quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Uma trilha sonora para um Brasil pandêmico

O presidente está mais para lobisomem de filme de Mazzaropi do que para Duce... 

O presidente da República está em plena Revolta da Vacina. Tem ciúme da vacina. Tem ciúme de quem a tem e mais ciúme ainda de quem a terá. O presidente se descabela e se rebela. Homem do seu tempo, vive com ardor o ano de 1904. Quer atirar cadeiras nos mata-mosquitos de Oswaldo Cruz, mas o sanitarista, mau brasileiro, impatriótico, sumiu de cena antes que terminasse o ano da desgraça e não mais se voluntaria a receber desaforos.

O presidente, resoluto, impoluto e estulto, não desiste. Não abre mão da revolta. Na falta do Cruz, dispara perdigotos contra o Instituto Butantan. A vacina que se cuide. Estão pensando o quê?

A fúria presidencial, impetuosa, pomposa e prosa, é máscula, mas dança conforme a cançoneta: “Anda o povo acelerado/ com horror à palmatória/ por causa dessa lambança/ da vacina obrigatória”. Na voz do cantor Mário Pinheiro, os versos ressequidos arranham o mármore do Palácio do Planalto. Raiva da vacina. Ódio febril e varonil.

E o que virá depois? Inútil tentar descobrir. No Brasil, o passado é imprevisível (abraço, Pedro Malan).

Autoridades da Casa Branca visitam o palácio. A presidente do EximBank, o Banco de Exportação e Importação dos EUA, e o ministro da Economia daqui mesmo assinam um memorando que pode render empréstimos de até US$ 1 bilhão para o Brasil. Em troca, apoios auriverdes à cruzada de Washington para afugentar do mercado as tecnologias e empresas chinesas na implantação do 5G. Ao lado do presidente, o conselheiro de segurança nacional dos Estados Unidos participa da cerimônia.

Pensa o improvável leitor que essa solenidade foi anteontem, certo? Pois pensa errado. Outra vez, estamos mergulhados no interminável passado imprevisível. Ao fundo, Juca Chaves e um violãozinho se infiltram pelo ar-condicionado: “Hoje em dia o meu Brasil/ é uma país independente/ dentre as coisas que nós temos/ vê-se até dois presidentes./ (...) Um do sul, outro do norte/ que governam muito bem/ só que o norte é bem mais forte e governa o sul também (...)”.

Se fôssemos um pouco mais briosos – e irônicos –, iríamos de Assis Valente, o mais valente de todos e todas. Iríamos de Brasil Pandeiro. Celebraríamos malandramente que “o Tio Sam anda querendo conhecer a nossa batucada”. Festejaríamos desconfiados que “na Casa Branca já tocou a batucada de ioiô e iaiá”.

Depois disso, a gente brasileira abriria mão da malícia. Alguém desfilaria de bananas na cabeça – Carmem Miranda que nos acuda – e sacaria da manga do paletó, ou do decote, a carta ufanista que faz do samba o Rei Momo da cultura pátria, o símbolo brasileiro por excelência. Se não tiver samba, vai de rumba mesmo. Zé Carioca de mãos dadas a Mickey Mouse, Getúlio Vargas em bombachas. Se faltar a rumba, volte o samba-exaltação na veia, Ary Barroso na cabeça, “mulato inzoneiro” no meio da testa, hino nacional em feitio de batucada, jamais de oração. “Ai, essas fontes murmurantes”, coitado do jornalismo. Ai, esses vazamentos trepidantes. Ai, esse passado alucinante.

A TV Brasil exibiu com exclusividade um jogo do escrete canarinho. Consta que o narrador deu de mandar um abraço para o presidente do sul, o que deixou em estado de alerta máximo a vigilância democrática. Com toda a razão, embora não seja de hoje que as emissoras estatais botam banca e montam palanque para as “otoridade” se derramarem nos elogios recíprocos, fazendo campanha eleitoral fora de temporada. Não, não é de hoje. O cacoete da autopromoção em microfones públicos é antigo: é do passado.

O presidente prometera acabar com a EBC, a estatal que controla a TV Brasil, mas não era para acreditar. Não dava para acreditar. A facção de extrema direita que ganhou as eleições se julga a portadora da verdade e como confunde verdade com propaganda não pode viver sem propaganda. Ficaria sem verdade. Por isso jamais jogará fora um equipamento como a EBC, prontinho para ser repaginado em usina de verdades absolutas.

O que nos salva, agora, é que a facção de extrema direita que aí está não tem competência nem para ser fascista. Não é pra valer. Não tem compromisso com a coerência. Na TV Brasil, o presidente está mais para lobisomem de filmes de Mazzaropi (reprisados todos os dias) do que para Duce ou técnico de futebol. O seu fascismo é pastiche. Anauê paranauê. O fascismo termina no colo do Centrão, que quando o mercado favorece é direitão, mas não é bobo, não.

Um surdo pequeno bate o compasso. O presidente chuta a causa autoritária para escanteio e se enturma na patota do dinheiro na cueca, mais velha que a Revolta da Vacina. Entra a cuíca, que não é cueca, para entrecortar o balanço com agudos miúdos. Que samba bom. A voz macia de Blecaute estufa os alto-falantes estatais. De terno claro, camisa branca sem gravata, ginga natural, ele manda ver: “Ô, que samba bom/ ô, que coisa louca/ eu também tô aí/ tô aí, que é que há/ também tô nessa boca”.

Eugênio Bucci, o autor deste artigo, é Professor da Escola de Comunicações, Artes e Humanidades da Universidade de São Paulo. Publicado originalmente em O Estado de S. Paulo, edição de 22.10.2020.

Um presidente contra a Saúde

O que Bolsonaro deseja – e assim faz valer – é uma pasta incondicionalmente subserviente a suas idiossincrasias políticas e ideológicas

Em plena pandemia, o presidente Jair Bolsonaro demitiu dois ministros da Saúde porque eles insistiram em seguir os protocolos profissionais. Os médicos Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich recusaram-se a indicar um medicamento contra as evidências científicas e, por isso, tiveram de deixar a pasta. O presidente Bolsonaro queria um ministro da Saúde obediente às suas ordens, mesmo que elas afrontassem a ciência e a medicina. Foi assim que se chegou ao nome de Eduardo Pazuello para o Ministério da Saúde. Tão logo assumiu a pasta, o general de brigada ampliou, em estrita obediência ao arbítrio do chefe, o uso de cloroquina em pacientes com covid-19.

Ontem, o presidente Bolsonaro reiterou que, durante seu mandato, não quer o Ministério da Saúde atuando pela saúde pública. O que ele deseja – e assim faz valer – é uma pasta incondicionalmente subserviente a suas idiossincrasias políticas e ideológicas.

Na terça-feira, em reunião virtual com os 27 governadores, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, anunciou a assinatura de um protocolo de intenções para adquirir 46 milhões de doses da vacina Coronavac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan. Era uma decisão estritamente técnica, em benefício da população. No momento, a Coronavac é a vacina em estágio de testes mais avançado, tendo mostrado, até agora, os melhores índices de segurança. Com um investimento estimado em R$ 1,9 bilhão, a compra até o fim do ano permitiria iniciar a vacinação já em janeiro de 2021.

Na ocasião, Eduardo Pazuello fez questão de esclarecer eventual dúvida ou desconfiança sobre a origem da vacina. Segundo o ministro da Saúde, a “vacina do Butantan será a vacina brasileira”, lembrando que o imunizante, tendo sido desenvolvido na China, será produzido integralmente no Instituto Butantan, em São Paulo.

O anúncio do protocolo para a compra dos 46 milhões de doses era uma excelente notícia para a população. O governo federal, por meio do Ministério da Saúde, dava sua contribuição para pôr fim à pandemia do novo coronavírus. A boa notícia, no entanto, durou pouco. Ontem, o presidente Bolsonaro fez questão de deixar claro que seu governo não trabalha com parâmetros técnicos e que a saúde da população não é prioridade.

Em resposta ao comentário de um jovem numa rede social – “Presidente, a China é uma ditadura, não compre essa vacina, por favor” –, Jair Bolsonaro respondeu que a vacina “não será comprada”. Em outro comentário, o presidente da República voltou a negar publicamente a informação dada pelo ministro da Saúde. Diante do pedido de uma internauta para que Eduardo Pazuello fosse exonerado urgentemente do Ministério da Saúde, porque ele estaria atuando como cabo eleitoral de João Doria, governador de São Paulo, Jair Bolsonaro disse: “Não compraremos a vacina da China”.

Assim, Eduardo Pazuello tornou-se, num período de seis meses, o terceiro ministro da Saúde a ser desmentido publicamente pelo presidente Bolsonaro, simplesmente por agir de forma coerente com o interesse público e as evidências médicas. Por respeito ao seu nome e, muito especialmente, por zelo com a saúde da população, era o caso de o general de brigada pedir as contas, assim como fizeram Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich.

No entanto, não foi o que se viu até aqui. Logo após os dois comentários do presidente Bolsonaro, o secretário executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, disse que “houve interpretação equivocada da fala do ministro da Saúde” sobre a compra de doses da Coronavac e que a pasta não firmou “qualquer compromisso com o governo do Estado de São Paulo ou com o seu governador no sentido de aquisições de vacinas contra a covid”.

Mas o presidente Bolsonaro voltou a desmentir ontem mesmo o Ministério da Saúde, dizendo que mandou “cancelar” o protocolo de intenções assinado na terça-feira. “Presidente sou eu”, disse, como se a loucura de impedir o trabalho do Ministério da Saúde pudesse ter alguma similaridade com o exercício da autoridade. É a ignorância que se faz arbítrio.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
22 de outubro de 2020 | 03h00

Brasil fecha mais empresas do que abre pelo 5º ano seguido, aponta IBGE

Entre 2014 e 2018, país perdeu cerca de 382,5 mil empresas e 2,9 milhões de pessoas assalariadas. Comércio é o setor que mais perdeu empresas.

Um levantamento divulgado nesta quinta-feira (22) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que o Brasil teve saldo negativo pelo quinto ano seguido. Isso significa que mais empresas foram fechadas do que abertas no país neste período.

De acordo com o levantamento, entre 2014 e 2018 o país perdeu cerca de 382,5 mil empresas, o que implicou na perda de 2,9 milhões de trabalhadores assalariados.

Apenas uma em cada quatro empresas sobrevive por mais de 10 anos no Brasil, aponta IBGE

O levantamento considera somente as entidades empresariais, excluindo os Microempreendedores Individuais (MEIs), órgãos da administração pública, entidades sem fins lucrativos e as organizações internacionais que atuam no país.

“O comportamento de saída e entrada de empresas tem relação direta com a atividade econômica do país. Só em 2014, 218 mil fecharam as portas. Nos anos seguintes, esse movimento continuou, mas num patamar menor, refletindo a atividade econômica do período, que vem sendo fraca desde então”, avaliou o gerente da pesquisa, Thiego Gonçalves Ferreira.

Na passagem de 2017 para 2018, o saldo negativo foi de quase 65,9 mil empresas – o terceiro mais intenso da série. Enquanto 697,1 mil novos negócios foram abertas no ano, 762,9 mil encerraram suas atividades.

