobre o que está acontecendo antes de descobrir como arrumar. O problema é que se a realidade está sendo questionada, a política se torna um palco para essa espécie de guerra entre discursos, um ambiente de polarização disfuncional. Ninguém quer que isso se perpetue, a não ser que seja para ter mais poder.

Quantas pessoas querem passar o dia tendo mentiras contadas sobre elas, tendo de discutir constantemente o que é verdade e o que é mentira e cercadas de gente corrupta? Esse problema volta ao ponto de que certos tipos de pessoas se colocam em determinadas situações em troca de poder. E isso é mediado pelo sistema. Então, o sistema é cheio de fake news e cria problemas piores do que os que já existem. Para os eleitores, isso é problemático porque não se consegue avaliar alguém sem saber o que é real e o que é falso.

Qual é a importância das eleições?

As eleições podem ser muito úteis se funcionarem direito. Se há um bom trabalho dos jornalistas e uma boa avaliação dos eleitores, demandando as informações que os políticos não dão, a eleição pode ser muito útil porque é a oportunidade de o público avaliar o que quer dos que estão no poder. O problema vem quando se há informações que mostram que determinada pessoa está na política apenas pelo poder, e ainda assim alguns eleitores votam por esse candidato, em parte por conta de uma lavagem cerebral e das propagandas. Vladimir Putin é genuinamente popular na Rússia, por exemplo. Mesmo se as eleições fossem livres lá, ele provavelmente ganharia.

Temos a ideia de que se mostrarmos ao povo que determinada pessoa é corrupta e só quer o poder, então ela vai perder a eleição, e isso não é verdade. Acredito que parte disso se trata de avaliarmos nós mesmos, o que significa para a nossa sociedade ver que um número razoável de eleitores continua votando por alguém, sabendo o que de errado essa pessoa está fazendo? Isso, acredito, se aplica ao Brasil. Há uma questão que é: por que tanta gente, apesar das acusações óbvias contra (Jair) Bolsonaro, continua apoiando o presidente? Aqui a resposta não é apenas a desinformação, mas também as crenças sobre para que serve o poder. E, infelizmente, muita gente na política moderna - e isso é verdade tanto nos EUA quanto no Brasil - enxerga o poder como uma forma de ir atrás do seu inimigo, e não como uma forma de alcançar metas e melhorar vidas. Quanto mais a política se tornar uma batalha entre quem vence e quem perde, e menos uma forma de realizar ações concretas, mais teremos as pessoas erradas no poder.

Como a busca por soluções fáceis e rápidas influencia a continuidade de sistemas corruptos?

Durante momentos de crise no passado, e digo na idade da pedra mesmo, era razoável se voltar ao líder e pedir que ele solucionasse o problema de uma invasão, por exemplo. Em tempos de guerra, fazia sentido se voltar para alguém fisicamente mais forte. Mas esse sentido foi se adaptando. Agora, temos a tendência de nos voltarmos para quem fala ‘vou resolver isso para você’, quando na realidade sempre que se enfrenta uma situação complexa e problemática - como a atual no Brasil - você precisa de alguém que diga ‘será difícil, haverá custos’. Mas ninguém votará por essa pessoa. Por que continuamos sendo seduzidos por quem nos vende mentiras e promessas que não serão cumpridas? Por que continuamos sendo enganados? Parte do entendimento para combater isso é compreender que o seu ímpeto inicial é achar a solução simples e a resposta imediata.

Qual é o papel da religião nesse contexto?

Depende muito da sociedade. Em algumas, a religião tem um papel muito limitado na política; em outras, tem um papel determinante. Religião é uma área que pode se tornar uma espécie de fiscalizador do poder. Por exemplo, se você vive em uma sociedade onde o líder religioso tem legitimidade política, ele tem a posição única de criticar os que estão no poder de uma forma que pessoas comuns não poderiam e a população vai escutar. O poder religioso, isso eu posso dizer, está sujeito aos mesmos problemas do poder político. Muitas vezes, as pessoas abusam do poder religioso num sistema que não está regulado minimamente.

Falando dos EUA, é possível calcular o impacto do governo Trump para a democracia?

Sim, foi um dano enorme. Primeiro porque, e aqui existe um paralelo com o Brasil, a democracia basicamente funciona de acordo com normas e Trump violou quase todas. Como resultado, ele tornou essa prática normal. Então, as novas gerações de republicanos estão fazendo as mesmas coisas, testando o sistema como ele testou e agora vemos riscos significativos ao processo democrático. O problema maior é que o partido dele, o Republicano, está se tornando autoritário e vimos isso com o episódio de 6 de janeiro. O que acho preocupante sobre isso é que quando você começa a normalizar o autoritarismo, a corrupção e as violações anti-democráticas, as pessoas começam a aceitar e fica muito difícil reverter porque vira parte do novo normal em nossa política.

Acredito que o sistema democrático dos EUA está sob risco e o país pode se tornar não democrático em anos ou décadas. Isso seria terrível para os EUA e para o mundo, porque é o país com o maior quintal democrático no mundo. É muito falho em muitos aspectos, mas um mundo liderado pela China seria muito mais negligente com as leis, em minha opinião. E aqui acredito que há um paralelo com o Bolsonaro, quando começamos a considerar que o que ele faz é aceitável como comportamento político porque ele simplesmente fez coisas que antes eram inaceitáveis.

Falando do Brasil, vemos em alguns discursos políticos que vale tudo em nome do combate à corrupção. Qual é o perigo desse discurso?

O principal a se ter em mente é que proteger o sistema da democracia é mais urgente do que qualquer outra questão que exista, mais do que a questão da corrupção. E a razão para isso é que uma vez que a democracia se vai é muito, muito difícil recuperá-la. A maioria dos países que analisei onde a democracia havia sido quebrada, ela não havia sido recuperada, os países continuam sendo autoritários ou ditaduras, uma completa bagunça. É muito mais fácil defender o que resta da democracia do que tentar trazê-la de volta após ser destruída.

A segunda coisa a se ter em mente é que pessoas que são corruptas e abusam do poder frequentemente acusam seus oponentes de serem corruptos e abusarem do poder. É uma projeção. O problema é que num ambiente de fake news, as pessoas começam a se perguntar o que realmente está acontecendo. Veja o caso Trump: os próprios republicanos acusavam os democratas de serem anti-democráticos e isso é absurdo, mas eles diziam isso e os seus seguidores acreditavam. A corrupção pode ser usada, de forma cínica, como uma arma contra os inimigos. Como o presidente Xi na China ou em países como Madagascar, um presidente diz que vai acabar com a corrupção, mas o que realmente faz é ir atrás para acabar com seus inimigos e o círculo de amigos corruptos do presidente não são investigados ou processados.

Não estou dizendo que não se deveria haver uma preocupação com a corrupção. Apenas digo que é preciso ter cuidado porque qualquer movimento anticorrupção pode ser usado para que as pessoas que estão no poder e as que estão fora sejam tratadas de forma diferente quando agem de forma corrupta.

Qual é a importância de encontros internacionais, como a Assembleia-Geral da ONU, para esse contexto político?

As formas como os líderes internacionais interagem entre eles é um sinal de legitimidade. Ser convidado para um evento internacional é algo que os líderes no poder desejam. O ponto é que há formas diferentes de interagir no cenário internacional e é mostrar que existem consequências para os líderes que tomam determinadas ações. Por exemplo, acredito que alguns líderes não deveriam ser convidados para eventos internacionais em razão de seus atos. Mohammed Bin Salman, da Arábia Saudita, está muito provavelmente envolvido na morte do jornalista Jamal Khashoggi. Ele deveria ser tratado da mesma forma que Joe Biden, Emmanuel Macron e etc? Acredito que não. O mesmo vale para Putin. Acho que ele não deveria ser convidado para eventos internacionais.

