Em 11 de 19 países, minoria acha eleições justas; Brasil não está entre eles
Manifestantes invadem o Capitólio após derrota de Donald Trump nas eleições de 2022, em Washington (EUA) - Leah Millis/Reuters
De modo paradoxal, a democracia pode ser vítima de seu próprio sucesso. Avanços econômicos, dos direitos humanos, científicos e culturais nos países que primeiro a adotaram fazem com que se espere muito desse sistema político —que, na sua definição mais simples, se restringe à realização de eleições livres e justas.
Exemplo de ampliação da concepção de democracia está na pesquisa "Perceptions of Democracy", que avaliou o prestígio desse modelo em 19 países.
Menos de 50% dos cidadãos estão satisfeitos com seus governos em 17 deles, Brasil incluso, o que os torna mais vulneráveis a líderes populistas e/ou autoritários.
Mas, provavelmente, é exigir demais da democracia que ela assegure prosperidade. Ela pode ou não fazê-lo. Mesmo democracias consolidadas enfrentam problemas sociais, seja por intempéries ou por más escolhas do eleitorado.
Ademais, nações que primeiro aderiram ao sistema abrigaram outras instituições, como a liberdade de expressão e o amplo acesso à Justiça, que tendem a gerar efeitos sociais positivos e também foram avaliados pelo levantamento.
Só 12% dos brasileiros confiam na Justiça e 50% sentem ter liberdade para se expressar publicamente.
Tais elementos constituem um bônus além das eleições. Em teoria, um déspota esclarecido poderia assegurá-los sem votos.
Fato é que o regime democrático funciona porque previne a violência política. Ou seja, vale mais a pena para o grupo derrotado nas urnas esperar nova chance de assumir o poder do que tentar impor-se pela força, com risco de perder e ver-se eliminado do jogo.
O fator básico e inafastável da democracia, portanto, é a realização de pleitos tidos como livres e justos. E aí a pesquisa acende um sinal de alerta, que vai além de ampliações da definição do termo.
Em 11 dos 19 países, menos de 50% dos cidadãos consideram que as eleições são livres e justas; em 8, há mais pessoas favoráveis do que contrárias a um líder "forte que não tem de se preocupar com o Parlamento ou eleições". É a receita para o desastre —felizmente, o Brasil não está nesses grupos.
Editorial d Folha de S. Paulo, em 23.04.24. (Edção impressa). / editoriais@grupofolha.com.br
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