sábado, 21 de dezembro de 2024

Congresso atua como sindicato dos ricos e trava ajuste fiscal de que Brasil precisa, diz especialista em desigualdade

Desde que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou o pacote de corte de gastos públicos planejado pelo governo, na última quarta-feira de novembro, o país vive as consequências das reações à proposta.

Congresso 'atua como um empecilho à economia do país' (Getty)

O dólar ultrapassou a casa dos R$ 6 pela primeira vez na história no dia seguinte ao anúncio e lá ficou como expressão da insatisfação do mercado – que diz que esperava por medidas mais rígidas de redução fiscal. Na terça-feira (17), o dólar fechou em R$ 6,09.

No Congresso, a bancada governista também torceu o nariz, mas por outra razão: deputados estavam preocupados com as implicações nos programas sociais, sobretudo no Benefício de Prestação Continuada (BPC), mas também no salário mínimo.

Ao final, o Planalto precisou negociar com seu próprio partido, o PT, por votações favoráveis aos projetos.

Um dos maiores especialistas em desigualdades do país, o sociólogo Marcelo Medeiros, evita fazer críticas diretas ao ministro e seu pacote, mas deixa claro que, para ele, as medidas são ruins — e por vários motivos.

"É que é mais fácil cortar de quem é pobre do que de quem é rico. Também é mais imoral", resume.

Para Medeiros, é um erro político e moral mexer no salário mínimo

À BBC News Brasil, Medeiros, que está pesquisando neste ano na Universidade Columbia, em Nova York, nos Estados Unidos, e ainda é ligado à Universidade de Brasília (UnB), argumenta que o ajuste fiscal deveria focar em tributação no topo da renda, e não na base.

Estendendo essa análise, a decisão de isentar do Imposto de Renda (IR) uma classe média que ganha até R$ 5 mil por mês é uma "gotinha no oceano" perto do que deveria ser, para ele, realmente feito: revisar o grosso dos subsídios fiscais para diferentes setores produtivos.

Por causa desses subsídios, em 2022, o país renunciou a um montante de R$ 581 bilhões – ou mais de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) – em impostos, segundo dados oficiais.

Mas esse ajuste fiscal, que ele considera o pacote que deveria ser feito, de fato, não avança no Brasil por causa do Congresso, "que está atuando como um empecilho à economia do país" ao se comportar como um "sindicato dos ricos".

Porém, na leitura de Medeiros, o erro político — e moral — mais grave está em mexer no salário mínimo, que terá um teto de 2,5% de reajuste anual.

"Do Plano Real para cá, o principal mecanismo de redução de pobreza no Brasil tem sido o salário mínimo, e não Bolsa Família ou qualquer outro programa de assistência", diz Medeiros.

Sociólogo aponta limitações e problemas em pacote de ajuste fiscal anunciado pelo ministro Fernando Haddad.

Vinícius Mendes, Jornalista, de São Paulo para a BBC News Brasil, em 18.12.24

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