O populismo da Câmara nos levará a pagar um dos IVAs mais altos do mundo para financiar os regimes fiscais especiais que a reforma deveria ter eliminado
O propósito da reforma tributária é introduzir o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) para simplificar as regras, acabar com a cumulatividade dos tributos e taxar mais a renda do que o consumo. O País convive com um dos piores e mais disfuncionais sistemas tributários do mundo. No Brasil, a judicialização tributária representa 75% do PIB, enquanto a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é 0,28%. Mas a regulamentação da reforma na Câmara dos Deputados mostrou que tantos os políticos como a iniciativa privada estão dispostos a renunciar aos princípios da reforma para salvaguardar seus privilégios. Quando o populismo e a safadeza se encontram na Praça dos Três Poderes, o resultado é desastroso para o País.
Ao fatiar a relatoria da reforma e conduzir uma discussão açodada e rasa, o presidente da Câmara, Arthur Lira, abriu as portas para os lobbies do corporativismo. Da Zona Franca de Manaus ao produtor de carne, os regimes especiais garantiram os seus privilégios tributários. Como não tem almoço grátis, a conta desses benefícios será repassada para todos os brasileiros em forma de aumento de imposto. O populismo da Câmara nos levará a pagar um dos IVAs mais altos do mundo para financiar os regimes fiscais especiais que a reforma deveria ter eliminado!
O Senado tem o poder de rever o projeto da Câmara, mas parece difícil esperar algo virtuoso de uma Casa que acabou de aprovar uma das propostas mais imorais do ano. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, inventou um falso problema (a dívida “inafiançável” dos Estados) para resolver uma questão política (a dívida de Minas Gerais), cuja solução é de seu interesse eleitoral (ele aspira a ser candidato ao governo de Minas em 2026). O “socorro” aos Estados é uma bomba fiscal que pode custar R$ 28 bilhões ao ano, agravando a já periclitante situação fiscal do País.
O populismo do Senado é uma afronta aos Estados que promoveram um ajuste fiscal exemplar, como foi o caso do Espírito Santo, Mato Grosso, Pará e Mato Grosso do Sul, entre outros. O “problema” da dívida dos Estados se resume a São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. São Paulo tem a maior dívida, mas possui receita suficiente para pagar o serviço da dívida e honrar suas obrigações financeiras. O Rio de Janeiro é um Estado governado há décadas por populistas que não se envergonham de dar calote nos credores e recorrer à União para pagar suas dívidas. Esse foi o caso recente da privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae). O governo carioca não pagou os bancos e obrigou a União a pagar os empréstimos do Estado com bancos. Trata-se de um ato de safadeza política, endossado pelo Supremo Tribunal Federal.
O desastre financeiro do Rio Grande do Sul e Minas Gerais é fruto da trágica herança de governos populistas. Os governadores Romeu Zema e Eduardo Leite estão trabalhando duro para resolver o rombo financeiro deixado pelos seus antecessores. Leite conseguiu um aval da União, suspendendo por três anos o pagamento da dívida do Estado para atender às demandas urgentes da reconstrução do Rio Grande do Sul, castigado pela pior enchente da sua história. Já o governador Zema vem esbarrando no populismo da Assembleia Legislativa mineira, que insiste em postergar a privatização das estatais como a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig).
Nenhum país do mundo avançou com a agenda de reformas quando o populismo e a safadeza ditam a política de Estado. O legado do populismo no Brasil é trágico. Somos o país com uma das maiores cargas tributárias do mundo. Possuímos a menor taxa de crescimento econômico entre os principais países emergentes e estamos entre os 20 piores países do mundo na atração de investimento. Populistas são fiscalmente irresponsáveis e não se cansam de sabotar a economia de mercado, debilitar a democracia e cercear as liberdades individuais, jogando o País numa espiral de insegurança jurídica, imprevisibilidade e descrédito. Esperar algo positivo de populistas é plantar vento para colher tempestade, como ilustra a vã esperança dos incautos que votaram em Lula da Silva.
As únicas pessoas que podem mudar essa realidade somos nós, por meio das nossas escolhas. Há 30 anos, elegemos um estadista para a Presidência da República que concebeu o Plano Real, sepultou a hiperinflação e promoveu uma ousada agenda de reformas que incluiu privatização, quebra de monopólio estatal, Lei de Responsabilidade Fiscal e restauro da dignidade do exercício da Presidência da República. Infelizmente, o legado do presidente Fernando Henrique Cardoso foi sepultado por duas décadas de governos populistas.
Precisamos urgentemente eleger lideranças políticas que estejam dispostas a resgatar a credibilidade da democracia, a confiança nas instituições e a crença nas virtudes do livre mercado. Temos de nos mobilizar para livrar o Brasil do populismo, do nacional-estatismo e do Estado ineficiente. Se fracassarmos nessa missão, os nossos filhos viverão sob ditaduras. Está na hora de transformarmos a nossa indignação em ação política.
Luiz Felipe D'avila, o autor, é cientista político, autor do livro "10 Mandamentos - do País que somos para o Brasil que Queremos". Foi candidato à Presidência da República.
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