A questão difícil é como calibrar isso para alguém como Bolsonaro, que não é a pior pessoa no mundo, existem ditadores que fizeram coisas muito piores que ele, mas que claramente está levando o Brasil para uma direção errada e cometendo sérios danos à democracia. O que é importante é pensar num sistema onde haja consequências para os líderes que se comportam de forma errada. E essa resposta pode vir dos eleitores, dos jornalistas, de cortes anti-corrupção ou juízes. Mas também pode ser uma resposta internacional e pode ser tratar esses líderes como pária. Abuso de poder precisa ter consequências e, infelizmente, aqueles que abusam do poder na esfera política hoje, não enfrentam as consequências. Geralmente não perdem as eleições, não são processados - Trump é um exemplo disso, se fosse qualquer outra pessoa no país já teria ocorrido o processo.

Qual é a importância da imprensa nesse contexto?

A maioria das pessoas não pode interagir com aqueles que estão tentando chegar ao poder. As pessoas comuns no Brasil têm pouco conhecimento do que Bolsonaro realmente está disposto a fazer porque nunca o conheceram, não conhecem seu entorno. Então, esse papel de dar informação sobre as pessoas poderosas recai sobre a imprensa e, por isso, uma das primeiras coisas que os líderes autoritários fazem é atacar a imprensa, tentar calá-la. Por isso, é tão importante defender a imprensa quando um ataque desse ocorre. É uma espécie de última chance de expor o comportamento de abuso de poder porque a imprensa pode dizer coisas que ninguém mais pode.

Como você se sentiu ao entrevistar ditadores para o livro?

O impressionante é que quando se conversa com pessoas que fizeram coisas horríveis, elas não parecem horríveis. Na maior parte do tempo, elas são charmosas, engraçadas e agradáveis. Isso é estranho quando você sabe que está falando com alguém acusado de crimes de guerra, por exemplo, e mesmo assim ri de suas piadas. Mas acho que no fundo a questão é que as pessoas que fazem coisas horríveis ao redor do mundo são, geralmente, muito habilidosas em manipular, são muito boas em fazer os outros gostarem dela.

Você acredita que o contexto pós-pandemia pode facilitar processos corruptos?

As pessoas estão saindo da pandemia exaustas. Em países autoritários, a pandemia permitiu a expansão dos poderes em formas que podem ser problemáticas no futuro. Mas também acredito que a pandemia nos ensinou lições importantes, como a necessidade de cooperar, dividir informações, procurar evidências para tomar decisões. Espero que isso transpareça na política também.

Algo que tento mostrar no livro a todo momento é que a eleição de nossos líderes não é racional. E precisamos pensar com cuidado nas evidências, biografias. Agora, no pós-pandemia, precisamos colocar os holofotes em nossos líderes, até porque alguns deles ganharam poderes excepcionais com a desculpa de conter danos e eles devem devolver essa autoridade. Mas sabemos que, em alguns países, esse estado de emergência será usado para perseguir os oponentes, mesmo que a intenção original da ampliação dos poderes tenha sido dar uma resposta ao aumento da Covid.

Fernanda Simas para O Estado de S. Paulo, em 28.09.22 às 20h57

Tebet carrega histórico de choques com MDB e experiência no Legislativo e no Executivo

Senadora chega à 1ª eleição presidencial em busca de romper polarização e com rachas na coligação

Simone Tebet durante evento do MDB que confirmou seu nome para a disputa à Presidência - Pedro Ladeira - 27.jul.22/Folhapress

A senadora Simone Tebet (MDB) participa de sua primeira corrida presidencial como uma das apostas para tentar romper a polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).

Mulher considerada combativa e com experiência política tanto no Legislativo como em cargos executivos, Tebet busca convencer os eleitores de que representa o novo —apesar de integrar as filas de um dos partidos mais tradicionais da política brasileira. Ela também enfrenta o desafio de crescer em meio aos rachas internos e dissidências que marcam o MDB e sua coligação.

Chega à semana final do primeiro turno em quarto lugar, com 5% das intenções de voto na mais recente pesquisa Datafolha. Alguns aliados, porém, já consideram uma vitória se ela se tornar o emedebista com melhor desempenho em um pleito presidencial, superando os 4,74% de Ulysses Guimarães em 1988.

Nesta semana, a Folha publica textos para explicar ao leitor um pouco mais sobre as trajetórias recentes de Lula, Bolsonaro, Ciro Gomes (PDT) e Tebet —os quatro mais bem colocados nas pesquisas.

TEBET E A BIOGRAFIA

Tebet entrou na política por intermédio de seu pai, Ramez Tebet (1936-2006), político influente em Mato Grosso do Sul e que chegou à presidência do Senado. Advogada e professora universitária, ela migrou para a vida pública e ocupou quatro cargos ao longo de sua trajetória. Foi deputada estadual, prefeita de Três Lagoas (MS) por dois mandatos, vice-governadora e agora conclui seus oito anos no Senado.

Sua campanha ressalta a reeleição como prefeita, com mais de 70% dos votos, como exemplo de sua qualidade de gestão. Como senadora, foi uma das vozes a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016. Apoiou o governo de seu correligionário Michel Temer (MDB), em particular as reformas econômicas, como a implantação do teto dos gastos e a reforma trabalhista.

Tornou-se presidente da Comissão de Constituição e Justiça, a mais importante do Senado. Também enfrentou seu partido e buscou se lançar duas vezes à presidência da Casa que seu pai presidiu. Desistiu de uma delas e foi abandonada pelo MDB na segunda tentativa, derrotada por Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Mesmo sem ser membro efetivo, participou da CPI da Covid e ganhou destaque durante as audiências da comissão, apontando irregularidades em documentos, extraindo declarações comprometedoras dos depoentes e reagindo ao ataque machista do ministro Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União).

TEBET E O MDB

A senadora sempre foi filiada ao MDB. Em suas falas, ressalta a história do partido e o exemplo de nomes como Ulysses Guimarães e Franco Montoro. No entanto, tem um passado e um presente de conflitos com a legenda, tanto em seu estado como em nível nacional. Emedebistas críticos sempre destacam que ela ingressou na sigla "protegida" por ser filha de um quadro respeitado e bateu de frente com caciques.

Em 2018, Tebet se recusou a disputar o governo de Mato Grosso do Sul, após a prisão do ex-governador André Puccinelli (MDB), de quem havia sido vice. Ela pouco teria a perder, uma vez que ainda estava na metade dos seus oito anos de mandato no Senado, mas alegou problemas pessoais e declinou.

Neste ano, seu marido, o deputado estadual Eduardo Rocha (MDB), integrou o governo de Reinaldo Azambuja (PSDB), ao qual o MDB local se opõe. Não à toa, ela teve apertos com palanques em sua base.

Tebet também desafiou o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e chegou a lançar uma candidatura avulsa à presidência do Senado em fevereiro de 2019. Depois abriu mão de concorrer para aumentar as chances de derrotar seu correligionário. Ela declarou voto em Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que venceu a disputa.

Dois anos depois, foi a escolhida do partido para disputar a chefia da Casa. Porém, enfrentou resistência para angariar votos e foi abandonada pelo MDB, que preferiu negociar cargos na Mesa Diretora.

Agora candidata à Presidência da República, vê Renan e a ala lulista do MDB declararem apoio para o candidato do PT. Assim, passou por dificuldades com palanques nos estados. Além disso, em alguns estados o MDB também debandou para o lado de Bolsonaro.

TEBET E O EQUILIBRISMO

A candidatura de Tebet busca tirar votos dos dois polos da corrida presidencial, mas a tentativa de não desagradar os extremos virou motivo de queixas de aliados nos bastidores. Críticos avaliam que ela evita tomar posições mais contundentes em temas importantes. A equipe dela e aliados rebatem essa visão, apontando uma tentativa reducionista de discutir política e de tentar enquadrá-la em certas posições.

Sua campanha explora o fato de ela ser mulher, mas uma das principais agendas do movimento feminista, a legalização do aborto, foi tema mais tratado por Lula e principalmente por Bolsonaro durante o período eleitoral. Ela afirma ser contrária à legalização do procedimento, com exceção dos casos atualmente previstos na Constituição. Defende, entretanto, que ocorra o debate sobre o assunto.