O comércio foi o setor que apresentou a maior variação negativa entre abertura e fechamento de empresas de 2017 para 2018, enquanto o segmento de saúde humana e serviços sociais foi o que teve o maior saldo positivo, ou seja, que abriu mais do que fechou empresas.

O levantamento mostrou, também, que o pessoal ocupado assalariado aumentou em 419,8 mil em 2018, uma alta de 1,3%. O IBGE destacou que este contingente foi empregado, sobretudo, pelas empresas sobreviventes.

Do total de trabalhadores assalariados, 97,3% estava ocupado em empresas sobreviventes. Nessas empresas, a participação dos homens foi 60,8%, contra 39,2% de mulheres, e o percentual de empregados com nível superior chegou a 15,2%.

“Os homens também são maioria nas empresas novas e nas que fecharam as portas. Mas a participação de pessoas com maior escolaridade é menor. O que nos leva a inferir que a população mais escolarizada é mais avessa a ingressar nessas empresas, optando pelas sobreviventes, uma vez que elas também remuneram melhor”, apontou o gerente da pesquisa, Thiego Ferreira.

País volta a ter avanço de Empresas de Alto Crescimento

Em contrapartida ao saldo negativo de empresas, o Brasil voltou a registrar, em 2018, aumento do número das chamadas Empresas de Alto Crescimento (EAC), após cinco anos seguidos de queda.

IBGE classifica como EAC aquelas companhias com pelo menos 10 empregados assalariados que conseguem aumentar seu quadro de pessoal acima de 20% ao ano, por três anos seguidos. "Esse crescimento está associado ao empreendedorismo", enfatizou o órgão.

Em 2018, o número de EACs avançou 11,9%, somando 22,7 mil. Esse número, no entanto, foi o terceiro menor da série histórica. O maior número dessas empresas no país foi registrado em 2012 (35,2 mil), enquanto o menor, em 2017 (20,3 mil).

Essas empresas de alto crescimento representaram 1,0% das empresas ativas e 5,0% das empresas com 10 ou mais pessoas ocupadas. Elas foram responsáveis por 11,2% das pessoas assalariadas e pelo pagamento de 9,1% dos salários e outras remunerações.

Thiego Ferreira observa que sustentar o alto crescimento é algo raro entre as empresas. “A pesquisa mostrou que apenas 5,6% das empresas que se tornaram de alto crescimento entre 2008 e 2013 repetiram o feito cinco anos depois. É uma taxa baixa. Mais baixa ainda quando olhamos no horizonte de 10 anos (3,1%). Isso mostra o quão difícil é voltar a crescer mais pra frente”, disse ele.

Quase 2,6 mil eram empresas “gazelas”

Do total de empresas de alto crescimento, 11,4% (2.597 mil) eram as chamadas “gazelas”, que têm até cinco anos de idade. Elas também cresceram 7,2% em 2018. São empresas que empregaram 198,8 mil pessoas e pagaram R$ 4,6 bilhões em salários e outras remunerações, o equivalente

 Por Daniel Silveira, G1 — RJ / Publicado originariamente por G1, em 22.10.2020.

Segurança jurídica está no reconhecimento do que foi aprovado pelo legislador

Por Marco Aurélio Mello

A sequência no processo-crime sinaliza apurar-se para, selada a culpa, mediante a ocorrência do trânsito em julgado do título condenatório, prender-se, em verdadeira execução da pena. Essa é a regra. A confirmá-la tem-se o Capítulo 3 — Da Prisão Preventiva — do Código de Processo Penal. Preceitua o artigo 311:

[...]

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

[...]

O artigo 312 revela os móveis da prisão preventiva:

[...]

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.

[...]

Segue-se o § 1º, a dispor:

[...]

§ 1º A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º)

[...]

No § 2º, pedagogicamente, está revelado:

[...]

§ 2º A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada.

[...]

Seguem-se os artigos 313 a 316 versando a matéria.

O conjunto de normas revela que a regra é o acusado — até então simples acusado, ante o princípio constitucional da não culpabilidade — responder solto, sendo exceção a prisão preventiva, também apontada como processual. Todo e qualquer preceito que encerre exceção deve ser interpretado de forma estrita. É o que nele se contém, não havendo campo para a criatividade.

Antes da Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019 — denominado "pacote anticrime" —, não se tinha previsão explícita sobre a duração da custódia provisória, da mitigação do princípio da não culpabilidade. Então, ficou pacificado que se deveria aferir a limitação dos dias de prisão provisória observando-se os prazos relativos à instrução processual, para chegar-se a decisão no processo-crime. Extravasados esses prazos, ter- se-ia o excesso referente à custódia preventiva.

Mais do que isso, a revelar a excepcionalidade da medida, tem-se o artigo 283 do Código de Processo Penal, declarado harmônico com a Constituição Federal na apreciação das ações declaratórias nº 43, 44 e 54. Eis o preceito:

[...]

Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão cautelar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado.

[...]

Colhe-se do artigo 387 do Código de Processo Penal, mais precisamente do § 1º, que o juiz, ao proferir sentença condenatória, decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva, ou de outra providência cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. Mais ainda, o § 2º encerra que o tempo de custódia provisória, prisão administrativa ou internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. Mesmo diante desse balizamento normativo, os dados revelados pelo Departamento Penitenciário Nacional, Órgão ligado ao Ministério da Justiça, em 14 de fevereiro de 2020, mediante o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias de 2019, demonstram que dos 758.676 presos, no País, 253.963 são provisórios, equivalendo a 33,47% da população carcerária.

Observando o princípio da não culpabilidade, inseriu-se no artigo 316 do Código de Processo Penal preceito cogente. A cabeça do dispositivo prevê que o juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para a subsistência, e novamente determiná-la, se vierem razões que a justifiquem. O parágrafo único é de clareza solar, valendo ter presente a norma de hermenêutica e aplicação do Direito segundo a qual, onde o texto da lei é explícito, não cabe interpretação. O que se dirá reescrever a própria norma, substituindo- se o julgador ao Legislativo?

Tem-se hoje, considerado o parágrafo único do artigo 316, introduzido, repita-se, pelo pacote anticrime, Lei nº 13.964/2019, que, imposta a custódia preventiva, deverá o Órgão emissor da decisão revisar a necessidade da manutenção a cada 90 dias, mediante ato fundamentado, de ofício, sob pena de tornar ilegal a prisão. Iniludivelmente tem-se preceito que atende, em primeiro lugar, a dignidade do homem, do custodiado, que não pode ser jogado, ao que o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo disse, às masmorras, esquecido como se animal fosse. É um ser humano e deve ser tratado como tal. Em segundo lugar, a norma imperativa do parágrafo em discussão dispõe cumprir, ao emissor da decisão que implicou custódia preventiva, revisá-la a cada 90 dias, pouco importando onde esteja o processo, na maioria das vezes eletrônico. Não se trata de algo inviável, no mundo da computação. Há de haver, quer no Judiciário, quer no Ministério Público — Estado-acusador —, quer na Defensoria Pública, quer na polícia, cadastro contendo a situação jurídica daqueles que, uma vez acusados do cometimento de desvio de conduta, estejam sob a custódia do Estado. Pelo preceito, renovada a necessidade, mediante pronunciamento judicial fundamentado, da prisão preventiva, não se tem o excesso de prazo. O legislador foi explícito ao cominar consequência para o extravasamento dos 90 dias sem a formalização de ato fundamentado renovando a custódia. Previu, na cláusula final do parágrafo único do artigo 316, que, não havendo a renovação, a análise da situação do preso, a prisão surge ilegal. A tanto equivale, sem sombra de dúvida, a cláusula final: "[...] sob pena de tornar a prisão ilegal".

Garantias e franquias legais e constitucionais não são acionadas pelo homem médio. São acionadas por aqueles envolvidos em processo-crime, e isso ocorre para que haja julgamento justo. Por isso mesmo, tem-se, no artigo 261 do Código, que nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor. Mais do que isso, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo, muito menos para inserir distinção não contemplada.

A garantia em análise é linear e alcança todo e qualquer custodiado, pouco importando a imputação a lhe recair sobre os ombros.

Nunca é demasiado reconhecer que a atuação do Judiciário é vinculada ao Direito aprovado pelo legislador, pelo Congresso Nacional. Nessa premissa está a segurança jurídica, a revelação de viver-se não em um regime de exceção, mas num Estado Democrático de Direito.

Sob o ângulo da autodefesa, há de reconhecer-se, como direito natural, o cidadão estar em lugar incerto e não sabido, não se submetendo a ato ilegal. Na apreciação do pedido de implemento de medida acauteladora no momentoso habeas corpus nº 191.836/SP, examinei dois temas. Quanto ao primeiro, relativo à subsistência, ou não, dos fundamentos da ordem de prisão cautelar, consignei:

[...]

2. O Juízo, ao determinar a prisão, referiu-se a dados obtidos mediante interceptação telefônica, vídeos, depoimentos e vigilância policial realizados durante investigação. Assentou participação do paciente em grupo criminoso voltado ao tráfico internacional de drogas e a apreensão de quase 4 toneladas de cocaína. O Tribunal de Justiça, no julgamento da apelação, concluiu persistirem os motivos que ensejaram a custódia. O quadro indica em jogo a preservação da ordem pública e a aplicação da lei penal. Sem prejuízo do princípio constitucional da não culpabilidade, a prisão mostrou-se viável, ante a periculosidade, ao menos sinalizada. Daí ter-se como fundamentado o pronunciamento atacado. A inversão da ordem do processo-crime — no que direciona a apurar para, selada a culpa, em verdadeira execução da pena, prender — foi justificada, atendendo-se ao figurino legal.

[...]

O segundo tema ficou ligado ao critério objetivo da duração da prisão provisória. Constatando inobservada a norma imperativa, cogente, do parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal e, portanto, extravasado o período máximo de 90 dias relativo à custódia provisória, inexistente qualquer ato renovando-a como exigido, implementei a medida acauteladora, observando, acima de tudo, a Constituição Federal: "a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;" — artigo 5º, inciso LXV.

O quadro agravou-se, sobremaneira, quando o presidente do Supremo, à margem dos ditames legais e regimentais, arvorando-se em visão totalitária, censor do ato embora ombreando com o prolator da decisão, veio a afastá-la do cenário jurídico. Fê-lo, totalmente sem base legal, na suspensão de liminar nº 1.395. Tendo Sua Excelência levado o prounciamento, infrutífero — porque já solto e em local incerto e não sabido o acusado —, ao Plenário, este, nada obstante reconhecendo a inexistência do poder exercido pelo presidente, confirmou-o, por escore acachapante de 9 voto a 1. Votaram confirmando o ato do presidente Luiz Fux os ministros Alexandre de Moraes, Luiz Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.

Manifestei-me em sentido diametralmente oposto. Primeiro, escancarando a visão totalitária do presidente. Depois, observando não a pura literalidade do parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal, mas o objetivo da norma. Em síntese, considerado instrumental voltado a preservar a liberdade de locomoção, que tem parte única — o paciente, personificado pelo impetrante —, o Tribunal acabou por sinalizar a prisão preventiva de um acusado. O habeas corpus é ação de mão única e visa beneficiar, não prejudicar, o paciente. É possível, segundo a legislação de regência, em qualquer processo, defrontando-se o julgador com ilegalidade — no caso, cominada pela norma — a alcançar a liberdade de ir e vir, implementar ordem, não havendo campo para cogitar-se do instituto da supressão de instância no que, em última análise, objetiva beneficiar, jamais prejudicar, a parte — repita-se no habeas corpus unicamente o paciente, atuando o Ministério Público como fiscal da lei, não integrando, por isso mesmo, a relação jurídica processual.

