quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Casos e mortes por coronavírus no Brasil em 21 de janeiro, segundo consórcio de veículos de imprensa

País contabilizou total de 213.180 óbitos e 8.655.512 casos de Covid-19.

O consórcio de veículos de imprensa divulgou novo levantamento da situação da pandemia de coronavírus no Brasil a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde, consolidados às 13h desta quinta-feira (21).

Desde o último balanço, às 20h de quarta-feira (20), sete estados atualizaram seus dados: CE, GO, MG, MS, PE, RN e TO.

Veja os números consolidados:

Mortes: 213.180

Casos: 8.655.512

Na quarta-feira, às 20h, o país registrou 1.382 mortes pela Covid-19 nas 24 horas anteriores, chegando ao total de 212.893 óbitos desde o começo da pandemia. É o maior número de óbitos registrado em 24 horas desde o dia 4 de agosto, quando a marca foi de 1.394. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil nos últimos 7 dias foi de 983. A variação foi de +33% em comparação à média de 14 dias atrás, indicando tendência de crescimento nos óbitos pela doença.

Em casos confirmados, desde o começo da pandemia 8.639.868 brasileiros já tiveram ou têm o novo coronavírus, com 64.126 desses confirmados no último dia. A média móvel nos últimos 7 dias foi de 54.630 novos diagnósticos por dia. Isso representa uma variação de +50% em relação aos casos registrados em duas semanas, o que indica tendência de crescimento também nos diagnósticos.

Doze estados estão com alta nas mortes: MG, RJ, SP, GO, MT, AM, RO, RR, TO, AL, PE e SE.

Brasil, 20 de janeiro

Total de mortes: 212.893

Registro de mortes em 24 horas: 1.382

Média de novas mortes nos últimos 7 dias: 983 (variação em 14 dias: +33%)

Total de casos confirmados: 8.639.868

Registro de casos confirmados em 24 horas: 64.126

Média de novos casos nos últimos 7 dias: 54.630 por dia (variação em 14 dias: +50%)

Estados

Subindo (12 estados): MG, RJ, SP, GO, MT, AM, RO, RR, TO, AL, PE e SE

Em estabilidade (9 estados): PR, RS, ES, AP, PA, BA, MA, PI e RN

Em queda (5 estados + DF): SC, DF, MS, AC, CE e PB

Essa comparação leva em conta a média de mortes nos últimos 7 dias até a publicação deste balanço em relação à média registrada duas semanas atrás (entenda os critérios usados pelo G1 para analisar as tendências da pandemia).

Vale ressaltar que há estados em que o baixo número médio de óbitos pode levar a grandes variações percentuais. Os dados de médias móveis são, em geral, em números decimais e arredondados para facilitar a apresentação dos dados.

Por G, em  21/01/2021 13h00  Atualizado há 2 horas

Índia anuncia envio de vacinas para o Brasil

Carregamento com doses do imunizante da AstraZeneca-Oxford será exportado na sexta-feira. De Guarulhos, lote será levado para a Fiocruz no Rio de Janeiro para etiquetagem.    

Duas doses da vacina AstraZeneca-Oxford

Maior produtor de vacinas do mundo, Instituto Serum fabrica imunizante da AstraZeneca-Oxford na Índia

A Índia afirmou nesta quinta-feira (21/01) que autorizou a exportação comercial da vacina contra a covid-19 e enviará os primeiros carregamentos ao Brasil e Marrocos já nesta sexta-feira, segundo o secretário de Relações Exteriores indiano disse à agência de notícias Reuters.

O aval chega uma semana após uma tentativa frustrada do governo de Jair Bolsonaro de ir buscar 2 milhões de doses do imunizante na Índia. O governo do país asiático havia suspendido a exportação até o início da campanha de vacinação local. Na terça-feira, a Índia deu início ao envio das vacinas, mas o Brasil não apareceu na lista dos seis países que receberiam os primeiros lotes.

As doses do imunizante da AstraZeneca-Oxford estão sendo produzidas pelo Instituto Serum, maior fabricante de vacinas do mundo, que recebeu pedido de vários países.

O secretário das Relações Exteriores indiano, Harsh Vardhan Shringla, afirmou à Reuters que as exportações comerciais começariam na sexta, alinhadas com o compromisso do primeiro-ministro Narendra Modi de usar as capacidades industriais do país para ajudar toda a humanidade de lutar contra a pandemia.

"Ao seguir essa visão, nós temos respondido de forma positiva aos pedidos de países do mundo todo, começando pelos nossos vizinhos", disse ele, referindo-se ao envio das doses gratuitas. Shringla acrescentou que a exportação comercial começará com a entrega de lotes ao Brasil e Marrocos, seguidos por África do Sul e Arábia Saudita.

O início do envio das doses ao Brasil foi confirmado pela TV Globo com o consulado indiano em São Paulo. Os lotes devem chegar ao aeroporto de Guarulhos no sábado, de onde serão transportados para a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, para a etiquetagem.

A vacina, inicialmente a única aposta do governo Bolsonaro, requer duas doses para atingir sua eficácia máxima de proteção contra a covid-19, e pode ser armazenada em temperatura de geladeira, o que facilita a logística de distribuição.

Novela da vacina

A Índia recebeu dezenas de pedidos de várias nações, inclusive apelos urgentes do Brasil, para o início da exportação da vacina. O país asiático, no entanto, aguardava o começo de sua campanha de vacinação interna, que ocorreu no último sábado, para enviar as doses.

Diante da iminência da aprovação de uma vacina contra a covid-19 no Brasil e sem ter nenhuma dose em mãos para o início da campanha de vacinação, em 8 de janeiro Bolsonaro enviou uma carta ao primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, pedindo urgência no envio ao Brasil, para, assim, tentar garantir o protagonismo da imunização.

O pedido de urgência para a importação das doses ocorreu após a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entidade do governo federal, ter informado que ocorreria um atraso na chegada ao país do insumo necessário para a produção local do inoculante da AstraZeneca. Até o fim do ano, o governo brasileiro espera contar com mais de 200 milhões de doses do imunizante produzidos pela Fiocruz.

Pouco depois, o Ministério das Relações Exteriores afirmou em nota que o Brasil adquiriu as doses do Instituto Serum e que a embaixada brasileira teria feito os preparativos junto às autoridades indianas para receber os lotes. Na semana passada, um avião chegou a iniciar viagem para buscar a vacina no país asiático. Tanto Bolsonaro quanto o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, prometiam a chegada do imunizante em dois dias.

O voo, porém, acabou sendo adiado depois que o governo indiano declarou que não poderia ainda dar uma data para a exportação de doses produzidas no país. "Parece que o Brasil queimou a largada ao anunciar oficialmente o envio de uma aeronave para transportar 2 milhões de doses de vacina", afirmou uma reportagem do jornal indiano Hindustan Times.

Na terça-feira, o governo da Índia anunciou o início da exportação de vacinas contra a covid-19, mas não citou o Brasil entre os países de destino. O anúncio da Índia causou preocupação no governo.

Deutsche Welle, em 21.01.2021, há 59 minutos.

O desafio arrogante de Bolsonaro, que acredita ser blindado por Deus. Análise de Juan Arias, do EL PAÍS

Bolsonaro, em vez de concentrar todas as suas energias em tirar da crise um país que “está quebrado”, como ele diz com sadismo, tenta apenas se blindar no poder para se reeleger

Diz o ditado que “Deus escreve certo por linhas tortas”. Quem sabe esse Deus, apoderado no Brasil por todos os poderes fáticos, que o roubaram dos pobres e desfavorecidos, ainda dê uma surpresa.

Se Bolsonaro se escudar em Deus para tentar se manter no poder, é possível que acabe sendo abandonado por esse Deus, ao qual tenta monopolizar e instrumentalizar para seus objetivos espúrios. 

Imagem de Bolsonaro é projetada em prédio de São Paulo durante o panelaço da última sexta-feira.AMANDA PEROBELLI / REUTERS

A dor dos asfixiados em Manaus por falta de oxigênio, uma verdadeira tragédia nacional, despertou o “Fora, Bolsonaro!” e fez os panelaços de protesto soarem mais fortes do que nunca. Voltou a surgir assim a possibilidade de um impeachment para arrancar Bolsonaro do poder. Minhas colegas Giovanna Oliveira, Carla Jiménez e Flavia Marreiro nos contaram muito bem em seus textos neste jornal.

Sem dúvida é um primeiro passo para a saída do presidente, que demonstrou, como sempre, sua frieza e indiferença perante a morte. Um presidente que nem se dignou a ir ao lugar da tragédia para confortar as famílias que estão vendo seus entes queridos morrer por asfixia ―a pior das mortes, segundo os médicos.

E no entanto Bolsonaro, que se revelou incapaz de governar um país com a envergadura e a complexidade do Brasil, em vez de concentrar todas as suas energias em tirar da crise um país que “está quebrado”, como ele diz com sadismo, tenta apenas se blindar no poder para se reeleger.

Uma blindagem em várias esferas. A mais arrogante é quando ele afirma: “Só Deus me tira daqui.” E, se por acaso Deus se esquecer dele, buscará outras blindagens mais humanas. Primeiro a dos militares, cuja presença ele garantiu no Governo e em todas as instituições do Estado. É verdade que muitos deles já começam a manifestar um mal-estar em relação ao chefe. E é verdade que não permitiriam que ele tentasse um golpe. Mas esses militares são um escudo para Bolsonaro, pois é a primeira vez na democracia que um presidente lhes dá tanto protagonismo dentro do Governo.

Até mesmo seu vice, o general Mourão, o mais crítico dos militares do Planalto, acaba de excluir a possibilidade de um impeachment ao presidente. Mais do que isso: Mourão avisou que nas próximas eleições Bolsonaro não terá um oponente capaz de vencê-lo nas urnas.

Os militares poderiam ter saído antes do Governo, quando começaram a ver a forma como o presidente tratava até mesmo os generais, além de sua incapacidade de governar. Alguns deixaram o cargo, mas agora é tarde demais. Abandonar o Governo significaria uma confissão de derrota, algo que nunca farão.