Tebet montou uma equipe econômica de caráter extremamente liberal. Defende o teto de gastos e privatizações, com exceção da Petrobras e de bancos públicos. Tem, ainda, dificuldades para explicar como manterá benefícios sociais nessas condições. Aponta que será com o fim das emendas de relator, recursos do Orçamento distribuídos com base em acordos políticos costurados pela cúpula do Congresso.

TEBET E AS PAUTAS CONSERVADORAS

Tebet se tornou uma das principais adversárias de Bolsonaro, mas uma análise do seu histórico de votação mostra certa proximidade ideológica. Ela votou junto com o governo em praticamente todas as questões econômicas —com a exceção mais notória da privatização da Eletrobras.

A senadora cnsidera a política ambiental do presidente um desastre, mas chegou em alguns momentos a mostrar simpatia com algumas medidas. Defensora do agronegócio, agradou o ex-ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) ao afirmar a ele, numa sessão do Senado, que o "Ibama multa muito e multa mal".

Como presidente da CCJ, articulou derrotas ao governo na questão dos decretos que flexibilizam regras sobre armas. Por outro lado, defende a proposta que permite a posse em propriedades da zona rural.

TEBET E O COMBATE À CORRUPÇÃO

Tebet foi uma apoiadora da Lava Jato e segue dizendo que a operação cumpriu papel importante. Hoje afirma que houve excessos, mas usa suas descobertas para criticar a corrupção em gestões do PT.

Também defendeu a prisão em segunda instância, mas se mostrou contra uma CPI para investigar o Judiciário. Sua equipe ressalta que ela é ficha limpa e não responde por episódios de corrupção. Chegou a ser alvo de ações de improbidade durante seu mandato como prefeita, mas os casos foram arquivados.

Tebet também critica a política do "toma lá, dá cá" e a falta de transparência, mas concordou em indicar municípios para receber recursos ao combate à Covid, numa cota que o governo destinou para aliados.

Renato Machado, de Brasília - DF para a Folha de S. Paulo em 28.09.22 às 23h05

Partido de Bolsonaro questiona urnas às vésperas da eleição, e TSE chama relatório de mentiroso

Tribunal diz que conclusões são fraudulentas e cita que já cassou parlamentares por fake news

Teste Público de Segurança das urnas eletrônicas, feito em maio, em Brasília - Pedro Ladeira - 12.mai.22/Folhapress

Quatro dias antes das eleições, relatório apresentado pelo PL, partido de Jair Bolsonaro (PL), questionando a segurança das urnas eletrônicas fez o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) elevar o tom, chamar o documento de fraudulento, abrir investigação e citar que parlamentares já foram cassados por divulgar informações falsas sobre o pleito.

O TSE afirmou que as conclusões do partido são falsas, mentirosas, fraudulentas e visam tumultuar as eleições.

"Sem nenhum amparo na realidade, reunindo informações fraudulentas e atentatórias ao Estado Democrático de Direito e ao Poder Judiciário, em especial à Justiça Eleitoral, em clara tentativa de embaraçar e tumultuar o curso natural do processo eleitoral", disse o tribunal presidido por Alexandre de Moraes.

O relatório foi divulgado no momento em que Bolsonaro repete insinuações golpistas e aparece em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto a presidente, atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Chamado de "resultado da auditoria de conformidade do PL no TSE", o documento apresentado pelo PL nesta quarta-feira (28) tem duas páginas e afirma que "o quadro de atraso encontrado no TSE" gera "vulnerabilidades relevantes" e pode resultar em invasão interna ou externa nos sistemas eleitorais. "Com grave impacto nos resultados das eleições", diz ainda o partido.

Em nota, o tribunal afirma que "diversos dos elementos fraudulentos" citados no documento do partido de Bolsonaro são objetos de investigações no Inquérito das Fake News, que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal), sob relatoria de Moraes.

O tribunal ainda cita que já cassou parlamentares que divulgaram informações falsas sobre o pleito, e anunciou que enviou o documento do PL ao inquérito do Supremo e para o corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves.

"Para instauração de procedimento administrativo e apuração de responsabilidade do Partido Liberal e seus dirigentes, em eventual desvio de finalidade na utilização de recursos do Fundo Partidário", afirmou o TSE.

O relatório foi apresentado no momento em que a legenda dá sinais divergentes sobre o pleito. Enquanto Bolsonaro tem repetido ataques ao TSE, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, faz acenos à corte. Ele esteve com Alexandre de Moraes na terça-feira (27) e, no dia seguinte, disse que não há "sala secreta" de apuração dos votos, ao contrário do que afirma o mandatário.

A repercussão sobre o documento ainda marca novo episódio de atrito entre Moraes e Bolsonaro.

Na terça-feira (27), o chefe do Executivo disse que Moraes "ultrapassou todos os limites" com a decisão de quebra de sigilo bancário de seu principal ajudante de ordem, tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, por ter atingido gastos da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Há uma série de barreiras de segurança e procedimentos de auditoria e fiscalização que permitem a terceiros, como a PF (Polícia Federal), as Forças Armadas e partidos políticos, fiscalizar a atuação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Não há nenhum caso de fraude confirmada no sistema eletrônico de votação. Ainda assim, Bolsonaro levanta uma série de teorias da conspiração sobre a urna desde antes de chegar ao Planalto.

Neste ano, Bolsonaro ainda tem usado questionamentos feitos pelas Forças Armadas como combustível para os ataques ao sistema eleitoral.

A existência do documento havia sido noticiada pela Veja. O papel foi divulgado à imprensa na tarde desta quarta-feira (28) pelo deputado Capitão Augusto (PL-SP).

Os partidos políticos podem fiscalizar as eleições. O PL contratou equipe comandada pelo engenheiro Carlos Rocha para este trabalho.

"Estes fatos recomendam à alta direção da organização [o TSE] tomar ações de precaução e a realização de auditoria independente do funcionamento da urna eletrônica, na seção eleitoral", disse Rocha à Folha. Ele afirmou que o documento é um resumo de trabalho de 130 páginas.

Questionado sobre a chance de Bolsonaro usar o documento para levantar a tese de fraude no pleito, Rocha disse que "o objetivo do PL é colaborar de forma construtiva com a Justiça Eleitoral".

"Quem audita constrói valor para a organização auditada. O objetivo do PL é colaborar de forma construtiva com a Justiça Eleitoral. Com esta intenção positiva foi marcada uma audiência com o Ministro Alexandre de Moraes ontem, para apresentar os resultados e propor uma auditoria independente do funcionamento da urna eletrônica", disse o engenheiro.

Rocha é fundador do IVL (Instituto Voto Legal), entidade que chegou a ser indicada por Bolsonaro para uma auditoria privada das eleições. Como essa fiscalização não saiu do papel, o PL contratou o engenheiro para representar o partido na análise do pleito.

O relatório foi encaminhado ao secretário-geral do TSE, José Levi Mello do Amaral Junior, no último dia 19.

No email enviado ao TSE, Rocha diz que tenta, desde 1º de agosto, uma reunião para apresentar o relatório "à alta direção do TSE". Em anexo, ele envia dois documentos, sendo que o relatório completo da auditoria ainda não foi divulgado.

"Documentos que descrevem um quadro de riscos elevados de quebra de segurança nos sistemas eleitorais que merecem atenção urgente e medidas preventivas", escreveu.

No documento já apresentado, o partido de Bolsonaro afirma que "o Relatório de Autoavaliação do TSE de 2021 apresentou sete notas zero, dadas pelos próprios servidores do tribunal", em áreas como "gestão de continuidade do negócio, gestão de incidentes de segurança da informação", entre outras.

O PL também afirma que "um grupo restrito de servidores e colaboradores" do TSE controla os códigos-fonte dos sistemas eleitorais.

O tribunal, porém, abriu este código em outubro de 2021 para análise dos partidos. Representantes do PL foram à corte, assinaram uma lista de presença, mas não fizeram a análise.

O relatório também diz que não foram encontrados mecanismos "para proteger estas pessoas expostas politicamente (PEP) [que lidam com o código] contra a coação irresistível, gerando outro risco elevado."

Auxiliares de Valdemar tentam desvincular o presidente do PL da versão de que o relatório vai servir para dar lastro às acusações golpistas de Bolsonaro. Eles afirmam que uma ala bolsonarista do partido decidiu divulgar o texto com este viés.