Na atuação individual, considerado exame de pedidos de tutela de urgência, tendo em vista a decisão do Pleno, tenho ressalvado óptica pessoal em sentido diverso, assentando descaber, no campo precário e efêmero, o afastamento da custódia, deixando para tornar efetiva a compreensão sobre o tema por ocasião do julgamento em colegiado.

Ao tomar posse em cargo de Juiz, há 41 anos, mais precisamente em 6 de novembro de 1978, jurei observar a Constituição Federal e as Leis da República. Assim hei de encerrar os dias judicantes, quando deixarei o ofício com o sentimento do dever cumprido.

Marco Aurélio Mello é o Ministro Decano do Supremo Tribunal Federal. Este artigo foi publicado originalmente no Consultor Jurídico, em 22.10.2020.

STJ declara ilegal a conversão em preventiva, de ofício, da prisão em flagrante

As alterações promovidas no CPP pelo "pacote anticrime" (Lei 13.964/19) excluíram a possibilidade de juiz poder converter, de ofício, a prisão em flagrante em preventiva.

Com esse entendimento, a 5ª Turma do STJ concedeu a ordem em um Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública de Goiás. A decisão declara nula a conversão, de ofício, de prisão em flagrante em prisão preventiva — sem ter havido manifestação da autoridade policial ou do Ministério Público. 

A medida já havia sido reconhecida como prática ilegal em liminar concedida em junho. O STJ, antes da edição do "pacote anticrime", tinha jurisprudência no sentido de que tal conversão poderia ser decretada, sim, de ofício (Tema 10 da Edição 120, "Jurisprudência em Teses"):

"Não há nulidade na hipótese em que o magistrado, de ofício, sem prévia provocação da autoridade policial ou do órgão ministerial, converte a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal — CPP".

O defensor público Márcio Rosa Moreira, titular da 2ª Defensoria Pública de 2º Grau, explica que "esse é um caso paradigmático, pois terá reflexos em outros processos e teve especial atenção da instituição". "Mesmo com decisão recente da 6° Turma em sentido diverso, hoje, [20/10], por unanimidade, a 5ª Turma do STJ concedeu a ordem, fixando entendimento pela ilegalidade da conversão da prisão de ofício".

O HC foi impetrado para solicitar a soltura imediata de um homem e uma mulher que tiveram a prisão preventiva decretada pelo juiz sem que houvesse solicitação de autoridade policial ou do Ministério Público. 

No caso, o defensor público apontou, entre outros argumentos, a ilegalidade existente na decretação de prisão preventiva de ofício. Ele lembrou que, apesar de as audiências de custódia terem sido dispensadas pelo Conselho Nacional de Justiça durante o período da epidemia de Covid-19, a observância das formalidades legais para a decretação da prisão preventiva deve ser mantida, o que não ocorreu no caso em questão, pois não houve requerimento prévio do Ministério Público ou representação da autoridade policial.

"No sistema processual acusatório, a atividade jurisdicional depende da acusação da parte, pois o juiz não é órgão persecutório e não deve se imiscuir na investigação policial, tudo para não comprometer a sua necessária imparcialidade", argumenta Márcio Rosa Moreira.

HC 590.039 (GO)

Publicado por Consultor Jurídico, em 22.10.2020

Brasil já tem mais de 155 mil mortos por covid-19 após registro de mais 565 óbitos


Foto à noite, mostra mulher parada em ponto de ônibus com máscara e, ao fundo, uma projeção de luz no prédio do Congresso dizendo: Luto 100 milCRÉDITO,REUTERS/ADRIANO MACHADO

Homenagem em Brasília às mais de 100 mil pessoas que perderam a vida para a covid-19 no país; marca foi ultrapassada em agosto

O coronavírus já infectou pelo menos 5.298.772 pessoas e levou 155.402 delas a óbito no Brasil, segundo o boletim mais recente do Ministério da Saúde, divulgado nesta quarta-feira (21/10).

Deste total, 24.818 casos da doença e 565 óbitos foram registrados nas últimas 24 horas. O Estado com o maior número de vítimas é São Paulo (38.371), seguido por Rio de Janeiro (19.945) e Ceará (9.227).

O país continua como o segundo do mundo com maior número de mortes na pandemia do novo coronavírus, depois apenas dos Estados Unidos, que têm mais de 220 mil mortes pela covid-19, segundo levantamento da Universidade Johns Hopkins.

O Brasil foi superado em número de casos, entretanto, pela Índia (7,5 milhões), agora em segundo lugar depois dos Estados Unidos (8,2 milhões de casos).

BBC News Brasil, em 21.10.2020

O que se sabe sobre a morte de voluntário da vacina de Oxford no Brasil

Médico brasileiro atuava na linha de frente no combate à pandemia e morreu de complicações decorrentes da covid-19. Fontes ligadas ao estudo afirmam que ele recebeu placebo, e não o imunizante.

Mão com luva azul segura seringa de vacina. Ao fundo, um letreiro diz AstraZeneca.

Cerca de 20 mil pessoas participam dos testes da vacina desenvolvida pela AstraZeneca e a Universidade de Oxford

Um médico brasileiro que era voluntário nos testes da vacina de Oxford contra o coronavírus morreu por complicações de covid-19. A vítima é o carioca João Pedro Rodrigues Feitosa, de 28 anos. Ele morreu no dia 15 de outubro, mas a notícia da morte veio à tona nesta quarta-feira (21/10) após reportagem do jornal O Globo.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) confirmou a morte de um voluntário brasileiro, mas afirmou que, por questão de sigilo, não podia revelar a identidade da vítima. A Anvisa disse que foi informada do falecimento na última segunda-feira. Segundo a agência, uma investigação foi realizada pelo Comitê Internacional de Avaliação de Segurança, que sugeriu o prosseguimento do estudo. 

A vacina é desenvolvida pela farmacêutica sueco-britânica AstraZeneca e pela Universidade de Oxford e é considerada uma das mais promissoras entre os imunizantes atualmente em teste.

Em comunicado, a Universidade de Oxford informou que, após avaliação cuidadosa do caso, "não houve preocupações quanto à segurança do ensaio clínico".

Assim como a Anvisa, a AstraZeneca e a Universidade de Oxford alegam cláusulas de sigilo para não divulgar detalhes do caso. No entanto, fontes ligadas à pesquisa afirmaram à TV Globo que o voluntário recebeu placebo, e não o imunizante.  

Até o momento, aproximadamente 8 mil voluntários participaram de testes da vacina no Brasil. O estudo é randomizado e cego, ou seja, metade dos voluntários recebe o imunizante, e a outra metade, não. Os participantes não sabem se receberam ou não a dose da vacina.

Segundo nota de pesar divulgada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde Feitosa estudou, ele estava atuando na linha de frente no combate ao novo coronavírus nas redes privada e municipal de Saúde do Rio de Janeiro.

"A Reitoria da UFRJ — juntamente com toda a comunidade universitária — presta sinceras condolências aos familiares e amigos do nosso ex-aluno em meio a esse momento de tristeza que ceifou a vida do João, que havia acabado de se diplomar e não poupou esforços para atuar no enfrentamento da pandemia de covid-19, que já acumula mais de 40 milhões de casos no mundo", diz a nota.

Continuidade do estudo 

Responsável pelo estudo no Rio de Janeiro, o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor) disse, também em nota, que análises rigorosas dos dados colhidos até o momento "não trouxeram qualquer dúvida com relação a segurança do estudo, recomendando-se sua continuidade". 

O instituto afirma que, após a inclusão de mais de 20 mil participantes nos testes ao redor do mundo, todas as condições médicas registradas foram cuidadosamente avaliadas pelo comitê independente de segurança, pelas equipes de investigadores e autoridades regulatórias locais e internacionais.

A vacina desenvolvida pela AstraZeneca e pela Universidade de Oxford é tida pelo governo brasileiro como uma das principais apostas para a imunização contra o covid-19 no país. No mês passado, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) assinou o contrato de Encomenda Tecnológica (Etec) com a AstraZeneca. A Etec garante ao Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) o acesso a mais de 100 milhões de doses do Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) para o processamento final (formulação, envase, rotulagem e embalagem) e controle de qualidade, ao mesmo tempo em que garante à Fiocruz a transferência total da tecnologia.

Pausa nos testes

Em setembro, a AstraZeneca interrompeu os testes da vacina de Oxford para investigar uma suposta reação adversa grave em uma paciente no Reino Unido. Um comitê independente foi formado para revisar a segurança dos ensaios, algo que a empresa e a Organização Mundial da Saúde (OMS) descreveram como um evento rotineiro em grandes estudos médicos que envolvem milhares de voluntários. Os testes foram retomados quatro dias depois.

A vacina de Oxford e da AstraZeneca usa um adenovírus que carrega um gene para uma das proteínas do coronavírus Sars-Cov-2. O adenovírus é projetado para induzir o sistema imunológico a gerar uma resposta protetora contra o vírus causador da covid-19. A tecnologia ainda não foi usada em uma vacina aprovada para uso humano, mas foi testada em vacinas experimentais contra outros vírus, como o causador do ebola.

O imunizante de Oxford foi o primeiro a receber autorização para testes no Brasil. Depois, mais três receberam a autorização, o mais recente da Janssen, unidade farmacêutica da Johnson & Johnson.

No começo desta semana, o Instituto Butantan, parceiro da farmacêutica chinesa Sinovac no país, anunciou que os resultados preliminares dos ensaios clínicos da fase 3 da vacina contra o coronavírus que estão sendo feitos no Brasil revelaram a segurança do imunizante.

Publicado originalmente por Deutsch Welle, em 22.10.2020

quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Em discurso na Pensilvânia, Obama pede alta participação na eleição para evitar outro fracasso

Ex-presidente manifestou apoio a Joe Biden na Filadélfia

 O ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pediu aos eleitores do candidato democrata Joe Biden nesta quarta-feira, 21, que se mobilizem e não confiem nas pesquisas favoráveis ​​para as eleições de 3 de novembro, em um longo discurso no qual também denunciou seu sucessor Donald Trump.

O ex-presidente Barack Obama discursa em evento de campanha do candidato democrata Joe Biden em Filadélfia, na Pensilvânia Foto: Michael M. Santiago/Getty Images/AFP

"Não podemos confiar um no outro. Não me importo com as pesquisas", disse ele em um comício na Filadélfia, no Estado da Pensilvânia.

“Nossa democracia não vai funcionar se as pessoas que deveriam ser nossos líderes mentirem todos os dias e simplesmente inventarem coisas. E ficarmos entorpecidos diante disso”, acrescentou, em clara alusão ao atual presidente dos Estados Unidos.

Obama disse ainda que Trump provou ser "incapaz de levar o trabalho a sério". "Este não é um reality show. É a realidade", disse. "E o resto de nós tem que viver com as consequências de ele se mostrar incapaz de levar o trabalho a sério."