Outra blindagem do presidente, talvez ainda mais forte que a do Exército, é a da corporação das polícias militares ―as quais ele está cobrindo de privilégios. Com a polícia, Bolsonaro garante também o apoio das milícias― com quem nutre uma relação umbilical e familiar. Quem assassinou Marielle?

Não só isso. Bolsonaro se sente blindado pelas elites empresariais, que continuam mantendo a miragem do falso apoio do mandatário a uma economia liberal. Isso apesar de que, em seus dois anos de exercício, ele deu provas contundentes do contrário. Essas elites empresariais, juntamente com as classes altas, continuam defendendo o presidente com medo de que a esquerda volte ao poder.

Existe ainda a blindagem, talvez a mais forte, da tomada de poder da Câmara e do Senado, onde, salvo surpresa, Bolsonaro conseguirá impor seus candidatos à presidência. O homem que havia chegado para acabar com a velha política tornou-se o paradoxo de ser seu maior defensor.

Para o Congresso, é uma festa o fato de que Bolsonaro, que havia prometido uma luta implacável contra a corrupção, tenha se transformado no maior inimigo dos que querem continuar apostando na luta contra o saque do dinheiro do Estado por políticos que buscam manter suas campanhas milionárias e enriquecer suas famílias. Bolsonaro tem interesses espúrios em defesa da sua, envolvida também em supostos crimes de corrupção. Com um procurador-geral da República ajoelhado aos seus pés e um STF que parece amedrontado, Bolsonaro se sente blindado.

Some-se a isso o fato de que o presidente, apesar de ter perdido pelo caminho muitos dos que nele votaram e hoje se sentem traídos, ainda conta com 30% de fidelíssimos seguidores, justamente os mais fanáticos e violentos, capazes de se organizar e até de lutar com armas para defender o mito, como ocorreu com Trump nos Estados Unidos. Ao contrário da oposição, que hoje parece incapaz de organizar um protesto nacional.

Por fim, Bolsonaro conta hoje com uma blindagem especial: a da grande massa de evangélicos e seus pastores. É um escudo seguro e forte porque é feito em nome de Deus. Bolsonaro se viu blindado ante um país com mais de 80% de fiéis quando criou seu lema “Deus acima de todos”.

Com todas essas proteções, poder-se-ia dizer que o presidente negacionista e insensível diante da morte pode continuar tranquilo, governando ou desgovernando, e que terá uma reeleição garantida. Mas na política, assim como na vida, nada é imutável e as surpresas são sempre possíveis. Acabamos de ver isso com Trump, o ídolo e amigo de toda a família Bolsonaro, que com sua derrota e sua possível inabilitação política deixou órfão e nu não apenas o mandatário brasileiro, mas também sua política exterior, comandada por um ministro que afirmou, logo após chegar ao Itamaraty, que “Trump e Bolsonaro foram escolhidos por Deus para salvar o Ocidente”.

Diz o ditado que “Deus escreve certo por linhas tortas”. Quem sabe esse Deus, apoderado no Brasil por todos os poderes fáticos, que o roubaram dos pobres e desfavorecidos, ainda dê uma surpresa.

Se Bolsonaro se escudar em Deus para tentar se manter no poder, é possível que acabe sendo abandonado por esse Deus, ao qual tenta monopolizar e instrumentalizar para seus objetivos espúrios. Se esse Deus reverenciado por Bolsonaro existisse, seria preciso buscá-lo hoje, mais que no centro do poder, no leito dos que estão morrendo asfixiados nos hospitais de Manaus por falta de oxigênio que o Governo lhes negou.

Dito em linguagem laica: talvez para o capitão belicista, que conhece e ama as armas como poucos, o tiro saia pela culatra. Ou, como afirmou a escritora e acadêmica Ana Maria Machado em sua coluna de O Globo: “Chega uma hora em que os pés de barro não sustentam mais ídolos, mitos e mentiras.”

Juan Arias é jornalista e escritor, com obras traduzidas em mais de 15 idiomas. É autor de livros como Madalena, Jesus esse Grande Desconhecido, José Saramago: o Amor Possível, entre muitos outros. Trabalha no EL PAÍS desde 1976. Foi correspondente deste jornal no Vaticano e na Itália por quase duas décadas e, desde 1999, vive e escreve no Brasil. É colunista do EL PAÍS no Brasil desde 2013, quando a edição brasileira foi lançada, onde escreve semanalmente.

Pesquisa revela que Bolsonaro executou uma “estratégia institucional de propagação do coronavírus”

Ao analisar 3.049 normas federais produzidas em 2020, a Faculdade de Saúde Pública da USP e a Conectas Direitos Humanos mostram por que o Brasil já superou mais de 212.000 mortes por covid-19



Manifestante protesta contra o presidente Jair Bolsonaro na frente do Planalto, no último sábado./ ERALDO PERES / AP

A linha de tempo mais macabra da história da saúde pública do Brasil emerge da pesquisa das normas produzidas pelo Governo de Jair Messias Bolsonaro relacionadas à pandemia de covid-19. Num esforço conjunto, desde março de 2020, o Centro de Pesquisas e Estudos de Direito Sanitário (CEPEDISA) da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP) e a Conectas Direitos Humanos, uma das mais respeitadas organizações de justiça da América Latina, se dedicam a coletar e esmiuçar as normas federais e estaduais relativas ao novo coronavírus, produzindo um boletim chamado Direitos na Pandemia – Mapeamento e Análise das Normas Jurídicas de Resposta à Covid-19 no Brasil. Nesta quinta-feira (21/1), lançam uma edição especial na qual fazem uma afirmação contundente: “Nossa pesquisa revelou a existência de uma estratégia institucional de propagação do vírus, promovida pelo Governo brasileiro sob a liderança da Presidência da República”.

Obtida com exclusividade pelo EL PAÍS, a análise da produção de portarias, medidas provisórias, resoluções, instruções normativas, leis, decisões e decretos do Governo federal, assim como o levantamento das falas públicas do presidente, desenham o mapa que fez do Brasil um dos países mais afetados pela covid-19 e, ao contrário de outras nações do mundo, ainda sem uma campanha de vacinação com cronograma confiável. Não é possível mensurar quantas das mais de 212.000 mortes de brasileiros poderiam ter sido evitadas se, sob a liderança de Bolsonaro, o Governo não tivesse executado um projeto de propagação do vírus. Mas é razoável afirmar que muitas pessoas teriam hoje suas mães, pais, irmãos e filhos vivos caso não houvesse um projeto institucional do Governo brasileiro para a disseminação da covid-19.

Há intenção, há plano e há ação sistemática nas normas do Governo e nas manifestações de Bolsonaro, segundo aponta o estudo. “Os resultados afastam a persistente interpretação de que haveria incompetência e negligência de parte do governo federal na gestão da pandemia. Bem ao contrário, a sistematização de dados, ainda que incompletos em razão da falta de espaço na publicação para tantos eventos, revela o empenho e a eficiência da atuação da União em prol da ampla disseminação do vírus no território nacional, declaradamente com o objetivo de retomar a atividade econômica o mais rápido possível e a qualquer custo”, afirma o editorial da publicação. “Esperamos que essa linha do tempo ofereça uma visão de conjunto de um processo que vivemos de forma fragmentada e muitas vezes confusa”.

A pesquisa é coordenada por Deisy Ventura, uma das juristas mais respeitadas do Brasil, pesquisadora da relação entre pandemias e direito internacional e coordenadora do doutorado em saúde global e sustentabilidade da USP; Fernando Aith, professor-titular do Departamento e Política, Gestão e Saúde da FSP e diretor do CEPEDISA/USP, centro pioneiro de pesquisa sobre o direito da saúde no Brasil; Camila Lissa Asano, coordenadora de Programas da Conectas Direitos Humanos; e Rossana Rocha Reis, professora do departamento de Ciência Política e do Instituto de Relações Internacionais da USP.

A linha do tempo é composta por três eixos apresentados em ordem cronológica, de março de 2020 aos primeiros 16 dias de janeiro de 2021: 1) atos normativos da União, incluindo a edição de normas por autoridades e órgãos federais e vetos presidenciais; 2) atos de obstrução às respostas dos governos estaduais e municipais à pandemia; e 3) propaganda contra a saúde pública, definida como “o discurso político que mobiliza argumentos econômicos, ideológicos e morais, além de notícias falsas e informações técnicas sem comprovação científica, com o propósito de desacreditar as autoridades sanitárias, enfraquecer a adesão popular a recomendações de saúde baseadas em evidências científicas, e promover o ativismo político contra as medidas de saúde pública necessárias para conter o avanço da covid-19”.

Os autores assinalam que a publicação não apresenta todas as normas e falas coletadas e armazenadas no banco de dados da pesquisa, mas sim uma seleção que busca evitar a repetição e apresentar o mais relevante para a análise. Os dados foram selecionados junto à base de dados do projeto Direitos na Pandemia, à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União, além de documentos e discursos oficiais. No eixo que definem como propaganda, foi também realizada uma busca na plataforma Google para a coleta de vídeos, postagens e notícias.

A análise mostra que “a maioria das mortes seriam evitáveis por meio de uma estratégia de contenção da doença, o que constitui uma violação sem precedentes do direito à vida e do direito à saúde dos brasileiros”. E isso “sem que os gestores envolvidos sejam responsabilizados, ainda que instituições como o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal de Contas da União tenham, inúmeras vezes, apontado a inconformidade à ordem jurídica brasileira de condutas e de omissões conscientes e voluntárias de gestores federais”. Também destacam “a urgência de discutir com profundidade a configuração de crimes contra a saúde pública, crimes de responsabilidade e crimes contra a humanidade durante a pandemia de covid-19 no Brasil”.

Os atos e falas de Bolsonaro são conhecidos, mas acabam se diluindo no cotidiano alimentado pela produção de factoides e de notícias falsas, no qual a guerra de ódios é também uma estratégia para encobrir a consistência e persistência do projeto que avança enquanto a temperatura é mantida alta nas redes sociais. A publicação provoca choque e mal estar ao sistematizar a produção explícita de maldades colocadas em prática por Bolsonaro e seu governo durante quase um ano de pandemia. Um dos principais méritos da investigação é justamente articular as diversas medidas oficiais e falas públicas do presidente na linha do tempo. Dessa análise meticulosa emerge o plano, com todas as suas fases devidamente documentadas.