Valdemar conversou com Moraes sobre o relatório. O dirigente partidário teria afirmado que o espírito da fiscalização é de colaboração, não de contestação, apesar de Bolsonaro já ter citado a auditoria em tom de ameaça ao TSE.

A intenção do presidente do PL seria contribuir com o processo eleitoral, mas não questionar o resultado das urnas, dizem ainda estes interlocutores de Valdemar.

Na avaliação de integrantes do partido ligados ao dirigente, a realização da auditoria e a divulgação do resultado dela também é uma forma de o ex-deputado prestar contas a Bolsonaro e mostrar que endossa seus argumentos para evitar atritos com o mandatário.

Bolsonaro, porém, tem repetido ataques às urnas e insinuações golpistas. Ele se nega a afirmar que vai deixar o poder caso seja derrotado no pleito deste ano.

Aliados do presidente do PL, no entanto, dizem que o dirigente não pretende embarcar em questionamentos ao resultado do pleito.

Nesta quarta-feira (28), Valdemar acompanhou uma visita de representantes de presidenciáveis à sala de totalização dos votos.

"Não tem mais [sala secreta]. Agora é aberta", disse Valdemar ao visitar o setor. O espaço, porém, já era aberto aos partidos e fiscais das eleições em pleitos anteriores.

Mateus Vargas, Julia Chaib e Marianna Holanda, de Brasília - DF para a Folha de S. Paulo, em 28.09.22

As derrotas domésticas de Putin

A resistência cidadã à mobilização parcial abre uma frente interna ao Kremlin após a retirada das tropas na Ucrânia

Um homem observa um grupo de reservistas recrutados da Rússia para a guerra na Ucrânia.(Crédito: Alexey Malgavko - Reuters)

A guerra mudou de direção tanto no campo de batalha quanto na própria Rússia de Vladimir Putin. O Kremlin enfrenta hoje uma resposta interna incomum, quando dezenas de milhares de homens, nem todos jovens, estão fugindo para o exterior para escapar do recrutamento forçado que oculta a declaração de mobilização parcial de tropas na reserva. Manifestações contra a guerra proliferam em todas as grandes cidades, ataques com coquetéis molotov a centros de recrutamento e até um com arma de fogo. Os protestos e boicotes são especialmente intensos nas repúblicas federadas, onde há minorias, menos protegidas que a população russa, e submetidas de fato a uma limpeza étnica camuflada.

Com suas últimas decisões, Putin conseguiu romper um pacto implícito com as classes médias urbanas. Em troca do silêncio sobre a Ucrânia, Putin tentou garantir que a guerra não afetasse seu cotidiano e principalmente sua economia, a ponto de manter o eufemismo de uma operação técnico-militar. A severa derrota sofrida em Kharkov obrigou-o agora a uma mobilização parcial para ter literalmente bucha de canhão suficiente para sustentar a contra-ofensiva do exército ucraniano, decisão que deveria implicar a declaração explícita de guerra. Não se trata nem mesmo de ter novas tropas para recuperar o território perdido, mas apenas para evitar que o território que ainda está nas mãos dos russos fique desprotegido.

O recrutamento de mercenários e prisioneiros em troca de indultos não é mais suficiente. Putin escolheu um caminho aparentemente intermediário com o desejo de obter o mesmo resultado, ou seja, ter 300 mil homens disponíveis nos próximos meses. Esse contingente não é garantido pela convocação de reservistas com experiência de combate, e o obriga a recrutar indiscriminadamente jovens sem experiência militar, homens com idade superior à da reserva e até doentes. A população provável a ser convocada pode ser de cerca de 1,2 milhão de homens.

Embora a pressão de recrutamento seja tanto mais intensa quanto mais distante das grandes cidades e quanto mais carece de influência na Administração e quanto mais desprotegida está a população, no final a convocação acaba por produzir um efeito de desmantelamento e generalização deserção que constitui para Putin uma nova derrota, esta interna, e uma mensagem profundamente desmoralizante para seus partidários. A Rússia também é vítima da guerra de Putin. A debandada que está levando os russos ao exílio terá efeitos negativos na economia e, claro, na vitalidade da sociedade, cada vez mais empobrecida em pessoal técnico, universitário e intelectual.

A resistência cidadã que Putin está enfrentando hoje pode torná-lo mais perigoso também. Não surpreendentemente, o eventual uso de uma arma nuclear por um presidente encurralado se tornou um elemento central da conversa global sobre a Ucrânia. A anexação das quatro províncias ucranianas onde foi encenada a farsa dos referendos de autodeterminação pode ser o primeiro passo. Essas decisões também fazem parte da arrogância intimidadora de quem atualmente governa em Moscou. Os aliados de Kiev não devem se deixar intimidar por ameaças, mas também não devem cair na demonização de toda a população russa , a ponto de fechar as fronteiras para quem busca asilo político nos países vizinhos e ao mesmo tempo dificultar a manobra astuta do recrutamento parcial do falso Putin.

Editorial do EL PAÍS, em 28.09.22

Senado dos EUA aprova recomendação de romper relação com o Brasil em caso de golpe

Em sua defesa da medida, no plenário do Senado, Sanders afirmou que o texto não era favorável a qualquer candidato e sim favorável ao rompimento de relações e assistência militar entre países em caso de um golpe.

O senador americano Bernie Sanders apresentou a resolução aprovada pelo Senado dos EUA

O Senado dos Estados Unidos aprovou por unanimidade, na noite desta quinta-feira (28/9), uma resolução apresentada pelo senador Bernie Sanders e outros cinco senadores democratas para defender a democracia no Brasil.

"Não estamos tomando lado na eleição brasileira, o que estamos fazendo é expressar o consenso do Senado de que o governo dos EUA deve deixar inequivocamente claro que a continuidade da relação entre Brasil e EUA depende do compromisso do governo do Brasil com democracia e direitos humanos."

"O governo Biden deve deixar claro que os Estados Unidos não apoiam nenhum governo que chegue ao poder ao Brasil por meios não democráticos e assegurar que a assistência militar é condicional à democracia e transição pacífica de poder", afirmou Sanders.

A medida não contava com apoio declarado de nenhum republicano, mas, pelas regras da Câmara Alta, se nenhum senador objeta a um texto de resolução, ele é aprovado por unanimidade na casa.

A aprovação acontece a apenas 4 dias da eleição presidencial no Brasil e após repetidas acusações, sem provas, do presidente Jair Bolsonaro (PL) de que o sistema eleitoral brasileiro não é seguro e de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é "parcial". De acordo com as pesquisas eleitorais, Bolsonaro, que tenta a reeleição, está atualmente atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"É imperativo que o Senado dos EUA deixe claro por meio desta resolução que apoiamos a democracia no Brasil", disse Sanders.

"Seria inaceitável que os EUA reconhecessem um governo que chegou ao poder de forma não democrática e enviaria uma mensagem horrível para o mundo inteiro. É importante que o povo brasileiro saiba que estamos do lado deles, do lado da democracia. Com a aprovação desta resolução, estamos enviando essa mensagem."

"É a primeira vez em muitas décadas que vemos esse tipo de resolução em relação ao Brasil. Isso não aconteceu nem mesmo durante a ditadura militar", afirmou James Green, historiador da Brown University e presidente do Washington Brazil Institute.

A resolução é a última sinalização de autoridades americanas que iniciaram há alguns meses um movimento contínuo e constante de expressar preocupação com a situação política no Brasil. Apenas esta semana houve ao menos outras duas manifestações públicas.

O presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro repetidamente coloca o sistema eleitoral brasileiro em dúvida (Crédito Reuters)

Na segunda-feira (26/9), o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, disse à BBC News Brasil que "como parceiro democrático, os EUA acompanharão as eleições de outubro com grande interesse".

"Esperamos que as eleições sejam conduzidas de maneira livre, justa e confiável, uma prova da força duradoura da democracia brasileira", acrescentou.

Na terça, apenas seis dias antes de os brasileiros irem às urnas, a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, afirmou em coletiva de imprensa que os americanos "monitorariam" a eleição no domingo e expressou preocupação com a escalada de violência política nas ruas.