 /AFP / Redação, O Estado de S.Paulo. 21 de outubro de 2020 | 19h25. Atualizado 21 de outubro de 2020 | 20h07

"Aliança com Centrão não atenuou fascismo de Bolsonaro"

Luiz Eduardo Soares, cujo novo livro analisa fascismo e bolsonarismo, diz que novas aproximações políticas e postura mais branda do presidente não significam moderação em seu "programa fascista", que mobiliza o ódio.

O presidente Jair Bolsonaro

"Tínhamos o dragão na sala de visita, hoje ele está na garagem. Mas continua sendo o dragão", afirma antropólogo

O presidente Jair Bolsonaro lidera um movimento com características fascistas, que evoca uma ideologia elaborada ainda na década de 1930, no integralismo brasileiro, posteriormente assimilada pela ditadura militar e infiltrada no período democrático. Considera-se guiado pela vontade de Deus e não vê limites para o exercício da violência com o objetivo de destruir o inimigo, representado no comunismo ou no mal. Para fazer isso, mobiliza o ódio na sociedade para alimentar um "espírito de linchamento".

A análise é do antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário nacional de Segurança Pública e autor dos livros que deram origem aos filmes Tropa de elite. Ele lançou, no final de setembro, o livro Dentro da noite feroz – O fascismo no Brasil, pela Boitempo Editorial, no qual interpreta o movimento em torno do presidente à luz das ideias e experiências fascistas.

Em entrevista à DW Brasil, Soares afirma que a aproximação de Bolsonaro com o Centrão e a redução da frequência de suas falas radicais, ocorridas após ver seu filho Flávio Bolsonaro e aliados sofrerem revezes em investigações judiciais, não indicam que o presidente se moderou, mas apenas que houve um recuo temporário em sua estratégia de longo prazo. "Antes, tínhamos o dragão na sala de visita. Hoje temos um dragão na garagem. Mas continua sendo o dragão, e seus propósitos continuam sendo os mesmos", diz.

Ele associa o sucesso do bolsonarismo à capacidade de aplacar inseguranças provocadas por mudanças rápidas na sociedade, como o questionamento dos significados tradicionais de homem, mulher e família, aliado ao apoio das polícias – segundo o antropólogo, um enclave autoritário em meio à democracia – e de parcela da elite econômica. 

Soares diz que apenas cerca de 15% da população concorda com o "programa fascista" do presidente, e que o apoio ao governo Bolsonaro, hoje em torno de 40% dos eleitores, deve diminuir com o fim do auxílio emergencial, abrindo "possibilidades de disputa política".

DW Brasil: Qual é a origem da ideologia fascista no Brasil?

Luiz Eduardo Soares: Os traços fascistas se converteram em programa ideológico e político nos anos 1930, sob a liderança de Plínio Salgado, no movimento integralista, que exaltava o fascismo e o nazismo e pleiteava a união do Brasil ao Eixo na Segunda Guerra Mundial. Eles tentaram dar um golpe de Estado contra Getúlio [Vargas], não foram bem-sucedidos e foram para a clandestinidade, mas não deixaram de exercer influência e deter um quinhão da opinião pública brasileira.

Nos anos da ditadura, de 1964 a 1985, os velhos integralistas tiveram uma participação ativa. Um dos exemplos é Filinto Müller, que tinha sido o chefe da polícia política no Estado Novo, responsável por muitas mortes e torturas, e se tornaria, nos anos 1970, líder do governo militar no Senado pela Arena.

Sempre houve candidatos que se identificavam com programas integralistas ou neointegralistas, e eles voltaram a agir publicamente no século 21, em várias manifestações. No Rio, por exemplo, saindo em marchas, queimando bandeiras, e, depois de 2010, apoiando candidaturas, particularmente da família Bolsonaro.

Mas os traços fascistas ou protofascistas ultrapassam os limites de um partido ou de um movimento específico e se enraizam na sociedade, camuflados e articulados a outros valores e símbolos. Somos um país de quatro séculos de escravidão, autoritário e muito violento. Além do integralismo, que é uma referência ao novo partido que Bolsonaro está tentando criar, temos na sociedade elementos que se articulam facilmente a essa nebulosa fascista que Bolsonaro encarna e inscreve na política.

O sr. pode citar exemplos recentes de situações em que o fascismo se manifesta?

Quando Bolsonaro elogia como herói nacional um torturador, estuprador e assassino como o [coronel Carlos Alberto Brilhante] Ustra, ele eleva esse personagem ao status de referência identitária nacional. A exaltação à violência, nesse caso, vem associada à ideia de uma pátria do bem, sob proteção divina, que luta contra o mal. E quem é o inimigo? O grande Outro, contra o qual se identificam aqueles que são próximos a Bolsonaro.

Sempre que grupos se agregam, forma-se identidade por oposição, até nos esportes. O diferencial é quando a identidade se produz pela definição do Outro não como adversário ou antagonista, mas como inimigo que deve ser destruído em uma guerra santa. Quando nossa percepção do mundo tem como fundamento a vontade divina, acreditamos que não há limite para o exercício da violência, e temos como meta a destruição do inimigo, que representaria o comunismo, o diabo ou o mal, temos uma estrutura de concepções e valores análoga ao que se categoriza como fascismo.

O último discurso que Bolsonaro fez antes do segundo turno das eleições de 2018, por celular da casa dele, ouvido na Avenida Paulista, prometia às oposições a ponta da praia, a fuga do país, o exílio. A ponta da praia significa, na linguagem da repressão da ditadura, a execução. Naquele momento, ele abomina as diferenças. Sabemos que o grupo ligado a Bolsonaro deseja eliminar o pluralismo. O bolsonarismo se define como uma revolução para destruir tudo o que está aí, o que envolve a Constituição, os direitos conquistados e as instituições como se organizam.

Qual é a função do ódio e da pulsão de destruição nessa ideologia?

É central. O fascismo precisa mobilizar o ódio e a sociedade para que ela se sinta identificada nesse esforço guerreiro bélico comum contra o mal, alimentando um espírito de linchamento. Para que haja a efetivação desse regime simbólico de construção de identidade, é necessário que o afeto dominante seja o ódio, porque só o ódio se encaixa na afirmação de que estamos numa guerra e precisamos eliminar os inimigos.

Bolsonaro se aproximou do Centrão nos últimos meses e reduziu a frequência de manifestações mais radicais. Esse movimento atenuou o que o sr. define como traços fascistas?

Não, porque em nenhum momento ele voltou atrás em relação ao que pensa e ao que diz. O que houve foi uma mudança tática. Ele viu que a correlação de forças estava pendendo contra ele e recuou. Mas não há nenhuma mudança em relação à estratégia. Antes, tínhamos o dragão na sala de visita. Hoje temos um dragão na garagem. Mas continua sendo o dragão, e seus propósitos continuam sendo os mesmos. Não podemos confundir a tática com a substância do que está em jogo.

O governo Bolsonaro é hoje apoiado por cerca de 40% da população. Como o sr. explica isso à luz da sua análise do fascismo?

Uma consideração que derivaria de um mal-entendido sobre o que digo seria: "Se o Bolsonaro venceu as eleições, é porque a maioria do povo brasileiro é fascista". De jeito nenhum. O voto é uma escolha num determinado momento entre candidaturas. Uma adesão muitas vezes parcial ao ideário. Não temos mais que 15% da sociedade identificando-se plenamente com o bolsonarismo, que é o programa fascista.

Há dois elementos importantes [para explicar o apoio a Bolsonaro]. Um é o auxílio emergencial, que tem um impacto grande. A população que acompanha o dia a dia pela mediação das suas necessidades de sobrevivência, o que é mais imperioso, se sente atendida e declara seu apoio. Que não é necessariamente permanente. O auxílio vem sendo retirado e a crueza da crise vai mostrar a sua profundidade. Será difícil manter esse nível de popularidade.

O outro elemento, que conversa com o fascismo, é o que eu chamo de demanda por ordem. Não no sentido da segurança pública, que também está envolvida. Há uma demanda da sociedade brasileira pela restauração de uma ordem no nível do ser, por referências fixas.

Nossa época é de mudanças rápidas e profundas, com muita angústia. E surgiram movimentos libertadores, como o movimento feminista, que começa a bater contra o patriarcalismo, e nesse espaço surgem novas possibilidades para a constituição de si em que sexo, corpo e gênero se separam e podem se combinar de formas inesperadas. Isso desestabiliza as figuras arquetípicas de homem, mulher e família. Os machos formados no patriarcalismo sentem de forma muito aguda, precisam se proteger contra isso e contra o que está dentro de cada um deles, e descobrem lideranças capazes de endereçar o seu discurso a essa demanda.

O que é o bolsonarismo, senão vingança do macho, o retorno do macho grosseiro rudimentar? Bolsonaro promete restaurar as âncoras, em um apelo dirigido pelo que há de neurótico e defensivo em cada um e cada uma, porque muitas mulheres absorvem essa cultura machista também.

Nesse quadro, como o sr. interpreta o apoio de parte da elite econômica a Bolsonaro?

Os candidatos preferenciais da elite eram outros, mas foram ficando pelo caminho. Bolsonaro foi o pangaré que passava e surpreendia mostrando a possibilidade de vitória. Quando essa possibilidade se tornou real, as elites acenaram de volta, [dizendo] "fingimos que não estamos vendo o banho de sangue que você traz no seu programa, porque supostamente somos civilizados, desde que você implemente aqui a nossa agenda".

Como as polícias se ligam ao neofascismo no Brasil?

Tivemos uma transição para a democracia negociada, e havia um preço a se pagar. Os militares reservaram uma área que deveria se manter fora do processo de democratização, que foi a segurança pública. Houve mudanças na legislação, mas os policiais e as estruturas organizacionais eram as mesmas. Esse espaço se constituiu como um enclave na democracia, com valores e práticas refratários a ela. É um universo grande, que hoje corresponde a quase 800 mil profissionais. Há contradições, mas o que sempre dominou foi a continuidade com o passado. E temos também uma rede de cumplicidade [com a Justiça e o Ministério Público], com apoio popular.

Se há problemas de crime é porque não se matou o suficiente, essa sempre foi a toada. Por isso, havia bolsonarismo nas polícias muito antes de Bolsonaro. Quando Bolsonaro aparece, suas palavras soam como música. Ele realiza esse messianismo das polícias que esperavam um redentor que iria acabar com essa democracia e essa história de direitos humanos, e de dar autoridade para que a força vencesse o mais fraco em nome desses valores. Uma espécie de saneamento, de higiene, que se dá pelo sangue.

Nesta sexta-feira (23/10), o referendo sobre a proibição do comércio de armas e munição no Brasil faz 15 anos, em um momento em que o governo federal patrocina iniciativas para flexibilizar a compra de armas e munição. Qual o papel das armas nesse contexto?

Se há um consenso no meio científico que se dedica a essa questão é que mais armas implicam em mais crime, mais acidentes e violência doméstica, mais feminicídios e mais suicídios. Que conflitos interpessoais tendem a se converter mais em crimes de morte.

Flexibilização no acesso às armas significa também a provisão para o mercado ilegal, pois facilita o acesso de criminosos e do tráfico de armas às armas. É um caminho que favorece o crime, particularmente as milícias. Além disso, todos os meios que facilitavam investigações para rastrear munições e armas estão sendo destruídos.

O referendo de 2005 foi um momento triste da nossa história, tínhamos uma oportunidade de radicalizar o controle das armas, e houve uma reversão. A despeito dessa derrota, preservamos o controle e ampliamos o rastreamento até Bolsonaro chegar ao poder.