Também torna-se explícito contra quais populações se concentram os ataques. Além dos povos indígenas, a quem Bolsonaro nega até mesmo água potável, há uma série de medidas tomadas para impedir que os trabalhadores possam se proteger da covid-19 e fazer isolamento. O governo amplia o conceito de atividades essenciais até mesmo para salões de beleza e busca anular o direito ao auxílio emergencial de 600 reais determinado pelo Congresso a várias categorias. Ao mesmo tempo, busca implantar um duplo tratamento aos profissionais de saúde: Bolsonaro veta integralmente o projeto que prevê compensação financeira para aqueles trabalhadores que ficarem incapacitados em consequência de sua atuação para conter a pandemia e tenta isentar os funcionários públicos de qualquer responsabilidade por atos e omissões no enfrentamento à covid-19. Em resumo: o trabalho duro e arriscado de prevenção e combate numa pandemia é desestimulado, a omissão é estimulada.

Através de retenção de recursos destinados à covid-19, o Governo prejudica a assistência aos doentes na rede pública de Estados e municípios. A guerra contra governadores e prefeitos que tentam implementar medidas de prevenção e combate ao vírus é constante. Por meio de vetos, Bolsonaro anula mesmo as medidas mais básicas, como obrigatoriedade de máscaras dentro de estabelecimentos com autorização para funcionar. Muitas de suas medidas e vetos são depois derrubadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ou pelo próprio Legislativo.

Esse é outro ponto importante: a análise dos dados mostra também o quanto a situação do Brasil poderia ser ainda mais trágica caso o STF e outras instâncias não tivessem barrado várias das medidas de propagação do vírus produzidas pelo Governo. Apesar da fragilidade demonstrada pelas instituições e pela sociedade, é visível o esforço de parte dos protagonistas para tentar anular ou neutralizar os atos de Bolsonaro. É possível fazer o exercício de projetar o quanto todos esses esforços, somados e associados a um governo disposto a prevenir a doença e combater o vírus, poderiam ter feito para evitar mortes em um país que conta com o Sistema Único de Saúde (SUS). Em vez disso, Bolsonaro produziu uma guerra em que a maior parte da energia de parte das instituições e da sociedade organizada foi dissipada para reduzir os danos produzidos por suas ações, em vez de se concentrar em combater a maior crise sanitária em um século.

Quase um ano depois do primeiro caso de covid-19, resta saber se as instituições e a sociedade que não estão acumpliciadas com Bolsonaro serão fortes o suficiente para, diante do mapa de ações institucionais de propagação do vírus, finalmente barrar os agentes de disseminação da doença. O uso da máquina do Estado para promover destruição tem sido determinante para produzir a realidade atual de mais de 1.000 covas abertas por dia para abrigar pessoas que poderiam estar vivas. Na gaveta de Rodrigo Maia (DEM), presidente da Câmara, há mais de 60 pedidos de impeachment. No Tribunal Penal Internacional, pelo menos três comunicações relacionam genocídio e outros crimes contra a humanidade à atuação de Bolsonaro e membros do governo relacionadas à pandemia. As próximas semanas serão decisivas para que os brasileiros digam quem são e o que responderão às gerações futuras quando lhes perguntarem onde estavam quando tantos morreram de covid-19.

A seguir, os principais pontos da linha do tempo das ações de Jair Bolsonaro e seu Governo:

MARÇO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 10: 1º-7/03/2020)

CASOS ACUMULADOS: 19 - ÓBITOS ACUMULADOS: 0

“Pequena crise”

Uma portaria da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) tenta abrir uma brecha para o acesso de não indígenas, “em caráter excepcional”, com o objetivo de realizar “atividades essenciais” em territórios de povos isolados. A medida busca usar a covid-19 para criar uma porta de acesso a comunidades que nunca tiveram contato com não indígenas (nem com seus vírus e bactérias) ou que decidiram viver sem contato.

O que Bolsonaro diz:

“OBVIAMENTE TEMOS NO MOMENTO UMA CRISE, UMA PEQUENA CRISE. NO MEU ENTENDER, MUITO MAIS FANTASIA. A QUESTÃO DO CORONAVÍRUS, QUE NÃO É ISSO TUDO QUE A GRANDE MÍDIA PROPALA OU PROPAGA PELO MUNDO TODO

EM 7/3, EM MIAMI, NA FLÓRIDA, REGIÃO CONSIDERADA DE ALTO RISCO. PELO MENOS 23 PESSOAS DE SUA COMITIVA FORAM INFECTADAS

ABRIL

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 15: 5-10/4)

CASOS ACUMULADOS: 20.818 - ÓBITOS ACUMULADOS: 699

Troca de ministro



Henrique Mandetta, primeiro Ministro da Saúde demitido por Bolsonaro / Foto de UESLEI MARCELINO / REUTERS

Bolsonaro demite o ministro da Saúde durante a pandemia. Luiz Henrique Mandetta, além de político, é médico. A principal razão da demissão é a discordância sobre o uso da cloroquina e sobre a atuação pautada pelas recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Ao final de março, segundo Mandetta, o presidente passou a buscar assessoria para se contrapor aos dados e à estratégia do Ministério da Saúde: “O Palácio do Planalto passou a ser frequentado por médicos bolsonaristas. (...) Ele [Bolsonaro] queria no seu entorno pessoas que dissessem aquilo que ele queria escutar. (...) Nunca na cabeça dele houve a preocupação de propor a cloroquina como um caminho de saúde. A preocupação dele era sempre: ‘Vamos dar esse remédio porque, com essa caixinha de cloroquina na mão, os trabalhadores voltarão à ativa, voltarão a produzir’. (...) O projeto dele para o combate à pandemia é dizer que o governo tem o remédio e quem tomar o remédio vai ficar bem. Só vai morrer quem ia morrer de qualquer maneira”.

O Congresso aprova o auxílio emergencial de 600 reais, medida parlamentar que seria equivocadamente associada a Bolsonaro por grande parte dos beneficiados, resultando em aumento de popularidade para o presidente.

O que Bolsonaro diz:

“E DAÍ? LAMENTO, QUER QUE FAÇA O QUÊ? EU SOU ‘MESSIAS’, MAS EU NÃO FAÇO MILAGRE

28/4, AO COMENTAR O NÚMERO DE MORTOS DURANTE UMA ENTREVISTA, FAZENDO REFERÊNCIA AO SEU NOME DO MEIO

MAIO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 19: 3-9/5)

CASOS ACUMULADOS: 155.939 - ÓBITOS ACUMULADOS: 3.877

Guerra com Estados



O novo ministro da Saúde, médico Nelson Teich, se demite: “Não vou manchar a minha história por causa da cloroquina”. Foto de JOÉDSON ALVES / EFE

Bolsonaro usa decretos para boicotar as determinações de prevenção e combate à covid-19 de estados e municípios. Para isso, amplia o entendimento do que é atividade essencial durante uma pandemia e que, portanto, pode seguir funcionando apesar do agravamento da emergência sanitária. Assim, a área de construção civil, salões de beleza e barbearias, academias de esporte de todas as modalidades e serviços industriais em geral passam a ser “atividades essenciais”.

O presidente tenta ainda isentar os agentes públicos de serem responsabilizados, civil e administrativamente, por atos e omissões no enfrentamento da pandemia. Bolsonaro também veta o auxílio emergencial de 600 reais mensais instituído pelo Congresso a pescadores artesanais, taxistas, motoristas de aplicativo, motoristas de transporte escolar, entregadores de aplicativo, profissionais autônomos de educação física, ambulantes, feirantes, garçons, babás, manicures, cabeleireiros e professores contratados que estejam sem receber salário. Pela lei aprovada pelo parlamento, essas categorias seriam contempladas pelo auxílio emergencial, para que pudessem fazer isolamento para se proteger do vírus.

O novo ministro da Saúde, médico Nelson Teich, se demite: “Não vou manchar a minha história por causa da cloroquina”. Assume o posto, interinamente, o general da ativa Eduardo Pazuello. Em solenidade oficial, o militar afirmou que, antes de assumir o cargo, “nem sabia o que era o SUS”. A militarização do ministério se amplia ainda mais. Um protocolo do Ministério da Saúde determina o uso de cloroquina para todos os casos de covid-19, medicamento comprovadamente sem eficácia para combater o novo coronavírus.

Bolsonaro abre guerra contra governadores. O Conselho Nacional da Saúde denuncia que mais de 8 bilhões de reais destinados ao combate à pandemia deixaram de ser repassados aos estados e municípios, que sofrem com a falta de insumos básicos, respiradores e leitos. O CNS lança a campanha “Repassa já!”.

O que Bolsonaro diz:

“SE FOR ISSO MESMO, É GUERRA. SE QUISEREM EU VOU A SÃO PAULO, VOCÊS TÊM QUE LUTAR CONTRA O GOVERNADOR

14/5, EM VIDEOCONFERÊNCIA PROMOVIDA PELA FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO (FIESP), INCITANDO OS EMPRESÁRIOS A LUTAR CONTRA O 'LOCKDOWN'

JUNHO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 24: 7-13/6)

CASOS ACUMULADOS: 850.514 - ÓBITOS ACUMULADOS: 42.720

Apagão de dados

Bolsonaro incita seus seguidores a invadir hospitais e filmar, com a justificativa de que os números de doentes e de ocupação de leitos estão inflacionados. Em 3 de junho, o Governo divulga dados sobre a covid-19 com atraso, após as 22h. Em 5 de junho, o site do Ministério da Saúde sai do ar e retorna no dia seguinte apenas com informações das últimas 24 horas. A tentativa de encobrir os números de doentes e de mortos por covid-19 é denunciada pela imprensa. A sociedade perde a confiança nos dados oficiais e seis dos principais jornais e sites de jornalismo —G1, O Globo, Extra, O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e UOL— formam um consórcio para registrar os números da pandemia.