"Os EUA condenam a violência e pedem que os brasileiros façam suas vozes serem ouvidas de maneira pacífica", afirmou Jean-Pierre.

Para a cientista política e ex-assessora legislativa no Congresso dos EUA, Beatriz Rey, o movimento é "mais um endosso político para as ações que tanto a Casa Branca quanto o Departamento de Estado já vem tomando".

A expectativa é que os EUA reconheçam o resultado da urna o mais rapidamente possível após o anúncio do vencedor pelo TSE, no próximo domingo ou no dia 30 de outubro, em caso de segundo turno.

A resolução foi apresentação pelos senadores Bernie Sanders, Tim Kaine, chefe do subcomitê de Relações Exteriores do Congresso para o Hemisfério Ocidental; Patrick Leahy, Jeff Merkley, Richard Blumenthal e Elizabeth Warren.

Mariana Sanches - @mariana_sanches, de  Washington para a BBC News Brasil em 28.09.22. /  Este texto foi publicado originalmente em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63070321

segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Brasil precisa renovar seus quadros políticos

'É para rir ou chorar?', pergunta leitor sobre o exposto na coluna de Muniz Sodré. Veja mais o que dizem os leitores na seção de Cartas da Folha de S. Paulo.

Bolsonaro participa de sessão da Câmara para promulgar emenda que permite a militares-médicos acumularem função - Alan Marques - 11.fev.2014/Folhapress

Renovar

O Brasil mereceria renovar muito mais os seus quadros políticos. Ao ver a caricaturesca propaganda eleitoral, às vezes me lembro de pessoas que vi pela última vez há quatro anos, na campanha de 2018. Se eleitos, se tornarão tão invisíveis quanto Bolsonaro conseguiu ser durante 28 anos, em que aprovou apenas dois projetos de lei de sua autoria.

Ademir Valezi (São Paulo, SP)

Responsável

Em "Tiro no pé" (Opinião, 24/9), a menção ao "programa responsável" do primeiro governo de Lula aparece não só por não ter como deixar de reconhecer que os demais governos foram piores mas para induzir o leitor a associar o "responsável" ao que a Folha entende como tal. Houve privatizações nos governos Lula e Dilma, criticadas, com sinais trocados, tanto pelo PT como pelo PSDB. Ao exigir a combinação "liberalismo econômico e responsabilidade social", o ultimato da Folha esqueceu Collor, FHC e Temer. Eles atenderam, com louvor, apenaso primeiro quesito, estando, portanto, reprovados.

José Zimmermann Filho (São Paulo, SP)

Providencial o editorial "Tiro no pé". É mesmo fundamental que o Brasil saiba, e antes da votação, qual a direção e o sentido da quinta gestão petista. Não esqueçamos que as gestões anteriores mostraram, por um lado, a realização do sonho cidadão do país para todos. Por outro, uma danosa e contundente face oculta, ancorada nos vícios da política tradicional.

João Carlos Araújo Figueira (São Paulo, SP)

Economia

É espantoso como existe tanta gente ingênua ou desmemoriada, que ainda se ilude com uma sensação de melhora (temporária, eleitoreira e artificial, é bom que se diga) na economia ("Otimismo com economia bate recorde do governo Bolsonaro, diz Datafolha",Mercado, 24/9). Será que não conseguem perceber que essa melhora é passageira e aconteceu apenas por puro desespero do presidente que tenta a todo custo se reeleger? Esperem para ver os preços de combustíveis depois da eleição.

Ary Braz Luna (Sumaré, SP)

Deveres

São óbvias as inconsistências das proposições desenvolvidas por Rubens Ricupero para ilustrar seu apoio à candidatura de Lula ao Planalto ("O dever dos neutros 2", Tendências / Debates, 24/9). O diplomata tenta caracterizar o atual presidente como uma ameaça ao Estado de Direito. Essa postura é contrária à realidade, pois quem está atacando a valer o ordenamento jurídico pátrio são aqueles membros do STF que promovem ilegalidades, como o aberrativo inquérito das fake news. No Brasil de hoje, o mais significativo defensor da Lei Maior é Jair Bolsonaro.

João Paulo Zizas (São Bernardo do Campo, SP)

Rubens Ricupero no lançamento do livro "O Brasil Não Cabe no Quintal de Ninguém" - Mathilde Missioneiro - 26.set.2019/Folhapress

Perfeito o artigo do diplomata Rubens Ricupero. A escolha atual é entre a civilização e a barbárie, a democracia e a ditadura, o respeito e o desrespeito, a liberdade e a repressão.

Marcos Barbosa (Casa Branca, SP)

Com argumentos incontestáveis e sólidos, com sua história de competência e seriedade e o reconhecimento diplomático que representou quando o Brasil era respeitado internacionalmente, Rubens Ricupero faz seu alerta mais uma vez para que a cegueira não tome conta da maioria dos brasileiros no próximo domingo.

Sebastião Galinari (São Paulo, SP)


Se Lula ganhar

O artigo de Marilene Felinto neste domingo ("Se Lula ganhar", Ilustrada Ilustríssima) é importante. Esclarece para todos os que fomos vítimas do Lulo-petismo e da desgraça econômica de Dilma 2, o quanto o fanatismo petista é cego e dono de uma narrativa própria e fantasiosa sobre o famigerado golpe de uma presidente irresponsável fiscalmente e eleita com bilhões em corrupção. Nada poderia ser mais divertido, não fôssemos todos vítimas dos 13 anos de desgoverno do PT.

Tomas Cunzolo Júnior (São Paulo, SP)

Li o texto de Marilene Felinto com o coração disparado. Ali estão todas as nossas inquietações e medos. Se Lula ganhar, como reagirá a imprensa? "Vão inverter de novo o lide. Vão esconder de novo o fato, jogá-lo para o fim do texto?". Ocorrerá a "distorção da realidade pela imprensa a um governo de esquerda"? Que São Francisco de Sales, padroeiro dos jornalistas, e todos os deuses do bom senso favoreçam os homens e mulheres da imprensa.

Ramira Pires (Araraquara, SP)

Voto útil

Comprar a narrativa de que votar no ex-presidente é "votar pela democracia", declarando apoio ao ex-presidiário já no primeiro turno das eleições, constitui, para mim, uma imperdoável desonestidade intelectual. Que a banda podre do MDB, parte do anacrônico, desmoralizado e falido PSDB e os políticos em geral (usando o pior significado de "políticos") apoiem previamente o embusteiro já era esperado. Mas ver pessoas esclarecidas e influentes apoiando o "criminoso inocentado" já no primeiro turno, alegando "defesa da democracia", é de desanimar qualquer um.

José Roberto dos Santos Vieira (São Paulo, SP)

Voto útil no primeiro turno salva vidas. Em três anos, perdemos centenas de milhares de brasileiros para as milícias e para a Covid. Enquanto isso, imóveis são pagos com dinheiro vivo, armas são distribuídas a pessoas prepotentes, violentas e preconceituosas e o orçamento secreto usurpa verba da merenda escolar, da saúde, da educação, da ciência, dos direitos humanos, do meio ambiente.

Maria da Graça Pimentel (São Carlos, SP)

Riso e choro

O artigo "Ferro-velho ao mar" (Opinião, 24/9), de Muniz Sodré, que trata de forma jocosa a compra pelo Brasil de dois porta-aviões e lembra a famosa marchinha composta por Juca Chaves, remete à (eterna?) ridícula condição de nação subdesenvolvida. E ainda deixa uma sensação incômoda: é para rir ou para chorar?

Luís Valise (São Paulo, SP)

O porta-aviões Minas Gerais - Patrícia Santos/Folhapres

Onda anti-PT de 2018 não reverteu numa onda pró-PT em 2022, a hora é de racionalidade

Bolsonaro moveu mundos e fundos, mas não conseguiu inverter as posições, nem mesmo ameaçar a liderança de Lula

Com Ipespe divulgada neste sábadio, 24, agregador Estadão Dados mostra Lula com 52% dos votos válidos, contra 36% de Bolsonaro. Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação e Carla Carniel/Reuters

Reta final de campanha, nervos à flor da pele, excitação e medo, mas o fato é que a vantagem do petista Lula sobre o presidente Jair Bolsonaro vem desde 2018, atravessou todo o governo e se manteve bastante estável ao longo de toda a campanha de 2022. Bolsonaro moveu mundos e fundos, mas não conseguiu inverter as posições, nem mesmo ameaçar a liderança de Lula.