Como superar o que o sr. descreve como ameaça fascista no Brasil?

Não tenho uma resposta. Precisamos mobilizar todos os recursos disponíveis. Escrever livros, participar dos debates, fortalecer entidades, associações, organizações não governamentais, cobrar das instituições reação a essa corrosão. Apelar à sensibilidade internacional, que tem sido muito importante – se não foi capaz de impedir a devastação ambiental, tem chamado a atenção para limites.

Temos do outro lado a força econômica associada ao fascismo, que agora se veste de ovelha, como que a legitimar as adesões de camadas médias e das elites. As camadas populares terão o seu momento de enfrentamento com a dura realidade quando os auxílios emergenciais forem interrompidos. Temos diante de nós muitas possibilidades de disputa política.

Publicado originalmente por Deutsch Welle, em 21.10.2020.

Bolsonaro desautoriza Pazuello e diz que não vai comprar vacina chinesa

Ministro da Saúde havia anunciado acordo com São Paulo para compra de 46 milhões de doses produzidas pelo Instituto Butantan. Presidente fala em "traição" e diz que seu governo não mantém diálogo com João Doria.

Bolsonaro vem se posicionando publicamente contra uma potencial vacinação obrigatória. Ao longo da pandemia, preferiu apostar em tratamentos sem comprovação

O presidente Jair Bolsonaro reagiu de maneira agressiva nesta quarta-feira (21/10) ao acordo firmado por seu ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, com o estado de São Paulo, que prevê a compra de 46 milhões de doses da Coronavac, vacina contra o coronavírus da empresa chinesa Sinovac a ser produzida no Brasil em parceria com o Instituto Butantan.

A reação de Bolsonaro ocorreu no Facebook, em resposta a seguidores radicais que se posicionaram contra a vacina. "Não será comprada", escreveu Bolsonaro para um seguidor, em letras maiúsculas. "Qualquer coisa publicada, sem comprovação, vira TRAIÇÃO", reagiu Bolsonaro a um comentário de outro usuário, que acusou Pazuello de agir pelas costas do presidente.

"Tudo será esclarecido hoje. Tenha certeza, não compraremos vacina chinesa. Bom dia", respondeu Bolsonaro para outra seguidora, que acusou Pazuello de ser um "Mandetta milico". Ela se referia a um dos antecessores de Pazuello no ministério, Luiz Henrique Mandetta, demitido pelo presidente por não concordar com a ingerência errática de Bolsonaro na pasta.

Segundo o jornal Folha de S. Paulo, Bolsonaro ainda disparou várias mensagens no mesmo tom para seus ministros e aliados no Congresso. "Alerto que não compraremos uma só dose de vacina da China, bem como o meu governo não mantém qualquer diálogo com João Doria na questão do covid-19. PR Jair Bolsonaro", diz o texto, citando o governador paulista, desafeto de Bolsonaro e chefe do Executivo de um estado que concentra mais de um quinto da população brasileira.

Depois, Bolsonaro divulgou um comunicado nas suas redes sociais em que chama a Coronavac de "vacina chinesa de João Doria". "Não se justifica um bilionário aporte financeiro num medicamento que sequer ultrapassou sua fase de testagem", escreveu.

"Qualquer vacina, antes de ser disponibilizada à população, deverá ser COMPROVADA CIENTIFICAMENTE PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE e CERTIFICADA PELA ANVISA. O povo brasileiro NÃO SERÁ COBAIA DE NINGUÉM. Diante do exposto, minha decisão é a de não adquirir a referida vacina."

Mais tarde, Bolsonaro afirmou durante um evento que a compra de vacinas estava descartada até a comprovação da eficácia de algum dos imunizantes. "A vacina precisa de comprovação científica para ser usada, não é como a hidroxicloroquina", acrescentou.

O anúncio da compra de 46 milhões de doses havia ocorrido um dia após o Instituto Butantan afirmar que resultados preliminares dos ensaios clínicos da Coronovac feitos no Brasil revelaram a segurança do imunizante contra a covid-19.

Em reunião com governadores, Pazuello ainda havia afirmado que esperava começar a vacinação com a Coronavac já em janeiro, após a aprovação da Anvisa. O ministério havia informado que pretendia investir R$ 1,9 bilhão na compra da Coronovac produzida no Brasil pelo Butantan. De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, o ministro havia enviado em 19 de outubro um ofício ao instituto confirmando a compra de 46 milhões de doses da Coronavac.

Após as declarações de Bolsonaro, o Ministério da Saúde voltou atrás e disse que "não há intenção" por parte do governo federal de adquirir "vacinas chinesas". A pasta afirmou ainda que houve "uma interpretação equivocada" da fala de Pazuello sobre o imunizante, mas reconheceu a assinatura de um protocolo de intenção com o Instituto Butantan para a compra da vacina.

O ministério apagou ainda um tuíte publicado na terça-feira no qual anunciava a compra da vacina chinesa. O conteúdo era semelhante ao de uma nota divulgada pela pasta, que também foi alterada no site oficial.

Postura de Bolsonaro na pandemia

Bolsonaro nunca compartilhou qualquer entusiasmo com potenciais vacinas. Ao longo da pandemia, ele preferiu promover "curas" sem comprovação científica, como a aplicação da hidroxicloroquina no tratamento da doença. Além de minimizar o vírus, o presidente também agiu sistematicamente para sabotar a imposição de medidas de distanciamento social no país.

Mais recentemente, ele passou a agir ativamente contra a possibilidade de uma vacinação obrigatória, contrariando uma medida assinada pelo seu próprio governo no início da pandemia.

O fato de a linha de frente da produção da vacina ter sido assumida pelo governo João Doria, seu desafeto, e envolver a China – vista como inimiga por muitos bolsonaristas, inclusive membros de sua família – adicionou ainda mais combustível à fogueira ideológica do presidente.

Fritura

As falas que desautorizaram Pazuello publicamente foram encaradas pela imprensa brasileira e parte do meio político como o início de um processo de fritura. No cargo desde maio, Pazuello substituiu o médico Nelson Teich, que ficou menos de um mês no posto.

Sem experiência na área de gestão da saúde pública, Pazuello logo se tornou um facilitador das vontades do presidente no ministério, mesmo quando as ordens se chocavam com o consenso científico. Ele editou protocolos para a expansão do uso da hidroxicloroquina e chegou a tentar esconder os números da pandemia.

Por outro lado, tentou melhorar as relações do ministério com os governadores do país, que estavam em pé de guerra com Bolsonaro por causa das atitudes erráticas do presidente.

Segundo o jornal O Globo, Bolsonaro está repetindo o processo que desencadeou na queda de Mandetta, cuja atuação havia causado ciúmes no presidente e sua família. O jornal aponta que o presidente reclamou para auxiliares que Pazuello está "querendo aparecer demais, está gostando dos holofotes, como o Mandetta".

Nesta mesma quarta-feira, Pazuello testou positivo para a covid-19. Ele se torna assim o 12º integrante do primeiro escalão do governo Bolsonaro a contrair o coronavírus.

Em meio a mais uma ofensiva do presidente, a covid-19 segue avançando no Brasil, ainda que não com o mesmo ritmo de meses atrás. O país acumula o segundo maior número de mortes associadas à doença: 154.837. Também concentra o terceiro maior número de casos no planeta: mais de 5,2.

Publicado por Deutsch Welle, em 21.10.2020

Ministro da Saúde alemão testa positivo para covid-19

Ministério informa que Jens Spahn tem sintomas de resfriado e entrou em quarentena após receber o resultado. Primeiro ministro alemão a contrair o vírus, ele participou de uma reunião do gabinete de Merkel mais cedo.

Jens Spahn, ministro da Saúde alemão

O ministro da Saúde da Alemanha, Jens Spahn, testou positivo para o novo coronavírus, anunciou sua pasta nesta quarta-feira (21/10). Segundo um porta-voz do ministério alemão, o titular entrou imediatamente em quarentena em sua residência após receber o resultado.

Spahn, de 40 anos, uma das figuras mais célebres na luta contra a covid-19 na Alemanha, apresentou apenas sintomas semelhantes aos de um resfriado, afirmou o porta-voz, acrescentando que todas as pessoas com quem ele teve contato nos últimos dias estão sendo informadas.

O titular da Saúde havia participado nesta mesma quarta-feira de uma reunião entre ministros da chanceler federal Angela Merkel, mas, segundo o ministério, o teste positivo de Spahn não significa que todo o gabinete deverá entrar em quarentena. Merkel também estava presente na reunião.

O porta-voz observou que o encontro cumpriu todas as precauções de distanciamento social e higiene para garantir que a quarentena fosse desnecessária em um caso como este. Fotos mostram Spahn usando máscara durante a reunião.

Spahn é o primeiro ministro de Merkel a testar positivo para a covid-19, mas não foi o único a entrar em isolamento. Além dele, atualmente o ministro do Trabalho, Hubertus Heil, e o presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, estão em quarentena após terem tido contato com infectados. Nesta quarta-feira, Steinmeier testou negativo para o coronavírus pela segunda vez, mas deve permanecer isolado até 29 de outubro.

Merkel também ficou em quarentena no início da pandemia, por precaução, após ter tido contato com um médico infectado, mas acabou posteriormente testando negativo para a covid-19. O ministro do Exterior, Heiko Maas, também chegou a ficar isolado depois de um de seus seguranças ter contraído o vírus.

A Alemanha enfrenta um aumento de casos do novo coronavírus. Nesta quarta-feira, o Instituto Robert Koch (RKI), agência governamental para controle e prevenção de doenças infecciosas, registrou 7.595 casos de covid-19 em 24 horas. Ao todo, já foram contabilizados 380.762 casos e 9.875 óbitos ligados à doença no país desde o início da pandemia.

De acordo com o RKI, nove cidades e distritos administrativos alemães não são mais capazes de cumprir completamente todas as medidas de proteção a propagação do vírus estipuladas, como a identificação de novos casos e o rastreamento de contatos dos infectado.

Publicado por Deutsch Wlle, em 21.10.2020

Pazuello testa positivo para covid-19

Ministro da Saúde é o 12º integrante do primeiro escalão do governo Bolsonaro a contrair o coronavírus, além do próprio presidente. Ele teve febre e chegou a cancelar participação em evento.

Pazuello teria relatado a auxiliares que estava se sentindo mal na segunda-feira

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, testou positivo para a covid-19, informou o Ministério da Saúde nesta quarta-feira (21/10). Ele passa a ser o 12º integrante do primeiro escalão do governo de Jair Bolsonaro a contrair o coronavírus.

Segundo o jornal Folha de S. Paulo, Pazuello teria relatado a auxiliares que estava se sentindo mal na segunda-feira e chegou a cancelar sua participação em um evento no Palácio do Planalto. No dia seguinte, com febre e suspeita de covid-19, resolveu fazer o teste.

Ele está no cargo desde maio, primeiro como ministro interino e depois efetivo, tendo substituído o médico Nelson Teich, que ficou menos de um mês no posto.

Sem experiência na área de gestão da saúde pública, Pazuello logo se tornou um facilitador das vontades de Bolsonaro no ministério, mesmo quando as ordens se chocavam com o consenso científico. Ele editou protocolos para a expansão do uso da hidroxicloroquina e chegou a tentar esconder os números da pandemia.

