Presidente se compromete com ações drásticas, como a ofensiva tarifária e o alinhamento com Putin em relação à Ucrânia
A imagem mostra uma sessão conjunta do Congresso dos Estados Unidos, com um grande número de pessoas presentes. No primeiro plano, um homem de costas, aparentemente falando, com os braços abertos. Atrás dele, há uma plateia composta por membros do Congresso, juízes e outras pessoas, algumas aplaudindo e outras em pé. O ambiente é formal, com bandeiras e símbolos do governo ao fundo.
Em 1987, quando era só um polêmico empreendedor, Donald Trump lançou um livro, escrito de fato pelo jornalista Tony Schwartz, chamado "A Arte do Negócio", sobre sua suposta genialidade empresarial.
A obra pode ser um guia para entender a mente do presidente americano, que suscita alarme com sua abordagem agressiva em temas como a ofensiva tarifária, a Guerra da Ucrânia ou o futuro da Faixa de Gaza.
Se está mantido o ideário negocial do Trump de quase 40 anos atrás, todas as ameaças seguem uma lógica: tumultuar o ambiente e assustar ao máximo o rival com exigências absurdas para, ao fim, arrancar concessões.
É uma leitura plausível dos acontecimentos, mas que não chega a ser tranquilizadora. Passados 45 dias de sua volta à Casa Branca, o republicano parece dobrar a aposta no confronto.
A começar pela guerra tarifária, que foi disparada contra os vizinhos México e Canadá e logo suspensa. Agora, as alíquotas de importação de 25% entraram em vigor, assim como os 20% aplicados sobre produtos chineses, o alvo real do equilíbrio comercial pretendido no discurso de Trump.
Ainda falta o teste da realidade para o argumento de que tal protecionismo vai gerar empregos, mas a ideia de que ele fará com que os EUA importem inflação está bastante consolidada. A medida acarreta juros mais altos, numa espiral de impactos no varejo doméstico e para consumidores de outros países, como o Brasil.
Dada a interconexão entre as maiores economias do mundo, EUA e China, a resultante dessa escalada tende a ser nefasta.
Na Europa, Trump ungiu Volodimir Zelenski como seu bode expiatório, armando uma espécie de emboscada ao vivo em encontro na Casa Branca. A partir dessa debacle histórica, com direito a bate-boca e expulsão do visitante, o americano suspendeu a ajuda militar à Ucrânia na sua luta contra Vladimir Putin.
Zelenski pediu perdão, mas parece improvável que o republicano vá deixar o alinhamento com o autocrata russo. Aqui, não seguiu o conselho central de seu livro: "A pior coisa que você pode fazer em uma negociação é parecer desesperado para fechá-la".
O embate azedou as relações entre Trump e a Europa, com a aliança militar Otan à frente. Governantes no continente correm a fazer contas para se rearmar, o que leva tempo e, ao fim, favorecerá empresas americanas.
Toda essa movimentação foi reafirmada no primeiro discurso do mandatário ao Congresso nesta gestão, com outros aspectos inquietantes. O anômalo ideário de enxugamento da máquina pública pelas mãos do bilionário Elon Musk foi aclamado, e Panamá e Groenlândia foram de novo ameaçados, assim como políticas ambientais e de diversidade.
Sem possibilidade de reeleição e em cenário muito mais favorável a ações drásticas do que no primeiro mandato, o Trump de 2025 confronta-se com o de 1987; resta saber qual prevalecerá.
Editorial da Folha de S. Paulo, em 06.03.25 (editoriais@grupofolha.com.br)
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