A dúvida na última semana é segundo turno ou não, porque dois fatores selaram o destino das eleições. O primeiro é a força indestrutível de Lula no Nordeste e entre os mais pobres e as mulheres, maiores eleitorados do País, com memória positiva dos dois mandatos de Lula. O segundo fator da desvantagem de Bolsonaro é Bolsonaro, incansável em gerar, ampliar e cristalizar uma ojeriza nacional contra ele.

Seus seguidores dizem que nunca houve um ataque tão sistemático contra um presidente. A realidade é que nunca houve um presidente tão obcecado em falar as coisas mais absurdas, agir de modo desmiolado, ameaçar a estabilidade nacional e corroer a imagem do Brasil no mundo. Ele não foi a vítima dos ataques, foi o autor. E atingiu um objetivo que nem o mais célebre marqueteiro do mundo conseguiria: esmaecer o antipetismo no País.

De nada adianta Bolsonaro consumir seus derradeiros programas de rádio e TV com o que todo mundo está careca de saber. Ninguém esqueceu o mensalão, a sanha contra a nossa Petrobras, as delações premiadas, os bilhões devolvidos aos cofres públicos e os conluios nos palácios. A questão é de prioridade.

Se a corrupção é devastadora sob qualquer ângulo, as maiores ameaças ao Brasil e aos brasileiros passaram a ser outras, ainda mais assustadoras: à democracia, à Justiça, aos direitos, à igualdade, à sobrevivência dos mais pobres e à própria vida.

É inacreditável que tantos sigam, mas é impossível que a maioria apoie quem defende tortura, milícias e armas fora de controle, crie caso com nações amigas, trate a cultura como inimiga, não tenha uma palavra para os miseráveis, negue a fome e a importância do meio ambiente, corte verbas dos programas mais essenciais para pobres e ache engraçado alguém morrendo sem ar (e assistência) na pandemia.

Em 2018, a onda anti-PT virou “antissistema” e liquidou candidatos experientes aos governos e ao Congresso para dar a vez a gente como Wilson Witzel e Daniel Silveira. Em 2022, não há uma onda pró-PT, mas uma lufada de racionalidade para uma união de forças que recupere o que foi destruído e princípios como democracia e humanidade, numa transição para o futuro. Com atenção máxima aos menores sinais de corrupção.

Eliane Cantanhêde, a autora deste artigo, é comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta. Publicado originalmente n'O Estado de S. Paulo, em 25.09.22

Ciro Gomes reafirma candidatura e chama de ‘rito suicida’ a escolha entre Lula ou Bolsonaro

Em pronunciamento, presidenciável do PDT leu ‘manifesto à Nação’; ele repetiu críticas ao candidato do PT e ao presidente da República e disse ser vítima de uma ‘gigantesca e virulenta campanha’ para tirá-lo da disputa

O presidenciável Ciro Gomes (PDT) descartou retirar sua candidatura; ao seu lado esquerdo, o candidato do PDT ao governo de São Paulo, Elvis Cezar.

O candidato à Presidência da República Ciro Gomes (PDT) convocou a imprensa e fez um pronunciamento para deixar claro que seguirá na disputa pelo Palácio do Planalto, repetindo críticas sobre a atuação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele leu um “manifesto à Nação” nesta segunda-feira, 26, protestando contra ambos rivais, que lideram as pesquisas de intenção de voto, e estariam tentando “eliminar a diversidade do embate democrático” e “transformá-lo, de forma artificial e prematura, em um embate de duas forças que utilizam falsos argumentos morais para se tornarem hegemônicos”.

Ciro chamou de “rito suicida” o encaminhamento para um segundo turno entre Lula e Bolsonaro. Segundo o pedetista, as “máquinas poderosas do lulismo e do bolsonarismo” são responsáveis por “ludibriar” a opinião pública e concentrar os eleitores nessas duas opções. O candidato tem negado qualquer intenção de recuar da disputa há semanas, embora seja cada vez mais pressionado para isso.

“Nada deterá a minha disposição de seguir em frente e empunhar a bandeira do Projeto Nacional de Desenvolvimento”, disse o pedetista. “Minha candidatura está de pé para defender o Brasil em qualquer circunstância, e meu nome continua posto como firme e legítima opção para livrar o País de um presente covarde e de um futuro amedrontador”. Esse posicionamento, segundo ele, é “definitivo”. - Ciro Gomes.

O ex-ministro disse ser vítima de uma “gigantesca campanha nacional e internacional” para a retirada de sua candidatura. Na reta final da campanha, apoiadores de Lula pressionam para que ele retire seu nome das urnas em prol de eleger o candidato do PT no primeiro turno. Recentemente, ex-integrantes do PDT e ex-cabos eleitorais do presidenciável se somaram ao apelo do chamado “voto útil”. Na semana passada, mais de 50 políticos e intelectuais da esquerda em países da América Latina escreveram uma carta aberta a Ciro Gomes pedindo que ele desista da corrida presidencial.

O “manifesto” do presidenciável marca sua posição no momento em que sua postura vinha sendo apontada como supostamente pró-Bolsonaro. No debate Estadão do último sábado, 24, um cochicho do pedetista para o presidente foi usado nas redes como um sinal de suposta afinidade entre ambos. Na live desta segunda-feira, Ciro direcionou críticas tanto a Bolsonaro, quanto a Lula. Ele os classificou como “corruptos farsantes e demagogos que tentam ludibriar a fé popular com suas falsas promessas”. “Bolsonaro não existiria se não fosse a grave crise econômica e moral dos governos petistas, e Lula não sobreviveria em sua ameaçadora decadência se não fossem os desatinos criminosos de Bolsonaro”, afirmou.

Davi Medeiros para O Estado de S. Paulo, em 26.09.22 às 11h35. 

Fundo eleitoral bilionário e orçamento secreto minam movimentos de renovação do Congresso

Repasse privilegia políticos que já têm mandato; especialistas indicam que expectativa de mudanças será menor

Foto: Paulo Sérgio/Câmara dos Deputados

A adoção do orçamento secreto – revelado pelo Estadão –, a aprovação com apoio geral do Congresso do fundo eleitoral bilionário e o cenário de polarização consolidada têm sido desfavoráveis aos movimentos de renovação política. As emendas (impositivas, individuais e de bancadas, além das de relator) viraram cobiça e propósito dos partidos políticos, o que dificulta o surgimento de novos quadros. A montanha de dinheiro público e a forma com que os recursos são distribuídos na eleição atravancam mudanças, apontam especialistas.

Organizações como RenovaBR, Agora e Livres, além da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) – organização apartidária em defesa da democracia e sustentabilidade política –, dizem ter dificuldades de competir com esses meios que favorecem a manutenção dos atuais integrantes no Congresso. Neste ano, o índice de tentativa de reeleição na Câmara é de 87%, um recorde. De um total de 513 deputados federais, 448 tentam seguir na Casa responsável pela representação do povo brasileiro.

Especialistas apontam que expectativa de renovação da Câmara seja ainda menor esse ano, devido a Fundo Eleitoral e Orçamento Secreto

Especialistas apontam que expectativa de renovação da Câmara seja ainda menor esse ano, devido a Fundo Eleitoral e Orçamento Secreto Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Conforme mostrou a Coluna do Estadão, neste domingo, 25, com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), candidatos a deputado federal que disputam a reeleição ganharam quase dez vezes mais recursos eleitorais nesta campanha do que os concorrentes que tentam ingressar na Câmara. O levantamento mostra que os candidatos com mandato receberam, em média, R$ 1,8 milhão até o momento, enquanto os demais tiveram receita, em média, de R$ 195 mil.