Por outro lado, tentou melhorar as relações do ministério com os governadores do país, que estavam em pé de guerra com Bolsonaro por causa das atitudes erráticas do presidente – o mandatário sempre minimizou o vírus e agiu sistematicamente para sabotar a imposição de medidas de distanciamento social no país.

Além de Pazuello, outros 11 dos 23 ministros de Bolsonaro já foram infectados. Entre eles estão Walter Braga Netto (Casa Civil), Jorge Oliveira (Secretaria-Geral), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Onyx Lorenzoni (Cidadania), Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia e Inovações), Milton Ribeiro (Educação) e Bento Albuquerque (Minas e Energia).

Em julho, o próprio presidente também testou positivo para a covid-19, após meses ignorando recomendações médicas sobre evitar aglomerações. Pouco menos de três semanas depois, ele disse ter ficado livre do vírus. Sua esposa, Michelle, e seu filho Flávio Bolsonaro também foram infectados.

Todos os chefes dos três Poderes no Brasil já contraíram o vírus. O primeiro deles foi o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que anunciou estar com covid-19 em março. Mais recentemente, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, informou seu teste positivo, apenas quatro dias após tomar posse, em setembro.

Em seguida, foi a vez de o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, se juntar a essa lista. Maia esteve na posse de Fux, na sede do STF, em Brasília. Na ocasião, usou máscara.

Ele não foi o único convidado a anunciar posteriormente que havia sido contaminado. Dois ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que também estiveram na cerimônia, Luis Felipe Salomão e Antonio Saldanha Palheiro, também testaram positivo.

Publicado por Deutsch Welle, em 21.10.22

Papa Francisco defende união civil homossexual

Pela primeira vez desde que assumiu a liderança da Igreja Católica, pontífice se manifesta a favor da união civil entre pessoas do mesmo sexo. "Gays têm direito a ter família, são filhos de Deus", diz em documentário.


Papa Francisco dá sua bênção durante a oração do meio-dia feita da janela de seu estúdio com vista para a Praça de São Pedro, no Vaticano

"Precisamos de uma lei de união civil. Eles têm o direito de ser cobertos legalmente", afirma Francisco no filme

A união de casais homossexuais recebeu a mais explícita aprovação do papa Francisco, a primeira desde que ele se tornou líder da Igreja Católica, em 2013. O endosso foi divulgado em um documentário que estreou nesta quarta-feira (21/10) no Festival de Cinema de Roma.

Em Francesco, o pontífice pede uma "lei de união civil" que permita que pessoas LGBTs "estejam em uma família".

"Os homossexuais têm direito a ter uma família, são filhos de Deus [...]. Ninguém pode ser expulso de uma família, e a vida dessas pessoas não pode se tornar impossível por esse motivo."

Francisco já havia se pronunciado a favor da união civil entre pessoas do mesmo sexo anteriormente, mas quando servia como arcebispo de Buenos Aires. Na ocasião, ele saudou tais uniões como uma alternativa ao casamento gay, mas se opôs ao casamento em si.

Desde que assumiu a cadeira papal, portanto, esta é a primeira vez em que o pontífice de 83 anos endossa publicamente a união civil homossexual.

"O que temos que fazer é uma lei de união civil. Eles têm o direito de ser cobertos legalmente. Eu defendi isso", afirma o papa no documentário de duas horas, que trata sobre os sete anos de seu pontificado com depoimentos e entrevistas.

A Igreja Católica perseguiu gays durante grande parte de sua história, e ainda vê a homossexualidade como uma "desordem intrínseca". A igreja também ensina que atos homossexuais são pecaminosos, mas sua postura moderna prega que ser gay não é um pecado por si só.

O autor jesuíta James Martin, que atua como consultor do Secretariado de Comunicações do Vaticano, elogiou a medida do papa como um "grande passo à frente".

"Ela está de acordo com sua abordagem pastoral à comunidade LGBT, incluindo católicos LGBT, e envia um forte sinal aos países onde a Igreja se opõe a tais leis", escreveu ele no Twitter.

Um telefonema do papa

O documentário foi dirigido pelo cineasta Evgeny Afineevsky, um cidadão americano nascido na Rússia e de origem judaica. Além do papa, a produção também é estrelada por outros clérigos, bem como um sobrevivente gay de abuso sexual.

Um dos momentos mais emocionantes do longa detalha a interação entre o papa e um homossexual que, junto com seu companheiro, adotou três filhos.

O homem afirmou ter entregado uma carta a Francisco explicando sua situação, dizendo que ele e seu parceiro queriam criar os filhos como católicos, mas não sabiam como seriam recebidos.

Dias depois, o pontífice teria ligado para o homem dizendo que ficou comovido com a carta e pedindo-lhe que apresentasse as crianças à paróquia local, apesar da possível oposição.

"O fio condutor deste filme é mais sobre nós como seres humanos, que estamos criando desastres todos os dias. E ele [o papa] é quem está nos conectando por meio desses fios", disse o diretor do filme em uma entrevista.

Afineevsky, que compareceu à audiência geral do Papa no Vaticano na quarta-feira, ganhou o Prêmio Kineo de Humanidade com Francesco. A premiação é voltada a quem promove questões sociais e humanitárias.

Publicado originalmente por Deutsch Welle, em 21.10.20

terça-feira, 20 de outubro de 2020

STF dá domiciliar a presos provisórios responsáveis por crianças e portadores de deficiência

Em decisão unânime, ministros da Segunda Turma atenderam habeas corpus coletivo apresentado pela Defensoria Pública da União que pode beneficiar cerca de 31 mil detentos


Penitenciária Feminina de Santana, na zona norte de São Paulo Foto: Tiago Queiroz / Estadão

Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) atendeu, em julgamento por videoconferência nesta terça-feira, 20, um habeas corpus coletivo apresentado pela Defensoria Pública da União (DPU) para conceder prisão domiciliar a todos os presos provisórios que têm sob sua única responsabilidade a tutela de pessoas com deficiência e crianças menores de 12 anos de idade. Cerca de 31 mil detentos podem ser beneficiados com a determinação, segundo levantamento preliminar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O voto do ministro Gilmar Mendes, relator do caso, foi acompanhado pelos colegas Edson Fachin, Cármen Lucia e Ricardo Lewandowski. Antes da leitura dos pareceres, o subprocurador-geral José Elaeres também se manifestou em nome do Ministério Público Federal (MPF) a favor da concessão do HC.

Em seu voto, Gilmar Mendes registrou que há ‘elementos concretos’ que justificam a conversão da prisão preventiva em domiciliar nos termos solicitados pela Defensoria. O ministro citou o entendimento fixado pelo próprio Supremo em julgamento, em fevereiro do ano passado, que concedeu o benefício a grávidas e mães de crianças de até 12 anos.

“O referido writ restringiu a concessão da ordem à figura materna, analisando as especificidades de gênero no encarceramento feminino e destacando as peculiaridades das mulheres nos estabelecimentos prisionais”, observou Gilmar.

O ministro lembrou ainda uma série de dispositivos de proteção a menores e pessoas com deficiência previstos no ordenamento jurídico do País.

“Entre os integrantes do núcleo familiar das pessoas submetidas a medidas restritivas da liberdade, a Constituição, as normas internacionais e a legislação federal atribuem especial relevância às crianças e às pessoas portadores de deficiência”, afirmou.

Com a decisão, todos os Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais serão notificados e devem apresentar ao STF, em até 45 dias, a listagem dos casos de concessão de habeas corpus com base no julgamento de hoje. Isso porque o relaxamento do regime de prisão não é automático, mas deve ser autorizado individualmente pelo juízo responsável.

“O pedido formulado pela DPU está em consonância com a própria solução legal delineada pelo Congresso brasileiro. Por outro lado, vislumbra-se certa resistência por parte de alguns Juízes e Tribunais na aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, o que justifica o interesse no ajuizamento desta ação e a necessidade de concessão da ordem pleiteada”, registrou o relator.

Entre as condições fixadas para a concessão do benefício estão a comprovação, no caso dos homens, de que são os únicos responsáveis pelos dependentes. Se não for pai nem mãe, o preso tem que demonstrar ser ‘imprescindível’ para cuidar da pessoa com deficiência ou da criança, que, nesse caso, deverá ter menos de seis anos.

“A execução desta decisão deve ser realizada de forma diligente, verificando-se as peculiaridades de cada caso, cabendo ao magistrado justificar os casos excepcionais onde as situações de riscos sociais ou do processo exijam a fixação de outras cautelares, inclusive a manutenção da prisão preventiva”, determinou Gilmar.

Na mesma linha do relator, Fachin lembrou a ‘sensibilidade e relevância’ da matéria. “Esta Segunda Turma tem, nesta ocasião, a oportunidade de fazer parte do cumprimento das promessas constitucionais não realizadas e que foram outorgadas em favor das crianças brasileiras e das pessoas com deficiência pelo Constituinte em 1988”, disse.

O habeas corpus coletivo — tipo de ação que julgada — foi ajuizado no Supremo em 2018 pela DPU. No pedido, a Defensoria alegou que crianças, muitas vezes fragilizadas pelo sofrimento do afastamento materno, são ainda mais expostas com a prisão dos responsáveis legais.

Para o defensor federal Gustavo de Almeida Ribeiro, que atuou no caso perante o Supremo Tribunal Federal, a decisão amplia a proteção a menores e pessoas com deficiência.

“Foi uma decisão importante porque nem toda criança é criada pela mãe, por uma série de fatores. Seja por falecimento, abandono, então essas outras crianças merecem o mesmo tratamento àquele que foi dado às crianças que são criadas pela mãe”, afirmou o defensor. Ele destaca que a decisão não é uma ‘concessão automática’ e que foram estabelecidos uma série de condicionamentos. “Mas, pelo menos, (a decisão) pode gerar essa possibilidade de reavaliação da situação”.

Rayssa Motta e Paulo Roberto Netto / O Estado de São Paulo.

Sobre privilégios e tartarugas

Privilégios emperram quaisquer reformas sérias, principalmente a administrativa

Por Ives Gandra da Silva Martins

Aos 85 anos ainda procuro entender a lógica daqueles que exercem o poder, de seus conselheiros e dos ideólogos que os inspiram, assim como do povo que os apoia. Meu país oferece ao observador externo um palco excelente para esse tipo de pesquisa. 

No Brasil denomina-se “servidor público” o cidadão que deve servir ao povo, sendo dois vocábulos prenhes de significação. “Servidor” é quem serve, “público” é quem se volta para o povo.

Ora, na pandemia o povo sofreu terrível redução de sua renda – entidades calculam em 25% do que antes ganhava, na média –, assim como as empresas produtoras de riquezas e tributos reduziram sua atividade em face do confinamento. Além disso, mais de 700 mil fecharam, elevando o desemprego para além de 13% da população trabalhadora. Se analisarmos o subemprego, a cifra dos que estão sem trabalho ou na linha extrema da sobrevivência sobre para cerca de 30%. Esse contingente representa o povo que deveria ser servido pelos servidores.

Em duas decisões, contudo, a Suprema Corte declarou não poder haver redução de subsídios e benesses concedidas aos servidores; e se não houver recursos orçamentários para remunerá-los, que o Executivo encontre formas de atendê-los. No tema da irredutibilidade, a votação foi de 7 a 4 e no “vire-se o Executivo”, 6 a 5.