O que Bolsonaro diz:

“ARRANJA UMA MANEIRA DE ENTRAR E FILMAR. MUITA GENTE TÁ FAZENDO ISSO, MAS MAIS GENTE TEM QUE FAZER PARA MOSTRAR SE OS LEITOS ESTÃO OCUPADOS OU NÃO, SE OS GASTOS SÃO COMPATÍVEIS OU NÃO

10/6, EM TRANSMISSÃO AO VIVO NO FACEBOOK

JULHO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 28: 5-11/7)

CASOS ACUMULADOS: 1.839.850 - ÓBITOS ACUMULADOS: 71.469

Vetos de maldade


ERALD

Bolsonaro veta a obrigatoriedade do uso de máscaras em estabelecimentos comerciais e industriais, templos religiosos, escolas e demais locais fechados em que haja reunião de pessoas. Também veta a multa aos estabelecimentos que não disponibilizem álcool em gel a 70% em locais próximos às suas entradas, elevadores e escadas rolantes. (Foto de ERALDO PERES / AP)

Bolsonaro veta a obrigação dos estabelecimentos em funcionamento durante a pandemia de fornecer gratuitamente a seus funcionários e colaboradores máscaras de proteção individual. Veta ainda a obrigação de afixar cartazes informativos sobre a forma de uso correto de máscaras e de proteção individual nos estabelecimentos prisionais e nos estabelecimentos de cumprimento de medidas socioeducativas.

Bolsonaro veta medidas de proteção para comunidades indígenas durante a pandemia de Covid-19. Entre elas: o acesso a água potável, materiais de higiene e limpeza, leitos hospitalares e de UTIs, ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea, materiais informativos sobre a covid-19 e internet nas aldeias. Veta também a obrigação da União de distribuir alimentos aos povos indígenas, durante a pandemia, na forma de cestas básicas, sementes e ferramentas.

O Exército paga 167% a mais pelo principal insumo da cloroquina, com a seguinte justificativa: “produzir esperança para corações aflitos”.

Ao criticar a militarização do Ministério da Saúde, o ministro do STF Gilmar Mendes define a resposta do governo federal à pandemia como “genocídio”: “Não podemos mais tolerar essa situação que se passa no Ministério da Saúde. (...) É preciso dizer isso de maneira muito clara: o Exército está se associando a esse genocídio, não é razoável. É preciso por fim a isso”.

O que Bolsonaro diz:

“LAMENTO AS MORTES. MORRE GENTE TODO DIA, DE UMA SÉRIE DE CAUSAS. É A VIDA

30/7, EM MEIO A UMA AGLOMERAÇÃO EM BAGÉ, NO RIO GRANDE DO SUL

AGOSTO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 32: 2-8/8)

CASOS ACUMULADOS: 3.012.412 - ÓBITOS ACUMULADOS: 100.477

Ataque à vacina

Bolsonaro veta integralmente o projeto de lei que determina compensação financeira paga pela União a profissionais e trabalhadores de saúde que ficarem incapacitados por atuarem no combate à covid-19.

O Governo Bolsonaro ignora a proposta da Pfizer, que garante a entrega do primeiro lote de vacinas em 20 de dezembro de 2020.

O Ministério da Saúde rejeita a doação de pelo menos 20 mil kits de testes PCR para covid-19 da empresa LG International, dois meses após a oferta.

AGOSTO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 32: 2-8/8)

CASOS ACUMULADOS: 3.012.412 - ÓBITOS ACUMULADOS: 100.477

Ataque à vacina

Bolsonaro veta integralmente o projeto de lei que determina compensação financeira paga pela União a profissionais e trabalhadores de saúde que ficarem incapacitados por atuarem no combate à covid-19.

O Governo Bolsonaro ignora a proposta da Pfizer, que garante a entrega do primeiro lote de vacinas em 20 de dezembro de 2020.

O Ministério da Saúde rejeita a doação de pelo menos 20 mil kits de testes PCR para covid-19 da empresa LG International, dois meses após a oferta.

O que Bolsonaro diz:

“NINGUÉM PODE OBRIGAR NINGUÉM A TOMAR VACINA.

31/8, EM CONVERSA COM APOIADORES NO JARDIM DO PALÁCIO DO ALVORADA

SETEMBRO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 37: 6-12/9)

CASOS ACUMULADOS: 4.315.687 - ÓBITOS ACUMULADOS: 131.210

Militar na Saúde

Uma resolução de Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) flexibiliza ainda mais a prescrição de ivermectina e nitazoxanida, dispensando a retenção de receita médica para a venda em farmácias. Os medicamentos são propagandeados pelo governo como eficazes para a covid-19, mas estudos científicos mostram que não diminuem a gravidade da doença nem impedem a morte de pacientes. O general da ativa Eduardo Pazuello é efetivado como ministro da Saúde.

O que Bolsonaro diz:

“ESTAMOS PRATICAMENTE VENCENDO A PANDEMIA. O GOVERNO FEZ TUDO PARA QUE OS EFEITOS NEGATIVOS DA MESMA FOSSEM MINIMIZADOS, AJUDANDO PREFEITOS E GOVERNADORES COM NECESSIDADES NA SAÚDE

11/9, EM AGLOMERAÇÃO NA BAHIA

OUTUBRO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 41: 4-10/10)

CASOS ACUMULADOS: 5.082.637 - ÓBITOS ACUMULADOS:150.198

“Vacina chinesa”

Bolsonaro afirma que a pandemia foi superdimensionada, mente que a cloroquina garante 100% de cura se usada no início dos sintomas e cancela a compra de 46 milhões de doses da vacina chinesa Coronavac pelo Ministério da Saúde: “O povo brasileiro não será cobaia de ninguém”. (Foto de AMANDA PEROBELLI / REUTERS).

O que Bolsonaro diz:

“ESTÁ ACABANDO A PANDEMIA [NO BRASIL]. ACHO QUE [O JOÃO DORIA, GOVERNADOR DE SÃO PAULO] QUER VACINAR O PESSOAL NA MARRA RAPIDINHO PORQUE [A PANDEMIA] VAI ACABAR E DAÍ ELE FALA: ‘ACABOU POR CAUSA DA MINHA VACINA’. QUEM ESTÁ ACABANDO É O GOVERNO DELE, COM TODA CERTEZA” (...) O QUE EU VEJO NA QUESTÃO DA PANDEMIA? ESTÁ INDO EMBORA, ISSO JÁ ACONTECEU, A GENTE VÊ LIVROS DE HISTÓRIA.”

EM 30/10, EM DECLARAÇÕES TRANSMITIDAS POR UM SITE BOLSONARISTA

NOVEMBRO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 45: 1º-7/11)

CASOS ACUMULADOS: 5.653.561 - ÓBITOS ACUMULADOS:162.269

Produção de mentiras

Apesar de todos os fatos e números em contrário, Bolsonaro afirma que o Brasil foi um dos países que menos sofreu com a pandemia. Segue atacando a vacina.

O que Bolsonaro diz:

“MORTE, INVALIDEZ, ANOMALIA. ESTA É A VACINA QUE O [JOÃO] DORIA QUERIA OBRIGAR TODOS OS PAULISTANOS A TOMAR. O PRESIDENTE DISSE QUE A VACINA JAMAIS PODERIA SER OBRIGATÓRIA. MAIS UMA QUE JAIR BOLSONARO GANHA

EM 10/11, NO FACEBOOK, AO COMEMORAR A SUSPENSÃO DOS TESTES DA VACINA CORONAVAC

DEZEMBRO

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 50: 6-12/12)

CASOS ACUMULADOS: 6.880.127 - ÓBITOS ACUMULADOS: 181.123

Qual é o plano?

Bolsonaro anuncia que não vai se vacinar e atua para criar pânico na população, referindo-se a terríveis efeitos colaterais. Em resposta ao questionamento do Supremo Tribunal Federal, o Ministério da Saúde apresenta o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação. O Governo, porém, ainda não tem vacina a oferecer nem cronograma confiável de vacinação. Onze ex-ministros da Saúde de diferentes partidos publicam artigo denunciando “desastrada e ineficiente condução do MS em relação à estratégia brasileira de vacinação da população contra a covid-19”. Ainda não há plano emergencial para os indígenas. Diz o ministro Luís Roberto Barroso, do STF: “Impressiona que, após quase 10 meses de pandemia, não tenha a União logrado o mínimo: oferecer um plano com seus elementos essenciais, situação que segue expondo a risco a vida e a saúde dos povos indígenas”. (Foto de Eraldo Peres / AP).

O que Bolsonaro diz:

“A PANDEMIA, REALMENTE, ESTÁ CHEGANDO AO FIM. TEMOS UMA PEQUENA ASCENSÃO, AGORA, QUE CHAMA DE PEQUENO REPIQUE QUE PODE ACONTECER, MAS A PRESSA DA VACINA NÃO SE JUSTIFICA. (...) VÃO INOCULAR ALGO EM VOCÊ. O SEU SISTEMA IMUNOLÓGICO PODE REAGIR, AINDA DE FORMA IMPREVISTA

19/12, EM ENTREVISTA AO PROGRAMA DE UM DE SEUS FILHOS NO YOUTUBE

JANEIRO DE 2021, ATÉ O DIA 16

(SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 2:10-16/1)

CASOS ACUMULADOS: 8.455.059 - ÓBITOS ACUMULADOS: 209.296

Mortos por asfixia

O Ministério das Relações Exteriores afirma ter comprado 2 milhões de doses da vacina da AstraZeneca/Oxford da Índia. Nos dias seguintes, o governo federal organiza uma grande operação de propaganda, incluindo a divulgação massiva na mídia e adesivagem de um Airbus da Azul Linhas Aéreas, que faria uma “viagem histórica” com o slogan: “Vacinação - Brasil imunizado - Somos uma só nação”. Bolsonaro chega a enviar uma carta ao Primeiro Ministro da Índia solicitando urgência no envio das doses, mas a operação é suspensa pela Índia. Diante do colapso da saúde em Manaus, com pacientes morrendo asfixiados por falta de oxigênio na rede hospitalar, o ministro da Saúde, general da ativa Eduardo Pazuello, declara: “O que você vai fazer? Nada. Você e todo mundo vão esperar chegar o oxigênio para ser distribuído”. (Foto de BRUNO KELLY / REUTERS).