Segundo o TSE, são 10.629 candidatos à Câmara tem todo o País – dos quais 2,867 disputam uma vaga para deputado federal pela primeira vez, segundo dados compilados pelo RenovaBR. Eduardo Mufarej, do movimento, reclamou da disputa “desigual” no País. Neste domingo, ele alertou sobre a importância do voto consciente para o Poder Legislativo.

“Está muito clara a relevância do Congresso Nacional nos próximos anos, e, para isso, realizarmos boas escolhas é absolutamente fundamental. Dentro de uma escolha desigual, com orçamento secreto e fundo eleitoral, mas, ao mesmo tempo, contrapondo essa desigualdade com muita dedicação e muito empenho, conto com vocês. Realizem seu papel de cidadãos e façam boas escolhas”, afirmou em vídeo publicado nas redes sociais.

Até agora, do fundo eleitoral de R$ 4,9 bilhões, R$ 4,5 bilhões foram repassados aos candidatos, sobretudo os que já estão no poder. Dados organizados pela plataforma 72 Horas mostram que ao menos 35% dos postulantes não receberam nenhuma fatia desse valor.

Recursos têm sido repassados a candidaturas fantasmas, para justificar cota feminina

O cenário é ainda mais concentrado no caso do fundo partidário, cujos valores podem ser usados para bancar impulsionamento de conteúdos na internet, compra de passagens aéreas, advogados e contadores para as campanhas. Desse total, apenas 10,5% dos postulantes foram beneficiados com R$ 362,4 milhões já distribuídos pelos partidos. O valor total do fundo partidário deve chegar a R$ 1 bilhão até o final do ano.

Esses recursos também privilegiam candidatos à reeleição. Políticos que já possuem mandato receberam proporcionalmente cinco vezes mais recursos públicos do fundo partidário do que os novatos quando considerados todos os cargos em disputa.

Dentro de uma escolha desigual, com orçamento secreto e fundo eleitoral, mas, ao mesmo tempo, contrapondo essa desigualdade com muita dedicação e muito empenho, conto com vocês. Realizem seu papel de cidadãos e façam boas escolhas

Eduardo Mufarej, RenovaBR

Esses candidatos não apenas recebem mais dinheiro, como recebem primeiro. O pico de distribuição dos recursos enviados a postulantes que tentam reeleição aconteceu em 19 de agosto, enquanto os novatos esperaram uma semana a mais para a maior fatia dos valores cair na conta, mostra a plataforma.

Candidatos à reeleição também ganham com o fortalecimento dos redutos eleitorais com o uso de emendas parlamentares. De 2019 a 2022, são mais de R$ 117 bilhões empenhados – das quais mais de R$ 52 bilhões correspondem às emendas de relator – o chamado “orçamento secreto”, distribuído no governo Jair Bolsonaro (PL) para garantir o apoio da base no Congresso sem ampla transparência. No caso do Senado, dois terços dos candidatos à reeleição foram padrinhos com esse tipo de repasse.

O fundão (eleitoral) não tem democratizado a política, mas tem concentrado o poder, colocando vastas quantidades de dinheiro na mão daqueles que comandam hoje os partidos políticos, como também desequilibrando a competição. 

Magno Karl, cientista político e diretor executivo do Livres

Historicamente, mais da metade dos deputados federais se reelege. Nas últimas três eleições, o índice de renovação na Câmara oscilou entre 43,5% (2014) e 47,3% (2018), sendo 46,4% em 2010.

Neste ano, a expectativa é que esse percentual seja maior, ou seja, mais deputados renovarão seus mandatos, segundo o cientista político e diretor executivo do Livres, Magno Karl, por fatores econômicos e políticos. “O fundão (eleitoral) não tem democratizado a política, mas tem concentrado o poder, colocando vastas quantidades de dinheiro na mão daqueles que comandam hoje os partidos políticos, como também desequilibrando a competição”, afirmou.

Além disso, o discurso dos políticos que estão no poder hoje é voltado para “segurança”, “estabilidade” e “ponderação”. Para Karl, além de haver uma renovação nos representantes do povo, é preciso mudar a forma de se fazer política. “A mudança por si só não traz resultado. A gente precisa qualificar a renovação política não só removendo políticos que não têm muito a oferecer ao País, mas também com conteúdo programático relevante”, disse.

As cláusulas de barreira e de desempenho e a origem dos recursos atrelada ao número de assentos (na Câmara) faz com que, agora, os partidos tenham de fazer deputados. Como fazem isso? Lançam nomes já conhecidos que atuam como puxadores de votos e que já foram mandatários.

Leandro Machado, cientista político e cofundador do Agora

Para o cientista político Leandro Machado, cofundador do movimento Agora, a má distribuição de recursos pelos partidos leva a uma Casa com ainda mais nomes conhecidos na política. “As cláusulas de barreira e de desempenho e a origem dos recursos atrelada ao número de assentos (na Câmara) faz com que, agora, os partidos tenham de fazer deputados. Como fazem isso? Lançam nomes já conhecidos que atuam como puxadores de votos e que já foram mandatários”, afirmou.

Machado também entende que a forma com que as legendas distribuem os valores contribui para a manutenção do poder dos caciques partidários e a existência de candidaturas laranjas. “Isso está expresso em como o financiamento é destinado, como é distribuído, como as contas são prestadas. Se (as cotas para mulheres) fossem 40% dos assentos (no Congresso), e não 40% das candidaturas, o jogo mudava de figura.”

Diversidade

Dados organizados pela plataforma 72 Horas também mostram que a distribuição dos recursos derruba a possibilidade de renovação da diversidade no Congresso. “Quando o tema é renovação, descobrimos que candidaturas do eixo diversidade, que são mulheres, negros e indígenas, esperam mais tempo pelo recurso. Além de receber menos proporcionalmente, eles também recebem depois. Isso é crucial”, afirmou Fernanda Costa, uma das organizadoras da plataforma.

Na prática, os partidos não só não distribuem os valores de maneira equânime, como também levam mais tempo para bancar as candidaturas. “O dinheiro público não promove diversidade”, disse Fernanda.

Legislativo

O apresentador Luciano Huck, um dos principais incentivadores desses movimentos de renovação, fez um alerta na TV Globo, em seu programa dominical, o Domingão com Huck, para as eleições proporcionais, destacando a importância do voto nos candidatos ao Legislativo.

“Agora, dia 2, na próxima semana, 156 milhões de brasileiros vão às urnas escolher seus representantes. Neste período de campanha, a gente costuma falar muito sobre os candidatos a presidente e a governador. Mas hoje eu gostaria de encerrar o Domingão falando da importância do seu voto na eleição para os membros do Legislativo – dessa vez, deputados e senadores”, afirmou o apresentador, que já teve a candidatura para o Palácio do Planalto aventada.

Huck destacou que a maioria dos brasileiros deixa para definir o voto para o Legislativo na última semana. Como mostrou o Estadão, esse tipo de candidatura são as que representam a maior incidência da alienação (abstenção passiva e ativa) dos eleitores nas urnas. “Então, ao longo dos próximos dias, pesquise sobre os candidatos a deputados e senadores, mas pesquise mesmo. Busque candidatos que tenham o sarrafo da ética na altura certa, que defendam e atuem nas pautas que possam contribuir para que a gente possa construir um País mais justo, mais eficiente, mais inclusivo e mais sustentável, disse.

Pauta ambiental

Um levantamento recente da Raps em parceria com a Uma Concertação pela Amazônia mostrou que, dos 91 deputados federais da Amazônia Legal, 46 votaram na direção contrária do desenvolvimento sustentável. “Sem articulação política e diálogo, inclusive com as forças mais à direita do Congresso, não há possibilidade de barrar retrocessos graves, que colocam o Brasil em uma agenda de atraso. É preciso mostrar, por exemplo, que a agenda do clima não é uma agenda ideológica, da esquerda ou da direita. Ela é a agenda do século 21″, disse a diretora executiva da Raps, Mônica Sodré.

Por isso, a organização disse acreditar que, em 2023, haverá dificuldades de fazer passar pautas ligadas ao ambiente no Congresso, independentemente de quem seja o vencedor na corrida pelo Planalto.