Ora, no País o custo da “mão de obra” dos servidores é de 13,1% a 13,8% do PIB, conforme se adotem os critérios da OCDE ou de institutos nacionais de aferição. Diga-se de passagem que a média da OCDE para seus membros é de 10,2%, numa demonstração de que no Brasil os funcionários ganham muito mais que os dos países desenvolvidos. Por essa razão Brasília se transformou numa autêntica Versalhes de Luís XVI em pleno século 21.

Pergunto eu: quem serve a quem? Nos três Poderes fala-se em democracia, mas será que a democracia que nós, comuns mortais, desejamos não é aquela em que o povo comande e seja servido, e não aquela em que é transfigurado em “escravo da gleba” dos tempos modernos, para servir aos senhores feudais enquistados nas delícias das cortes brasilienses?

Compreende-se, pois, o motivo de ser a carga tributária brasileira tão alta e, apesar disso, o endividamento crescer assustadoramente, pois o governo toma dinheiro no mercado para pagar despesas correntes. Tal lógica democrática contemporânea eu só queria entender, pois o parágrafo único do artigo 1.° da Constituição estabelece que “todo o poder emana do povo”!

Outro ponto que este velho cidadão não consegue compreender diz respeito à diferença do tratamento dispensado aos “nascituros tartarugais” e aos “nascituros humanos”. Pela Lei nº 9.605/93, destruir ovos de tartarugas é um crime, punido seja por restrição à liberdade ou por penas alternativas. A destruição de seres humanos, todavia, na sua forma embrionária, já foi autorizada pela Suprema Corte, há 13 anos, para pesquisas até hoje sem sucesso, assim como há inúmeros projetos propondo a legalização do homicídio uterino, sobre haver proposta no pretório excelso a permitir a produção de lixo hospitalar humano até três meses após a concepção.

Ora, o artigo 1.°, inciso III, da Lei Maior fala em dignidade humana e o caput do artigo 5.°, na inviolabilidade do direito à vida, assegurada no artigo 2.° do Código Civil, ao dizer que todos os direitos do nascituro estão garantidos desde a concepção. Tal dispositivo vem do Código de 1917. Nunca consegui explicar aos meus alunos que lógica existe em dizer que todos os direitos do nascituro são assegurados desde a concepção, menos um direito de pouca relevância, como é o “direito à vida”. O próprio Tratado de Direitos Humanos do Pacto de São José o assegura, no artigo 4.º.

Gostaria, pois, de entender por que o “nascituro tartarugal” deve ser mais protegido que o “nascituro humano”, quando o caput do artigo 5.° da Constituição federal, que garante a inviolabilidade do direito à vida – que no ser humano começa com o zigoto, ou seja, a fecundação do óvulo por um espermatozoide –, e o artigo 2.° do Código Civil são manipulados de tal forma que as tartarugas e os ursos pandas valham mais que os seres da nossa espécie. Por essa razão já propus a defensores públicos e membros do Ministério Público a criação de uma Curadoria do Nascituro, como existe a Curadoria dos Menores.

Enfim, em tempos de pandemia e aos 85 anos, gostaria de compreender melhor esses privilégios de que não dispõem os cidadãos comuns e os de direitos “tartarugais” superiores aos direitos humanos.

Perguntarão os leitores que relação existe entre os privilégios e as tartarugas, para um artigo escrito para as páginas do Estado, que frequento há pelo menos meio século. É que os privilégios emperram quaisquer reformas sérias, principalmente a administrativa, o que faz que todas elas, objetivando tornar o Estado eficiente, andem, neste país, a passo de tartaruga. Talvez por essa razão os “nascituros tartarugais” sejam mais importantes do que os “nascituros humanos”.

IVES GANDRA MARTINS É PRESIDENTE DO CONSELHO SUPERIOR DE DIREITO DA FECOMERCIO-SP, É PROFESSOR EMÉRITO DA UNIVERSIDADE MACKENZIE E DAS ESCOLAS DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO (ECEME) E SUPERIOR DE GUERRA (ESG).PUBLICADO ORIGINALMENTE POR 'O ESTADO DE SÃO PAULO', EDIÇÃO DE 20.10.2020

O presidente do Supremo pode cassar liminar de outro ministro?

Em respeito aos meus colegas criminalistas, não tratarei aqui sobre a legalidade ou ilegalidade, o acerto ou desacerto da soltura de André Oliveira Macedo, chefe da facção PCC conhecido como André do Rap. Também não ouso sugerir a interpretação correta do parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal, que trata da reavaliação das prisões preventivas a cada 90 dias. Tudo isso é, na verdade, irrelevante para o que aqui quero dizer.

O resumo da ópera é o seguinte: André do Rap impetrou Habeas Corpus para o Supremo Tribunal Federal. O ministro Marco Aurélio, em decisão monocrática, determinou a soltura do preso sob o argumento de que o simples fato de sua prisão não ter sido reavaliada dentro do prazo de 90 dias seria ilegal.

Depois de quatro longos dias de exposição na mídia, a Procuradoria-Geral da República percebeu o tamanho da presepada e disparou a primeira arma que viu à frente: a suspensão de liminar, prevista no artigo 4ª da Lei nº 8.437/1992. Pediu ao presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, a cassação da liminar do ministro Marco Aurélio.

Fux não hesitou e, de forma praticamente autofágica, censurou seu par. Cassou a liminar e submeteu a controvérsia ao plenário. O pleno do Supremo referendou, por 9 a 1 (vencido sozinho o ministro Marco Aurélio), a decisão do presidente na tarde da última quinta-feira (15/10) de manter a prisão preventiva de André do Rap que, por sua vez, enquanto os ministros trocavam caneladas, já estava a alguns quilômetros depois de onde Judas perdeu as botas.

O curioso é que, apesar da votação expressiva pela manutenção da prisão, alguns dos ministros, como Rosa Weber, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, manifestaram inconformismo com a atitude do presidente de, monocraticamente, cassar a decisão de outro ministro da corte. No entanto, como se estava diante de "situação excepcionalíssima", fizeram vista grossa e a votação seguiu o resultado ontem visto.

A prática do presidente do Supremo Tribunal Federal de cassar decisões de outros ministros da própria corte tem se tornado comum e aceita por boa parte dos juristas e da mídia, principalmente quando o resultado lhes interessa. Na história recente, mais precisamente nos últimos dois anos, isso aconteceu pelo menos três vezes — isso sem falar do que é feito, de forma semelhante, nos tribunais federais das cinco regiões e nos demais tribunais estaduais.

Do caso mais recente para o mais antigo: em janeiro de 2019, o ministro Marco Aurélio havia determinado que a eleição da mesa diretiva do Senado se desse mediante voto aberto. O ministro Toffoli foi acionado e derrubou a decisão, mantendo secreta a votação.

Em dezembro de 2018, o ministro Toffoli cassou a decisão do ministro Marco Aurélio (de novo, ele), que havia determinado, às vésperas do recesso forense, a soltura de todos os presos cumprindo pena após condenação em segunda instância. Houve desgaste extremo internamente na corte e o caso foi amplamente noticiado na mídia dado que afetaria, entre outros, o ex-presidente Lula, custodiado em Curitiba.

Antes, foi o ministro Ricardo Lewandowski a vítima. Depois de permitir ao ex-presidente Lula conceder entrevista da prisão, teve sua decisão cassada pelo ministro Luiz Fux, que estava exercendo provisoriamente a presidência do Supremo na ausência do titular. Ao reassumir a presidência, Toffoli ratificou a decisão de Fux. 

O fundamento invocado pelos ministros Dias Toffoli e Luiz Fux, enquanto na presidência, para suspender as decisões de seus pares é a suspensão de liminar prevista no artigo 4º da Lei nº 8.437/1992, que prescreve o seguinte:

"Artigo 4º — Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas".

O dispositivo não autoriza, nem de perto, que o presidente do Supremo Tribunal Federal casse decisões de outros ministros. O artigo em questão é aplicável, em primeiro lugar, contra decisões que afetem o "poder público e seus agentes". Ou seja, em decisões proferidas contra a Administração Pública, não contra particulares.

No caso concreto de André do Rap, não houve decisão contra o poder público ou agente mandando fazer ou deixar de fazer algo. A decisão envolvendo diz respeito e atinge um sujeito determinado: o próprio André do Rap. Apesar de tido como chefe de organização criminosa que tem orçamento maior do que muitos municípios do país, André ou o PCC não podem, por óbvio, ser considerados entes da Administração Pública para os efeitos de suspensão de liminar. A questão é unicamente privada, mesmo ciente dos reflexos e danos colaterais de sua soltura na sociedade.

Demais disso, o pedido não serve para a cassação de decisões de membros do mesmo órgão colegiado. Ou seja, o dispositivo permite aos presidentes dos tribunais suspenderem os efeitos de liminares proferidas contra o poder público por juízes de instâncias inferiores, nunca da mesma. As competências do presidente estão dispostas na lei processual e no artigo 13 do Regimento Interno do Supremo Tribunal e, em nenhum desses dois lugares, o presidente tem o poder de censor ou de superministro.

Em resumo, por mais que a decisão de um ministro agrade ou desagrade, não existe hierarquia dentro do Supremo Tribunal Federal (e em nenhum dos outros tribunais do país), o presidente não manda mais que ninguém e não pode cassar decisões de seus pares. Foi exatamente o que consignou o ministro Lewandowski ontem (15/10) em seu voto:

"O presidente do Supremo Tribunal Federal, assim como o seu vice, não são órgãos jurisdicionais hierarquicamente superiores a nenhum dos ministros da Corte. Apenas as funções de ordem estritamente administrativa para a organização dos trabalhos e o funcionamento do Tribunal é que os diferencia dos demais membros da Casa.

Por essa razão, não se pode admitir que, fazendo uso processualmente inadequado do instituto da Suspensão de Liminar, o presidente ou o vice do STF se transformem em órgãos revisores de decisões jurisdicionais proferidas por seus pares, convertendo-se em verdadeiros em superministros.

O perigo de conceder-se uma tal discricionariedade aos dirigentes da Corte, permitindo que atuem em situações por eles próprios consideradas excepcionais, consiste no risco de que passem a cassar decisões de colegas com base em meras idiossincrasias pessoais ou quiçá movidos por algum viés político".

O ministro Fux até parece saber, nas entrelinhas, que não tinha competência para cassar a decisão do colega. Mas justificou a medida dizendo tratar-se de situação excepcionalíssima, envolvendo preso de "comprovada altíssima periculosidade" e grave violação da ordem pública.

Nenhum dos fundamentos invocados pelo presidente é juridicamente sustentável. A lei não prevê suspensão de decisão de outros ministros pelo presidente com fundamento em situação "excepcionalíssima" ou outros superlativos que se queira alegar. Aliás, o que é situação excepcionalíssima? Em quais casos o presidente poderia cassar a decisão? Em situações excepcionais (como as que vemos todos os dias nos tribunais do país) ou apenas nas excepcionalíssimas?

E mais, o caminho processual já está trilhado na regra do jogo. Caberia, na hipótese, o agravo regimental. Só que esse recurso é conduzido pelo mesmo relator, e depende de sua vontade de reconsiderar a decisão ou levar ao colegiado (que seria uma das turmas, e não o pleno. Aliás, hoje em dia tudo chega ao pleno). A Procuradoria-Geral da República sabia disso e quis encurtar o caminho pela via transversa buscando a sorte com o presidente, que lhe seria mais simpático. A PGR lançou a tarrafa e agora mostra o troféu.