Bolsonaro veta parte da Lei Complementar nº 177, de 12/1/20, aprovada por ampla maioria no Senado (71 x1 votos) e na Câmara dos Deputados (385 x 18 votos). Segundo a Agência FAPESP, vetos presidenciais subtraem 9,1 bilhões de reais dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação neste ano, impedindo que o Brasil desenvolva uma vacina contra a covid-19, apesar de ter infraestrutura e recursos humanos suficientes. Comunidades acadêmica e empresarial mobilizam-se para derrubada dos vetos,

O que Bolsonaro diz:

“O BRASIL ESTÁ QUEBRADO, CHEFE. EU NÃO CONSIGO FAZER NADA. EU QUERIA MEXER NA TABELA DO IMPOSTO DE RENDA, TÁ, TEVE ESSE VÍRUS, POTENCIALIZADO PELA MÍDIA QUE NÓS TEMOS, ESSA MÍDIA SEM CARÁTER

5/1, NA SAÍDA DO PALÁCIO DO PLANALTO

ELIANE BRUM, do EL PAÍS, em 21 JAN 2021 - 16:13

'Governos que não responderam bem à pandemia serão responsabilizados nas urnas', diz professora de Oxford

Governos que não responderam bem à pandemia serão responsabilizados nas urnas e a derrota de Donald Trump nos Estados Unidos já é um exemplo disso, avalia Anna Petherick, professora de políticas públicas na Universidade de Oxford.

Presidências de Trump e Bolsonaro serão marcadas pela forma como lidaram com a pandemia

Pesquisadora do Brasil desde antes da pandemia, Petherick tem acompanhado as respostas do governo brasileiro à crise de saúde pública para o Oxford Covid-19 Government Response Tracker (Monitor de Oxford das Respostas Governamentais à Covid-19, em tradução livre).

Formada em ciências naturais por Cambridge e tendo estudado corrupção no Brasil em seu doutorado em Oxford, a professora da universidade britânica avalia que teria sido muito difícil evitar a segunda onda da pandemia no país, já que mesmo nações europeias muito mais ricas tiveram dificuldades nesse sentido.

Ela afirma, no entanto, que os sinais de alerta de que a situação iria piorar no Brasil já estavam presentes desde setembro. E que os governos estaduais e federal foram muito lentos em responder. "A velocidade de resposta tem forte influência na taxa de mortalidade", afirma.

Segundo Petherick, as deficiências do SUS (Sistema Único de Saúde) em Manaus já eram conhecidas desde antes da chegada do coronavírus e a primeira onda da pandemia no Amazonas deveria ter servido de alerta definitivo. Além disso, um mês antes da crise atual de falta de oxigênio nos hospitais, médicos já alertavam que esse problema iria acontecer.

A pesquisadora Anna Petherick, durante entrevista via zoom

Para Anna Petherick, Brasil teve uma resposta extremamente descoordenada com relação à pandemia

"Levou muito tempo para o governo tomar uma atitude. E, mesmo então, vimos que não há uma vontade política forte", diz a professora.

Segundo ela, diante do aumento do número de casos e de mortes no Brasil, e da emergência de novas variantes locais, é evidente que as medidas de isolamento precisam ser retomadas, ainda que os políticos estejam com receio de tomar essa atitude.

"Gostaria de (poder) dizer que estou otimista, mas acredito sinceramente que os próximos meses serão muito, muito difíceis", diz a professora. "No caso brasileiro, está muito claro que medidas de contenção e de isolamento precisam ser retomadas. Não há dúvida."

Confira abaixo os principais trechos da entrevista

BBC News Brasil - Num momento em que passamos por um segundo colapso da saúde em Manaus, qual é a sua avaliação da resposta do governo brasileiro à pandemia?

Anna Petherick - Sabíamos antes da pandemia que o SUS era muito deficiente no Amazonas, em termos de estrutura e de recursos. Recebemos então um alerta definitivo, que foi a dura forma como o Estado foi atingido na primeira onda.

Avalio então que a resposta à segunda onda foi decepcionante. Porque os casos estavam aumentando desde setembro. E quase um mês antes da crise recente de falta de oxigênio nos hospitais, os médicos já avisavam que isso iria acontecer.

Ainda assim, levou muito tempo para o governo do Estado tomar uma atitude. E, mesmo então, vimos nas últimas semanas que não há uma vontade política forte. Tem sido o Judiciário que tem forçado os Estados a tomar medidas. Manaus e o Amazonas poderiam estar fazendo muito mais neste momento.

Kelvia Andrea Goncalves, 16, uma jovem de cabelos lisos e pretos, de máscara, chora de olhos fechados e com expressão de grande dor, e é abraçada pela tia, uma mulher de meia idade e cabelos pretos, em frente a uma cruz de madeira azul que marca o túmulo da mãe, no cemitério Parque Taruma, em Manaus

A manauara Kevia Gonçalves se apoia na tia, Vanderleia dos Reis, durante o enterro de sua mãe, Andreia dos Reis, umas das vítimas de covid-19 em Manaus / CRÉDITO,REUTERS

BBC News Brasil - Como a resposta do governo brasileiro se compara à de outros países?

Petherick - Criei alguns gráficos que mostram o número de mortes ao longo do tempo e a força das políticas de resposta em diferentes áreas, para diferentes países. Há um índice que reúne todas as políticas de fechamento - de escolas, de transporte, de locais de trabalho. E outro que acompanha as iniciativas de apoio econômico, incluindo alívio de obrigações financeiras das famílias e políticas de transferência de renda.

Assim, podemos acompanhar como esses diferentes aspectos da política de resposta à pandemia evoluíram ao longo do tempo. Fiz isso para o Brasil, os Estados Unidos - outro grande país que teve muitos casos da doença - e a África do Sul, que também está sofrendo com novas variantes e tem recursos econômicos limitados.

Observamos que o Brasil reduziu muito sua resposta econômica no período recente. Mas não houve aumento significativo no índice de medidas de contenção e fechamento, como vemos, por exemplo, na África do Sul, que também está passando por uma segunda onda. Já os Estados Unidos nunca reduziram substancialmente suas medidas de contenção e fechamento como o Brasil.

Então as políticas brasileiras de resposta à pandemia estão, de maneira geral, realmente sendo mais e mais reduzidas. Não apenas as respostas econômicas, mas as de contenção e fechamento, que impedem as pessoas de se misturarem.

Enquanto isso, o número de casos cresce em meio à segunda onda. Isso é muito preocupante e distingue o Brasil com relação a outros países.

BBC News Brasil - Há outros fatores que diferenciam o Brasil dos demais lugares?

Petherick - Outra coisa que observamos é que o Brasil é muito lento para responder. E sabemos que a velocidade de resposta tem forte influência em termos de taxa de mortalidade.

Um outro fator que distingue o Brasil é sua arquitetura institucional. O país tem um sistema federativo muito descentralizado e, diferentemente de outros sistemas federativos, como o Canadá, há muito pouca coordenação.

Profissional de saúde aplica vacina contra covid-19 em mulher em Manaus / CRÉDITO,REUTERS

O Brasil começou a vacinação duas semanas depois de países como Reino Unido e Estados Unidos

BBC News Brasil - Há medidas que deveriam ter sido tomadas no Brasil e não foram? Em caso positivo, quais medidas?

Petherick - Com relação às medidas de fechamento, não há solução mágica. Não dá para fechar o transporte, por exemplo, e não fechar locais de trabalho. Isso não funciona.

A ideia dessas medidas é essencialmente impedir pessoas de domicílios diferentes de se misturar. Então não faz sentido fechar algumas coisas, se as pessoas ainda estão se encontrando de outras formas.

Há outras coisas que o Brasil definitivamente deveria ter feito. Uma delas está relacionada às campanhas de informação pública.

Minha equipe tem realizado pesquisas de opinião no Brasil. Fizemos uma grande pesquisa em nove capitais em maio e repetimos esse levantamento em agosto e setembro, para entender como as pessoas estavam entendendo as campanhas de informação pública.

O que nós encontramos é que as pessoas estão recebendo a informação. E, mesmo aquelas com baixa instrução, têm ótimo entendimento dos sintomas da covid e de como reconhecê-los. Mas, se você disser às pessoas que elas precisam se auto isolar, elas não têm ideia do que isso significa de fato.

Cerca de 95% das pessoas ouvidas na nossa pesquisa mais recente achavam que sair com uma máscara é OK, caso você esteja contagioso. Então, eu avalio que o conteúdo das campanhas de informação pública pode ser muito melhorado.

BBC News Brasil - Como a conduta do governo afeta a resposta da população às medidas de contenção da pandemia?

Petherick - Sabemos que as políticas governamentais têm forte impacto no comportamento da população. Nós olhamos para as estatísticas, comparando o momento em que as políticas foram introduzidas e como isso afetou a mobilidade das pessoas, monitorada a partir dos telefones celulares. Assim, podemos ver como isso mudou ao longo do tempo.

O que observamos é que, inicialmente, as pessoas mudaram muito seu comportamento, de maneira dramática. Mas há um tipo de fadiga comportamental. Então, com o tempo, mesmo com a manutenção das políticas, as pessoas se cansam e seu comportamento muda, reduzindo o isolamento.

Mas o que me parece realmente interessante é que, mesmo que a resposta das pessoas às políticas esteja diminuindo, elas nunca voltaram ao que era antes da introdução dessas medidas. Então, embora pareça que as pessoas estão levando suas vidas como antes, na verdade, os dados sugerem que não, e que elas ainda estão respondendo às políticas.

BBC News Brasil - Na sua avaliação, a situação atual em Manaus e a segunda onda da pandemia poderiam ter sido evitadas?

Petherick - Na minha percepção, teria sido muito difícil evitar completamente a segunda onda. Países europeus ricos também tiveram dificuldades, caso também do Reino Unido.

Mas muito poderia ter sido feito de forma diferente. Particularmente, por volta de setembro ou outubro, já havia sinais de alerta de que as coisas iriam piorar novamente. E os governos estaduais foram muito lentos em responder.

Também acredito que o governo federal poderia, de muitas maneiras distintas, ter exercido melhor um papel de coordenação. Divulgado mensagens muito mais claras sobre os problemas que o país estava enfrentando.

BBC News Brasil - É correto dizer que o governo brasileiro foi negligente em sua resposta à pandemia?