Gustavo Queiroz e Marcela Villar para O Estado de Paulo, em 26.09.22.Publicado originalmente às 16h00. Atualização: às 16h26

Zelensky promete proteger soldados russos que se rendam

O Presidente ucraniano disse, no seu habitual discurso diário, feito este domingo,  que iria oferecer proteção aos soldados russos que decidirem render-se.

Na Rússia, mais de 2 mil pessoas foram detidas, na sequência de protestos contra a “mobilização parcial” de cidadãos russos, anunciada por Vladimir Putin, para reforçar o contingente militar na Ucrânia. Os dados são avançados pela organização independente OVD info.

A par dos protestos, a fuga continua a ser um caminho para muitos, que escolhem outros países para continuarem as suas vidas. A Mongólia, por exemplo, já recebeu centenas de pessoas nos últimos dias.

O chefe de um posto de controlo da cidade de Altanbulag, na Mongólia, disse à agência de notícias France-Presse que, desde quarta-feira, já tinham entrado no país mais de 3 mil russos, na sua maioria homens.

Não se submetam à mobilização criminosa, disse Volodymyr Zelensky Presidente da Ucrânia

"Quero enfatizar uma vez mais: há uma saída. Não se submetam à mobilização criminosa. Fujam ou rendam-se ao cativeiro ucraniano na primeira oportunidade. Peço a todos os nossos amigos, no campo da informação, que apoiem a difusão deste apelo. Quanto mais cidadãos russos tentarem proteger as suas próprias vidas, mais depressa esta guerra criminosa da Rússia contra o povo da Ucrânia terminará", referiu o chefe de Estado ucraniano.

As autoridades militares ucranianas afirmaram, no domingo, que as forças russas usaram drones de fabrico iraniano, no sul do país. Em resposta, Kiev já disse que vai reduzir significativamente a sua presença diplomática no Irão.

Publicado originalmente por EuroNews, m 26.09.22

Agitação crescente sobre mobilização de recrutas na Rússia leva a tiroteio em centro de alistamento

Um jovem atira no militar do local, que está em estado crítico. Pelo menos 17 pontos de recrutamento foram atacados com coquetéis molotov nos últimos dias

Vários reservistas recrutados no assentamento siberiano de Bolsherechye se despediram de seus parentes no domingo.(Foto: Alexey Malgavko) 

Um tiro à queima-roupa em um centro de recrutamento em Ust-Ilimsk, no extremo leste da Rússia, levou a tensão no país a outro nível desde que o presidente, Vladimir Putin, decretou a mobilização de civis para o front na Ucrânia . Um jovem abriu fogo na segunda-feira contra o oficial militar do local em meio a uma onda de ataques contra esses pontos de alistamento , alguns dos quais foram queimados nos dias de hoje. Ao mesmo tempo, os protestos estão se tornando mais frequentes em cidades provinciais longe da cosmopolita Moscou, onde foram vistas imagens de policiais sendo arrastados para ônibus de recrutamento por manifestantes.

“Estou envergonhado que isso esteja acontecendo em um momento em que deveríamos estar unidos. Não devemos lutar contra nós mesmos, mas contra ameaças reais”, disse em suas redes sociais o governador da região de Irkutsk, onde ocorreu o tiroteio. "O comissário militar Alexander Vladimirovich Eliseyev está em ressuscitação, sua condição é crítica e os médicos temem por sua vida", acrescentou.

Depois de atirar no soldado, o assaltante, identificado como Ruslán Zinin, alertou o restante das pessoas presentes na sala para que fugissem e puxou novamente o gatilho de sua pistola. De acordo com várias testemunhas oculares contadas ao jornal Baza , o agressor, um desempregado de 25 anos, tinha sido convocado esta segunda-feira para ser recrutado, e antes de abrir fogo disse: “Agora vamos todos para casa”.

A mobilização massiva decretada por Putin - que planeja adicionar cerca de 300 mil pessoas ao exército - sete meses após o início de sua guerra causou pânico e ansiedade na sociedade russa. Fontes do Serviço Federal de Segurança (FSB) disseram ao jornal independente Meduza que cerca de 260 mil homens deixaram o país desde quarta -feira , quando o presidente russo anunciou a mudança.

A onda de ataques contra pontos de recrutamento se intensificou nos últimos dias. Em sete meses, desde o início da chamada "operação militar especial" na Ucrânia até o anúncio de Putin, 37 centros queimaram em todo o país. Nos últimos dias, pelo menos mais 17 incêndios foram registrados, segundo o jornal Mediazona , declarado agente estrangeiro pelas autoridades.

Um tiroteio deixa o chefe de um centro de recrutamento siberiano ferido

Um atirador abre fogo em um escritório de recrutamento militar em Ust-Ilimsk, região de Irkutsk, Rússia. (Foto: Reuter)

Coquetéis Molotov

Um dos últimos incidentes ocorreu na cidade de Uriupinsk, na região de Volgogrado. Um homem jogou vários coquetéis molotov em um ponto de recrutamento na manhã de segunda-feira. O evento foi atribuído a Mijaíl Filátov, um homem de 35 anos e pai de uma menina que transmitiu um vídeo no YouTube onde dizia: "É assim que acendo meu protesto". Pouco depois, ele foi preso.

De acordo com os serviços de emergência, os danos foram pequenos e os documentos do local não foram destruídos. Este ataque junta-se a vários outros ocorridos nas últimas horas, a maioria por bombas incendiárias, embora o fogo tenha destruído apenas algumas salas nos centros afetados. Na região de Kirovsk, vizinha da Finlândia, um indivíduo quebrou uma janela e derramou combustível dentro, enquanto nas províncias de Kaliningrado e Mordóvia jogaram garrafas impregnadas com gasolina e fogo. Enquanto isso, em Ryazan, um homem tentou se incendiar em uma zona de ônibus como protesto contra a guerra. O homem começou a gritar que não queria ir para o front, segundo a imprensa local daquela cidade do Volga. A polícia interveio rapidamente e seus ferimentos não são graves.

Todo mundo conhece pessoas que foram mobilizadas ou estão tentando fugir do país . "Fui para o Cazaquistão ontem à noite com meu irmão e um amigo, não sei quando eles voltarão", disse um jovem moscovita a este jornal na segunda-feira. "A notificação veio para funcionar, não sabemos o que fazer", disse outra pessoa sobre o primo no domingo, em uma das frases mais repetidas nos dias de hoje.

Muitos temem que as fronteiras sejam fechadas quando os referendos de pseudo-anexação em território russo na Ucrânia terminarem na terça-feira . No entanto, alguns homens já foram impedidos de passar. A organização de advogados de Ágora divulgou no Telegram várias notificações das forças de fronteira em que "por ordem do comissariado militar", vários homens foram proibidos de sair dos limites do Cáucaso.

Recrutas russos dentro de um centro de alistamento militar em Bataysk, região de Rostov-on-

A mídia russa perguntou ao porta-voz de Putin, Dmitri Peskov, sobre o fechamento das fronteiras, que há algumas semanas negou categoricamente que uma mobilização ocorreria. "No momento, nenhuma decisão foi tomada", respondeu ele desta vez.

O representante do Kremlin também reconheceu que a mobilização não se ajustou ao anúncio do presidente russo, embora tenha culpado as autoridades locais por isso. “Há situações em que o decreto (de mobilização) foi violado. Esses casos estão sendo eliminados”, disse Peskov. Putin anunciou que seriam convocados reservistas com experiência militar anterior, o que não aconteceu, o que provocou inúmeros protestos nas províncias.

“Os governadores estão trabalhando ativamente para corrigir essa situação, e nossos jornalistas e organizações públicas estão fazendo um trabalho muito necessário [para denunciá-lo]”, acrescentou Peskov, na tentativa de acalmar as coisas. O portal OVD-Info , especializado na cobertura da repressão a manifestantes, registrou mais de 2.300 prisões entre 21 e 25 de setembro, a maioria fora da capital. E os protestos continuam, principalmente nas regiões com mais correntes de ar, como Cáucaso e Sibéria.

Javier Custa, de Moscou  para  o EL PAÍS, em 26.09.22