Com o devido respeito ao excelentíssimo presidente, situações excepcionalíssimas não são fundamento para transgredir a ordem jurídica e valer-se de um instrumento processual manifestamente incabível para justificar os fins. É evidente que se trata de situação excepcional, mas o ordenamento jurídico existe justamente para garantir a segurança jurídica e a previsibilidade das decisões.

Não é admissível romper a ordem jurídica com o pretexto de protegê-la. A história recente do país já nos mostrou os efeitos deletérios desse tipo indesejável de voluntarismo. E o Supremo Tribunal Federal, a quem compete a guarda da Constituição, é justamente quem deve dar o peito a protegê-la, não dobrá-la.

Gustavo Ramos da Silva Quint, o autor deste artigo, é advogado, mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina, graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e membro-fundador do Grupo de Estudos em Direito Público – GEDIP, da Universidade Federal de Santa Catarina. Publicado originalmente, sob o título "O Presidente do Supremo não pode cassar liminares dos outros Ministro, pela revista eletrônica Consultor Jurídico, em 20.10.1010.

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Ignorância como ativo eleitoral

Na ânsia de criticar as medidas de combate à pandemia, bolsonaristas escancaram seu darwinismo social, o que deveria custar votos

Não é somente a corrupção que degrada a política, como querem fazer crer os oportunistas que se travestiram de cruzados anticorrupção para alcançar o poder nas eleições passadas. A política também perde o sentido quando a ignorância é elevada à categoria de ativo eleitoral.

Tome-se como exemplo a declaração de Celso Russomanno, candidato à Prefeitura de São Paulo, segundo a qual “não temos uma quantidade imensa de moradores de rua com problema de covid” porque “talvez eles sejam mais resistentes que a gente porque convivem o tempo todo nas ruas, não têm como tomar banho todos os dias, et cetera e tal”.

Seria um erro tratar essa declaração grotesca como simples anedota de campanha eleitoral, como tantas que períodos estranhos como esse costumam produzir. É, ao contrário, fortemente simbólica do pesadelo que o País atravessa, entregue em parte a políticos que deliberadamente tratam os eleitores como néscios e, pasme o leitor, ainda ganham votos com isso. 

Ao classificar os pobres como uma espécie diferente, “mais resistente que a gente” porque vive nas ruas e não toma banho, o candidato Celso Russomanno nada mais fez do que imitar seu padrinho, o presidente Jair Bolsonaro – que não faz muito tempo, também a propósito da pandemia, disse que “o brasileiro tem que ser estudado” porque “ele não pega nada: você vê o cara pulando em esgoto ali, sai, mergulha, tá certo?, e não acontece nada com ele”.

Na ânsia de criticar as medidas de combate à pandemia, sobretudo o isolamento social, adotadas pelos governos estaduais e prefeituras, os bolsonaristas escancaram seu darwinismo social e fazem o elogio do obscurantismo, o que deveria escandalizar os cidadãos brasileiros e custar votos. Mas não é isso o que acontece: a popularidade de Bolsonaro vem subindo e o candidato Celso Russomanno está liderando as pesquisas.

Esse aparente sucesso da impostura como capital eleitoral pode sugerir que candidatos aumentarão suas chances de vitória se deliberadamente investirem em embustes grosseiros, impressão que tende a multiplicar as candidaturas sustentadas por discursos fraudulentos. Como resultado, a campanha eleitoral, que normalmente já é repleta de promessas grandiloquentes e distorções da realidade, corre o risco de ser conduzida para o terreno da farsa absoluta – em que opiniões absurdas como a do candidato Russomanno, chanceladas pelo presidente Bolsonaro, ganham mais valor que os argumentos embasados em fatos comprovados.

Isso nada tem a ver com política: é, ao contrário, sua completa negação, pois não é possível falar em política sem que haja uma realidade compartilhada por todos, a partir da qual se discutirão as soluções concretas para os problemas da comunidade. 

Quando candidatos favoritos a cargos eletivos e líderes políticos da envergadura de um presidente da República se esforçam para conduzir o debate para o terreno da mais absoluta mistificação, negando a razão e a ciência como se estas fossem prejudiciais ao País, salga-se o terreno comum da política, enquanto germina o campo do charlatanismo autoritário.

Tudo isso no momento em que a pandemia já matou mais de 150 mil brasileiros. Ou seja, não é um capricho qualquer, tampouco um tema que possa ser tratado de forma leviana na campanha: é de vida ou morte que se trata. Se um postulante à prefeitura da maior cidade da América Latina, apoiado por ninguém menos que o presidente da República, “argumenta”, sem nenhuma base na realidade, que moradores de rua devem ser imunes à covid-19 porque não tomam banho e vivem aglomerados, é o caso de levantar as mãos aos céus e agradecer pelo fato de não ser ele o prefeito neste momento.

Mas pode vir a ser, segundo indicam as pesquisas de intenção de voto. E esse desfecho eleitoral, a julgar pelo que se viu até aqui, pode ajudar a aprofundar o empreendimento bolsonarista de aniquilação da inteligência e da capacidade de julgamento, sem as quais não se administra racionalmente um governo nem, muito menos, se constrói uma democracia saudável.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo. 15.10.2020

PF encontra dinheiro na cueca de vice-líder do governo Bolsonaro

Auxiliares de Bolsonaro dizem que Chico Rodrigues (DEM-RR) deve deixar o cargo; senador é alvo da Operação Desvid-19 deflagrada nesta quarta-feira, 14, para investigar desvios de recursos públicos destinados ao combate à pandemia de covid-19, oriundos de emendas parlamentares.


Chico Rodrigues. Foto: Pedro França/Agência Senado

O vice-líder do governo no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR), alvo de operação da Polícia Federal nesta quarta-feira, 14, em Boa Vista (RR), escondeu dinheiro na cueca durante a abordagem dos policiais. A investigação, sob sigilo, apura desvios de recursos públicos destinados ao combate à pandemia de covid-19, oriundos de emendas parlamentares. A ordem de busca e apreensão foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso.

Segundo o Estadão apurou com duas fontes que tiveram acesso a informações da investigação, foram encontrados R$ 30 mil dentro da cueca do vice-líder do governo Jair Bolsonaro. Ao todo, os valores descobertos na casa do senador chegariam a R$ 100 mil. A investigação apura indícios de irregularidades em contratações feitas com dinheiro público, que teriam gerado sobrepreço de quase R$ 1 milhão.

No Palácio do Planalto, auxiliares de Bolsonaro ouvidos pelo Estadão, sob reserva, disseram que Rodrigues deve deixar o cargo de vice-líder do governo. O argumento é que seria péssimo para a imagem de Bolsonaro manter o senador nesse posto depois do escândalo. A expectativa é a de que o próprio parlamentar entregue o cargo.

As informações oficiais da PF, dado o sigilo do caso, se limitam a dizer que foram cumpridos sete mandados de busca e apreensão durante a operação, em Boa Vista, que busca a “desarticulação de possível esquema criminoso voltado ao desvio de recursos públicos, oriundos de emendas parlamentares”.

A Controladoria-Geral da União (CGU), que também faz parte da investigação, disse que a operação Desvid-19, realizada em Roraima, apura o “desvio de recursos públicos por meio do direcionamento de licitações”. Ainda segundo a CGU, as contratações suspeitas de irregularidades, realizadas no âmbito da Secretaria de Estado da Saúde (SESAU/RR), envolveriam aproximadamente R$ 20 milhões que deveriam ser utilizados no combate ao coronavírus.

A operação que alvejou o senador foi realizada no mesmo dia em que Bolsonaro disse que dará uma “voadora no pescoço” de quem se envolver em corrupção. A nova expressão foi usada uma semana depois de o presidente ter afirmado que a Lava Jato acabou porque, segundo ele, não há casos de irregularidades em sua gestão. A promessa também foi feita no momento em que Bolsonaro vem sendo criticado por militantes e por lavajatistas que apontam o enfraquecimento da pauta anticorrupção no governo.

Chico Rodrigues emprega Leo Índio como assessor parlamentar, em seu gabinete no Senado. Primo dos filhos do presidente, Léo Índio é muito próximo do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), conhecido como “zero dois”, e por ter livre trânsito no Palácio do Planalto.

Em nota à imprensa, Rodrigues disse que tem “um passado limpo e uma vida decente” e afirmou nunca ter se envolvido em escândalos. “Acredito na justiça dos homens e na justiça divina. Por este motivo estou tranquilo com o fato ocorrido hoje em minha residência em Boa Vista, capital de Roraima. A Polícia Federal cumpriu sua parte em fazer buscas em uma investigação na qual meu nome foi citado. No entanto, tive meu lar invadido por apenas ter feito meu trabalho como parlamentar, trazendo recursos para o combate ao Covid-19 para a saúde do Estado”, afirmou o senador.

O senador observou, ainda, que ao longo de 30 anos na política conheceu “muita gente mal intencionada”, a fim de macular sua imagem. “Ainda mais em um período eleitoral conturbado como está sendo o pleito em nossa capital”, declarou.

Durante o julgamento do caso do traficante André do Rap, o ministro do Supremo Tribunal Federal STF) Luís Roberto Barroso fez uma menção à operação realizada nesta quarta-feira, 14, pela Polícia Federal. Na ocasião, Barroso afirmou que estava monitorando o cumprimento de mandados de busca e apreensão que envolviam uma autoridade com foro no Supremo, sem revelar o nome. “Desviar dinheiro da saúde em plena pandemia é mais do que corrupção e chega bem próximo do assassinato. Devemos ter em conta que isso não é aceitável. Precisamos continuar no esforço de desnaturalização das coisas erradas no Brasil”, argumentou o ministro.

COM A PALAVRA, O SENADOR

“Acredito na justiça dos homens e na justiça divina. Por este motivo estou tranquilo com o fato ocorrido hoje em minha residência em Boa Vista, capital de Roraima. A Policia Federal cumpriu sua parte em fazer buscas em uma investigação na qual meu nome foi citado. No entanto, tive meu lar invadido por apenas ter feito meu trabalho como parlamentar, trazendo recursos para o combate ao Covid-19 para a saúde do Estado.

Tenho um passado limpo e uma vida decente. Nunca me envolvi em escândalos de nenhum porte. Se houve processos contra minha pessoa no passado, foi provado na justiça que sou inocente. Na vida pública é assim, e ao logo dos meus 30 anos dentro da política conheci muita gente mal intencionada a fim de macular minha imagem. Ainda mais em um período eleitoral conturbado como está sendo o pleito em nossa capital.

Digo a quem me conhece que, fiquem tranquilos. Confio na justiça, vou provar que não tenho, nem tive nada a ver com qualquer ato ilícito. Não sou executivo, portanto, não sou ordenador de despesas, e como legislativo sigo fazendo minha parte trazendo recursos para que Roraima se desenvolva. Que a justiça seja feita e que se houver algum culpado que seja punido nos rigores de lei.

Chico Rodrigues

Senador”

Breno Pires e Jussara Soares/BRASÍLIA. Publicado originalmente por O Estado de São Paulo.