Petherick - Acredito que os representantes eleitos têm uma responsabilidade que vem com o cargo. E parte dessa responsabilidade é dizer a verdade e buscar o bem comum. Alguns políticos brasileiros não deram as melhores recomendações de saúde pública possíveis.

Não quero aqui criticar os servidores públicos, que têm trabalhado muito duro. Converso com eles com alguma frequência, particularmente na esfera municipal, e eles estão ansiosos pelas melhores informações, para tomar as melhores decisões possíveis.

Então eu não diria que o poder público foi totalmente negligente no Brasil. Mas definitivamente acredito que, em muitos momentos, as pessoas que estão no poder deveriam ter agido de forma mais responsável.

BBC News Brasil - Governos que não seguiram adequadamente as recomendações da OMS com relação à pandemia poderão ser responsabilizados de alguma maneira?

Petherick - A maneira mais provável como governos que não responderam bem à pandemia serão responsabilizados será nas urnas. Já vimos sinais nesse sentido nas eleições recentes e acredito que essa tendência deve continuar nos próximos anos.

Acredito que o resultado das eleições americanas tem em parte a ver com isso. É claro que a história é mais complicada, mas esse é um ponto relevante de por que Donald Trump foi derrotado.

BBC News Brasil - Existe um risco de que o início da vacinação reforce a percepção das pessoas que a pandemia está próxima do fim, levando-as a se comportar de maneira mais arriscada?

Petherick - Se você diz às pessoas que há um fim à vista, isso pode levar a dois desdobramentos diferentes. Pode levá-las a agir de maneira menos responsável, particularmente, se elas acharem que os mais vulneráveis estarão logo protegidos.

Então acredito que a mensagem de saúde pública deve incentivar a resposta alternativa. Que é: 'o fim está logo ali, então é possível aguentar mais um pouco. Vocês podem respeitar as medidas de contenção só mais um pouquinho, porque há uma luz no fim do túnel, mas precisamos continuar agindo com responsabilidade, até que todos estejam vacinados'.

BBC News Brasil - O fim do auxílio emergencial também deve levar as pessoas a assumirem mais riscos para poder trabalhar?

O ministro Eduardo Pazuello / CRÉDITO,SEBASTIAO MOREIRA/EPA

Ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello é responsável por liderar combate à covid no governo federal

Petherick - Analisando estatísticas sobre como medidas de transferência de renda e alívio de obrigações financeiras ajudaram as pessoas ao redor do mundo a cumprir políticas de contenção da pandemia, a mensagem é muito clara. Quando países oferecem apoio econômico à população, as pessoas são muito mais capazes de ficar em casa.

Então, agora que o Brasil tem menos apoio econômico para as famílias, esse é um fator de preocupação.

BBC News Brasil - O que deveria ser mudado nas políticas públicas de resposta à pandemia em 2021?

Petherick - No caso brasileiro, está muito claro que medidas de contenção e isolamento precisam ser retomadas. Não há dúvida. No momento, o número de casos está crescendo, há novas variantes e é realmente necessário impedir que pessoas de domicílios diferentes interajam.

Uma outra coisa que os países talvez devam fazer diferente é que, agora, com o surgimento de novas variantes no Reino Unido, Brasil e África do Sul, precisamos de políticas mais responsáveis.

Não apenas em termos de testar as pessoas que estão chegando aos países, mas também aquelas que estão saindo. Isso poderia ser feito através de acordos recíprocos ou algum tipo de acordo internacional nesse sentido.

BBC News Brasil - E quanto à reabertura de escolas? É possível reabri-las com segurança em meio à segunda onda de casos e mortes por covid-19?

Petherick - A questão da reabertura das escolas tem sido difícil desde o início da pandemia. No começo, houve pesquisas sugerindo que a reabertura não causava grande aumento na transmissão. Mas, com o passar do tempo, novas evidências surgiram mostrando que não é bem o caso.

Uma coisa que me parece muito importante para o Brasil - e que aparece nas nossas pesquisas no país - é que professores, particularmente nas escolas públicas, precisam de muito mais apoio.

Analisamos a proporção de famílias que dizem que seus filhos receberam material diretamente de seus professores para continuar estudando em casa. Isso é considerado um sinal de educação de qualidade, porque o professor sabe que tipo de material é adequado para seus alunos.

Vemos que essa proporção aumentou ao longo do tempo nos domicílios em que os filhos frequentam escolas privadas. Mas não houve mudanças para os alunos de escola pública. Isso é algo que o governo poderia muito bem fazer no Brasil: encontrar formas de melhor apoiar os professores de escola pública.

BBC News Brasil - Mas as aulas presenciais podem ser retomadas a essa altura?

Petherick - No momento, acredito que seria um risco retomar as aulas presenciais, sem fortes medidas nas escolas para permitir o distanciamento social dos alunos. Não temos ações de controle suficientes para que isso seja seguro.

Certamente isso é possível e alguns países, particularmente os escandinavos, têm feito um excelente trabalho nesse sentido. Mas é uma tarefa muito difícil, que exige muitos recursos e planejamento.

BBC News Brasil - Professores deveriam ter prioridade na vacinação?

Petherick - Isso depende de qual será a política com relação à reabertura das escolas. Se as escolas forem reabertas e não houver outras políticas sendo colocadas em prática para manter o distanciamento entre o estudantes, então escolas podem se tornar focos de surtos e é razoável considerar que professores possam ser um dos grupos prioritários na vacinação, porque, do contrário, eles estarão expostos a risco.

BBC News Brasil - Sei que é difícil fazer previsões em uma situação tão inédita quanto a pandemia, mas a senhora acredita que 2021 será melhor ou pior para o Brasil em termos da pandemia, diante das respostas do poder público?

Petherick - Eu gostaria de (poder) dizer que estou otimista, mas acredito sinceramente que os próximos meses serão muito, muito difíceis. O atual aumento no número de casos e de mortes é particularmente preocupante porque há uma sensação de que os políticos estão com medo de retomar medidas rígidas de isolamento.

É claro que eles têm preocupações políticas com relação a isso. Mas acredito que eles não deveriam se preocupar tanto se as pessoas responderão às medidas, se essa é uma das razões pelas quais eles estão reticentes.

Como falamos, as pessoas têm de fato uma fadiga comportamental, à medida que as ações se estendem por muito tempo. Mas elas nunca pararam completamente de responder às ações, então os políticos não deveriam se deter por esse temor.

BBC News Brasil - A performance do Brasil na pandemia pode mudar a percepção do mundo com relação ao país?

Petherick - Acredito que os países estão se vigiando nesse momento e acompanhando as notícias uns dos outros, para tentar entender o que vai acontecer com o mundo depois de tudo isso. Na academia, há algo que chamamos de 'momentos críticos', que são esses momentos em que tudo vai pelos ares e as coisas mudam. A covid-19 pode ser um desses momentos.

O Brasil teve uma resposta extremamente descoordenada com relação à pandemia. E alguns dos acontecimentos correram o mundo. Por exemplo, algumas das mensagens do presidente. As pessoas na Europa têm acompanhado isso e ficam chocadas com algumas das coisas ditas.

Mas isso não aconteceu apenas no Brasil, aconteceu também com outros líderes mundiais que insistiram que essa não é uma doença tão perigosa, como de fato se provou ser.

Algumas imagens do Brasil correram o mundo. Particularmente, as imagens de Manaus, das pessoas sem oxigênio, chegaram a mim aqui em Oxford pelas páginas dos principais sites de notícia. Mas também há muita empatia. Não é apenas a política que determina a forma como as pessoas no exterior percebem o Brasil.

Thais Carrança, de São Paulo para a BBC News Brasil / Há 42 minutos

'Tratamento precoce': governo Bolsonaro gasta quase R$ 90 milhões em remédios ineficazes, mas ainda não pagou Butantan por vacinas

Bolsonaro disse ter usado cloroquina para se tratar da covid-19

O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já gastou quase R$ 90 milhões com a compra de medicamentos sem eficácia comprovada no tratamento da covid-19, como cloroquina, azitromicina e o Tamiflu. Ao mesmo tempo, ainda não pagou o Instituto Butantan, que entregou as primeiras doses de vacinas aplicadas no Brasil.

Desde o início da pandemia, tanto o presidente da República quanto o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello defenderam o chamado "tratamento precoce" para a Covid-19 — ou seja, o uso de medicamentos como os citados acima nas fases iniciais da doença. Os medicamentos, no entanto, se mostraram ineficazes em diversos estudos rigorosos realizados ao redor do mundo.

Até agora, os gastos da União com cloroquina, hidroxicloroquina, Tamiflu, ivermectina, azitromicina e nitazoxanida somam pelo menos R$ 89.597.985,50, segundo levantou a reportagem da BBC News Brasil por meio de fontes públicas.

Caos em Manaus: 'Meu irmão morreu em hospital particular, e a conta é de R$ 180 mil"

'Brasil passado para trás': as questões práticas e políticas que travam envio de vacinas e insumos de China e Índia

Brasil deve enfrentar pior fase da pandemia nas próximas semanas

Algumas das drogas, como o antiparasitário nitazoxanida, pareceram funcionar contra o vírus em testes in vitro, ou seja, em laboratório. Mais tarde, porém, novos estudos mostraram que as drogas não funcionam em seres humanos.

O mesmo aconteceu com a cloroquina: após testes iniciais, a Organização Mundial de Saúde (OMS) interrompeu a pesquisa com o produto em meados de 2020, depois que ela se mostrou ineficaz.

Apesar disso, o Laboratório Químico Farmacêutico do Exército comprou uma tonelada do ingrediente farmacêutico ativo (IFA) para a produção de cloroquina, em maio de 2020, por pouco mais de R$ 1,3 milhão.

Naquele mês, o Ministério da Saúde lançou um protocolo para atendimento da covid-19 que recomendava o uso da cloroquina associada à azitromicina, aos primeiros sintomas da doença.

Além dos medicamentos, o governo federal também investiu em vacinas contra o SARS-CoV-2.

A aposta inicial do governo foi na chamada "vacina de Oxford", desenvolvida pela farmacêutica britânica AstraZeneca. A União também aderiu ao consórcio coordenado pelo OMS para a compra de imunizantes, chamado de Covax Facility.

Em dezembro de 2020, o Ministério da Saúde assinou um convênio com o Instituto Butantan, que é ligado ao governo do Estado de São Paulo, para investir na "aquisição dos equipamentos para o centro de produção multipropósito de vacinas" — o valor era de R$ 63,2 milhões, que no entanto ainda não foram pagos.

Além disso, o governo federal também comprará as doses da CoronaVac produzidas pelo Butantan.

Novamente, porém, o pagamento ainda não foi feito. Em nota à BBC News Brasil no começo da semana, o Ministério da Saúde informou que pagará ao Butantan depois que as 100 milhões de doses da vacina contratadas forem entregues.

No domingo (17/01), Pazuello disse que o Ministério da Saúde fez "o desenvolvimento do parque fabril do Butantan para fazer a vacina". "Fizemos um contrato de convênio de mais de R$ 80 milhões. Isso em outubro (de 2020). Você sabia disso? Pois é", reclamou o ministro na entrevista aos jornalistas. A declaração é imprecisa, pois o investimento ainda não foi feito.

Ao longo de 2020, o governo federal pagou R$ 733.707.652,36 ao Instituto Butantan — mas o dinheiro foi para a compra de vacinas para outras doenças, e não faz parte da ação orçamentária criada para gastos relacionados à pandemia. A cifra foi levantada pela BBC News Brasil usando a ferramenta Siga Brasil, do Senado Federal.

Tratamento precoce não funciona, diz médico infectologista

Renato Grinbaum é médico infectologista e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e reitera que o "tratamento precoce" não tem eficácia comprovada e não deve ser adotado.

"O tratamento precoce não é eficaz, não tem eficácia comprovada. E por isso não é recomendado nem pela Organização Mundial de Saúde (OMS), nem pela Associação Médica Brasileira (AMB), nem pelas sociedades brasileiras de Infectologia (SBI) e Pneumologia e Tisiologia (SBPT)", diz o especialista.

Bolsonaro defende uso da cloroquina, mesmo sem evidências científicas dos seus efeitos contra a covid-19

"Os estudos não mostram qualquer benefício, e nós observamos que, na prática, há muitos pacientes internados depois de se automedicarem com este chamado tratamento precoce, que deveria evitar essas internações", diz o médico. "Então nós vemos, muito claramente, que este tratamento não funciona", diz ele.

"Se fosse assim, em Manaus (AM) nós não estaríamos com este problema, porque muitas pessoas usam, e continuam precisando de internação da mesma forma", diz Grinbaum. O sistema de saúde colapsou na capital amazonense no começo de 2021.

"As autoridades deveriam direcionar seus gastos para três coisas. A primeira é aparelhar os hospitais, para evitar as cenas de caos que a gente viu. A segunda coisa é a vacina, que ela é realmente eficaz. E a terceira coisa são as ações educativas e de supervisão, para a prevenção da covid-19", diz.

"Supervisionar bares que estão abertos, fechar festas clandestinas, tudo isto é gasto público", diz o especialista.

Até esta quarta-feira (20), o novo coronavírus já tinha infectado mais de 8,6 milhões de brasileiros. E ao menos 212.831 pessoas no país perderam a vida para a doença, segundo os dados oficiais do Ministério da Saúde.

Como o governo federal gastou o dinheiro

Até o momento, as compras da União de medicamentos para o "tratamento precoce" da Covid-19 somam ao menos R$ 89.597.985,50, segundo levantou a BBC News Brasil.

Este é o valor despendido com a compra de Tamiflu, azitromicina, ivermectina, cloroquina, hidroxicloroquina e nitazoxanida.

De todos os medicamentos, o maior gasto foi com o fosfato de oseltamivir — que é comercializado sob o nome de Tamiflu.

O governo federal gastou ao menos R$ 85.974.256,00 com o medicamento em 2020, segundo dados do próprio ministério. A maior compra foi feita ao laboratório Roche, dono da marca Tamiflu, por R$ 26,6 milhões em 20 de maio passado — também com dispensa de licitação.

No mesmo dia 20 de maio, o Ministério da Saúde divulgou um documento no qual recomendava o uso do Tamiflu nos estágios iniciais da doença, especialmente para pessoas no grupo de risco da Covid-19. A orientação era começar o tratamento até 48h depois do início dos sintomas.

Com a cloroquina, a União contratou a compra de ao menos R$ 1.462.561,50. Deste total, R$ 940.961,50 foram desembolsados até o fim de 2020.

No caso do governo federal, foram duas compras principais, feitas pelo Comando do Exército por meio do Laboratório Químico Farmacêutico da força. As duas aquisições, de R$ 652 mil cada, foram feitas com dispensa de licitação nos dias 06 de maio e 20 de maio do ano passado.

As duas compras foram arrematadas por empresas que possuem nomes bastante parecidos: "Sul de Minas Ingredientes LTDA" e "Sulminas Suplementos e Nutrição LTDA". Ambas estão sediadas na pequena cidade de Campanha (MG) e pertencem ao mesmo dono, Marcelo Luis Mazzaro.

Ao todo, a União adquiriu uma tonelada do chamado insumo farmacêutico ativo (IFA) usado na produção da cloroquina. E os gastos totais são ainda maiores, pois além da matéria prima, também foram adquiridos alumínio para as cartelas do medicamento e outros insumos.

Além destes dois contratos principais, há outras 11 notas de empenho do Laboratório Químico Farmacêutico do Exército para compras menores de cloroquina com as empresas de Mazzaro. A princípio, não há qualquer irregularidade nestas compras.

Com o antibiótico azitromicina, o governo federal gastou outros R$ 1.994.884,40. A maior compra foi feita pelo próprio Ministério da Saúde (R$ 1,1 milhão).

André Shalders - @andreshalders, da BBC News Brasil em Brasília / Há 5 horas

Coronavírus: variante achada no Brasil poderia 'driblar' anticorpos e reinfectar quem já teve covid-19, diz pesquisador

                           

Coronavírus / CRÉDITO,EPA,

Mais estudos são necessários para mensurar impacto de neutralização reduzida por anticorpos em nossa imunidade, diz Tulio de Oliveira

Um novo estudo de cientistas da África do Sul, ainda não revisado por pares, dá maior respaldo às evidências crescentes de que mutações compartilhadas pelas variantes do coronavírus detectadas no Brasil e na África do Sul podem não ser neutralizadas por anticorpos produzidos pelo organismo de quem já foi infectado pelo SARS-CoV-2, o vírus que causa a covid-19.

Isso abre a possibilidade de que pessoas que tiveram doença sejam infectadas novamente se expostas a essas variantes, diz à BBC News Brasil Tulio de Oliveira, responsável pelo estudo e diretor do laboratório Krisp na Escola de Medicina Nelson Mandela, na Universidade KwaZulu-Natal, em Durban, na África do Sul, onde vive desde 1997.

No entanto, mais estudos são necessários para mensurar o impacto dessa 'neutralização reduzida' dos anticorpos em nossa imunidade, ressalva ele.

Segundo Oliveira, testes em laboratório a partir do "vírus vivo" da cepa achada na África do Sul (501Y.V2) contendo mutações como E484K e N501Y — presentes também na variante do Brasil, mas não na do Reino Unido — mostraram "zero ou muito baixa neutralização" do patógeno pelos anticorpos.

Oliveira chefiou a equipe que descobriu a nova variante do coronavírus na África do Sul e compartilhou os dados com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o que, por sua vez, permitiu ao Reino Unido detectar a outra variante em seu território.

Acredita-se que todas essas variantes sejam mais transmissíveis do que a original, mas não se sabe, por enquanto, se mais letais. De todo modo, tende a haver mais mortes porque há muito mais casos.

Oliveira acrescenta que suas mais recentes descobertas também levantam "uma grande questão" sobre a eficácia das vacinas.

"Se os resultados do laboratório mostram que essa variante é menos neutralizada pelos anticorpos, isso terá algum efeito na eficácia das vacinas?", questiona Oliveira.

"No momento, presumimos que a eficácia das vacinas não será comprometida. E se for, será pouco (comprometida). Porque as vacinas desencadeiam uma resposta imunológica alta, produzindo muitos anticorpos, por exemplo. Mas ainda é uma questão a ser respondida", acrescenta.

Ele reforça que esses primeiros resultados não podem servir de "desculpa" para interromper os programas de vacinação em todo o mundo.

"Esse vírus nos mostrou que se deixarmos ele circular livremente por muito tempo, se adaptará melhor à transmissão e, potencialmente, escapar de ser neutralizado pelo sistema imunológico".

"Temos que aumentar com urgência as taxas de vacinação e a resposta da saúde pública para que possamos controlar as taxas de infecção o mais rápido possível e reduzir as taxas de mortalidade por essas variantes altamente infecciosas", acrescenta.

'Se vírus continuar circulando livremente, risco de ele se adaptar melhor aumenta', diz brasileiro que descobriu nova mutação do coronavírus


Oliveira diz que neutralização reduzida poderia ser uma das explicações para explosão de casos                                                         durante segunda onda em Manaus

'Vírus vivo'

Nos últimos dias, vários estudos indicaram que mutações "escapariam" da ação de anticorpos neutralizantes produzidos pelo corpo contra o SARS-CoV-2.

No entanto, Oliveira e sua equipe foram além e usaram o "vírus vivo" pela primeira vez em testes de laboratório em oposição ao chamado pseudovírus — uma "técnica mais avançada", explica Oliveira, usando todas as mutações incluídas no vírus, e, então, fizeram comparações usando a variante anterior da covid-19.

"Os resultados mostram que mais de 50% do plasma convalescente (com anticorpos) exposto ao vírus não obteve neutralização. E os outros 50% obtiveram neutralização de baixo nível. Quase metade dos indivíduos com quase nenhuma neutralização parecia nunca ter visto o vírus antes", explica Oliveira.

"O melhor modelo para testar isso é com o vírus vivo, você pega o vírus inteiro, você infecta as células e faz crescer no laboratório, é uma técnica mais avançada e depois você o re-expõe ao plasma convalescente, então você considera o taxa de crescimento do vírus e como ele é neutralizado".

"Concluímos que houve uma neutralização do vírus muito menor, tão menor que, em tese, são necessários cerca de 10 a 15 vezes mais anticorpos para neutralizar o mesmo vírus em comparação com a variante anterior", acrescenta Oliveira.

Segundo ele, "não são boas notícias. Esperávamos que aqueles que já tiveram a covid-19 não fossem infectados novamente. Isso abre as portas para o vírus com essas mutações reinfectar as pessoas. É uma das principais questões a serem respondidas nas próximas semanas".

Oliveira assinala que mais estudos são necessários para determinar o impacto disso em nossa imunidade, pois nossa resposta imunológica não depende apenas dos anticorpos, mas também das chamadas células T, que atuam em conjunto com eles.

Jesse Bloom, professor-associado de Ciências do Genoma e Microbiologia da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, concorda.

"É definitivamente claro que as mutações no RBD (domínio de ligação ao receptor), especialmente a mutação E484K encontrada na linhagem 501Y.V2, reduzem a neutralização do anticorpo. No entanto, atualmente não está claro o quanto essa neutralização reduzida diminui a eficácia protetora da imunidade", diz ele por e-mail à BBC News Brasil. O RBD é uma pequena porção da proteína S do SARS-CoV-2, chave para a ligação do vírus às células humanas e sua infecção.

Cientistas acreditam que essa "neutralização reduzida" pode ser uma das razões pelas quais algumas partes da África do Sul e da cidade de Manaus, no Amazonas, muito atingidas durante o primeiro pico da pandemia, foram de novo amplamente afetadas pela segunda onda — levantando dúvidas sobre a chamada "imunidade de rebanho" que alguns especialistas já haviam dito ter sido alcançada nessas áreas por meio de infecções em massa.

A imunidade de rebanho ocorre quando uma parcela grande o suficiente da população desenvolve uma defesa imunológica contra um patógeno. Nesse cenário, a doença não consegue se espalhar porque a maioria das pessoas é imune e ela passa a ter grande dificuldade para encontrar alguém suscetível. Esse patamar é atingido pela vacinação em massa, e não por infecções em massa.

"Naturalmente, seria de se esperar que essas regiões não fossem muito afetadas pela segunda onda da pandemia, e não é o que vimos", diz Oliveira.

"Ainda temos que investigar se essa nova variante menos neutralizada por anticorpos em laboratório causará maiores taxas de infecção", acrescenta.

"O objetivo da vacina não é parar a transmissão; é fazer com que as pessoas que são infectadas não desenvolvam sintomas muito sérios. O principal objetivo é salvar vidas. E não só a vacina, mas a resposta da saúde pública, de testagem e rastreamento e isolamento e medidas de distanciamento social para tentar diminuir o número de infectados", conclui.

Luis Barrucho - @luisbarrucho, da BBC News Brasil em Londres / Há 53 minutos

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Brasil registra 1.382 mortes por Covid em 24 horas, recorde desde agosto, e soma 212,8 mil óbitos

País contabilizou total de 212.893 óbitos e 8.639.868 casos de Covid-19, segundo balanço do consórcio de veículos de imprensa.
Por G1

O consórcio de veículos de imprensa divulgou novo levantamento da situação da pandemia de coronavírus no Brasil a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde, consolidados às 20h desta quarta-feira (20).

O país registrou 1.382 mortes pela Covid-19 nas últimas 24 horas, chegando ao total de 212.893 óbitos desde o começo da pandemia. É o maior número de óbitos registrado em 24 horas desde o dia 4 de agosto, quando a marca foi de 1.394. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil nos últimos 7 dias foi de 983. A variação foi de +33% em comparação à média de 14 dias atrás, indicando tendência de crescimento nos óbitos pela doença.

Em casos confirmados, desde o começo da pandemia 8.639.868 brasileiros já tiveram ou têm o novo coronavírus, com 64.126 desses confirmados no último dia. A média móvel nos últimos 7 dias foi de 54.630 novos diagnósticos por dia. Isso representa uma variação de +50% em relação aos casos registrados em duas semanas, o que indica tendência de crescimento também nos diagnósticos.

Doze estados estão com alta nas mortes: MG, RJ, SP, GO, MT, AM, RO, RR, TO, AL, PE e SE.

Brasil, 20 de janeiro

Total de mortes: 212.893
Registro de mortes em 24 horas: 1.382
Média de novas mortes nos últimos 7 dias: 983 (variação em 14 dias: +33%)
Total de casos confirmados: 8.639.868
Registro de casos confirmados em 24 horas: 64.126
Média de novos casos nos últimos 7 dias: 54.630 por dia (variação em 14 dias: +50%)
(Antes do balanço das 20h, o consórcio divulgou um boletim parcial às 13h, com 211.646 mortes e 8.579.575 casos confirmados.)

Estados

Subindo (12 estados): MG, RJ, SP, GO, MT, AM, RO, RR, TO, AL, PE e SE
Em estabilidade (9 estados): PR, RS, ES, AP, PA, BA, MA, PI e RN
Em queda (5 estados + DF): SC, DF, MS, AC, CE e PB
Essa comparação leva em conta a média de mortes nos últimos 7 dias até a publicação deste balanço em relação à média registrada duas semanas atrás (entenda os critérios usados pelo G1 para analisar as tendências da pandemia).

Vale ressaltar que há estados em que o baixo número médio de óbitos pode levar a grandes variações percentuais. Os dados de médias móveis são, em geral, em números decimais e arredondados para facilitar a apresentação dos dados.

Publicado por G1, em 20.01.2021

Kamala Harris, a primeira mulher vice-presidente dos EUA

A democrata de ascendência indiana e jamaicana costuma ser pioneira nos cargos que ocupa. Agora entra para a história como a primeira mulher a ocupar a vice-presidência dos Estados Unidos.

Kamala Harris é conhecida como política combativa e de intelecto aguçado

É fácil descrever o cálculo político que levou o novo presidente americano, Joe Biden, a escolher Kamala Harris como sua vice-presidente. Mais difícil é definir qual é exatamente a linha política dela, em termos de conteúdo.

Dentro de, no mínimo, 25 anos, a maioria da população americana não será mais branca. Desde já, há cada vez mais eleitores cujas raízes não são europeias, mas sim asiáticas ou africanas. Ao escolher Harris, Biden, enquanto "homem branco velho de Delaware", queria mostrar que entendeu os sinais dos tempos.

A mãe de Harris, a conceituada pesquisadora de câncer da mama Shyamala Gopalan, emigrou em 1960 da Índia para os Estados Unidos; seu pai, o professor de economia Donald J. Harris, vinha da Jamaica. Quando ela tinha sete anos, ambos se divorciaram. Kamala e a irmã Maya cresceram primeiro em Montréal, Canadá, onde a mãe ocupava um posto como pesquisadora. Mais tarde, retornaram a Oakland, Califórnia, local de nascimento da futura vice-presidente americana.

Exclusão convertida em impulso de sucesso

Harris se refere com frequência a suas raízes, acentuando o quanto a marcam até hoje as vivências de exclusão que teve na Califórnia dos anos 1970, devido à cor de sua pele. Igualmente marcante, contudo, foi o espírito batalhador da mãe, ativa no movimento de direitos civis do campus da Universidade de Berkeley.

"Minha mãe nos educou para sermos mulheres fortes", escreve Harris em sua recém-lançada autobiografia, The truths we hold (As verdades que contemos). Shyamala ensinava às filhas: "Não fiquem sentadas aí se queixando. Façam algo!" Uma ordem que, ao que tudo indica, Kamala tomou à risca.

Ela estudou Ciências Políticas e Economia na Universidade Howard, em Washington, depois Direito em San Francisco. Após licenciar-se em 1990, iniciou a carreira de promotora, conquistando rapidamente fama de mulher combativa, de intelecto hiper-aguçado.

Em sua autobiografia, a democrata narra como converteu as vivências precoces de exclusão no impulso para ser a primeira, uma pioneira em diversos campos. Em 2003, foi eleita primeira procuradora-geral do distrito e da cidade de San Francisco. Em 2010 candidatou-se à vaga de procuradora-geral da Califórnia, e se impôs contra seis outros candidatos, assumindo em 3 de janeiro de 2011.

Nos EUA, esse cargo equivale a uma combinação de secretária da Justiça e procuradora-geral da República. Harris foi não só a primeira mulher a ocupá-lo, mas também a primeira pessoa de origem indiana e afro-americana.

Linha política controversa

Desde cedo, seus posicionamentos políticos causaram polêmica. Se, por um lado, se manifestava contra a pena de morte, por outro indignou a ala mais à esquerda do Partido Democrata ao votar para que os responsáveis pelos "matadores de aula" crônicos nas escolas fossem punidos com até um ano de prisão.

No início de 2015, anunciou sua candidatura para o Senado, contando com apoio de uma ampla base democrata, incluindo o então presidente Barack Obama – cuja candidatura presidencial ela, por sua vez, apoiara – e do vice-presidente Joe Biden. Em 2017 ela se tornou a segunda senadora americana negra.

Desde 2014 Harris é casada com o advogado judeu Douglas Emhoff, pai de duas crianças. Em diversas ocasiões foi cogitada como pretendente democrata à presidência dos Estados Unidos. Ao finalmente confirmar sua candidatura, em 2019, inicialmente era a favorita, à frente dos concorrentes Joe Biden, Bernie Sanders e Elizabeth Warren.

Porém sua apreciação nas pesquisas de opinião foi caindo, e em dezembro ela renuncio à candidatura. Apesar de muitas vezes ter se chocado de frente com Biden durante a pré-campanha, ele a indicou como sua eventual vice-presidente.

Em geral, trata-se de um cargo com sentido meramente estratégico, a fim de angariar votos que o candidato presidencial não conseguiria. No caso de Harris, contudo, a escolha como vice-presidente tem um significado muito maior.

Ao ser empossado, Joe Biden será o presidente mais idoso da história americana, com 78 anos. É perfeitamente possível que ele não consiga cumprir até o fim seus quatro anos de mandato. Aí, sem necessidade de novas eleições, Kamala Harris assumirá. E mais uma vez será a primeira, como mulher de cor à frente da Casa Branca.

Deutsche Welle, em 20.01.2021