Movida por revanche, PEC que limita decisão individual no STF acerta no mérito
Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, e Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal - (Pedro Ladeira - 5.out.23/Folhapress)
Um jogo de exageros retóricos perpassa os debates públicos e as escaramuças privadas em torno da proposta de emenda à Constituição nº 8 de 2021, recém-aprovada no Senado e encaminhada para a análise da Câmara dos Deputados.
Não se trata, como querem fazer crer os ministros do Supremo Tribunal Federal, de ameaça existencial à corte ou ao Estado democrático de Direito. É verdade, contudo, que não estamos diante de uma medida concebida para aperfeiçoar as instituições ou aprimorar o equilíbrio entre os Poderes, como diz Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado.
A PEC, em sua versão final, tem como principal dispositivo a limitação das decisões individuais (monocráticas) de ministros e desembargadores em ações de controle de constitucionalidade —aquelas nas quais um tribunal pode suspender a eficácia de uma determinada lei por considerá-la uma afronta à Constituição Federal ou estadual.
Em texto anterior, havia ainda a previsão de disciplinar pedidos de vista, deixando-os menos à mercê dos ministros —mas esse trecho não resistiu às discussões no plenário do Senado e terminou excluído, em parte porque o próprio STF, faz poucos meses, baixou norma interna com o mesmo objetivo.
Nada há de errado nessas medidas, ainda que se possam discutir os detalhes. Ambas tocam em desvios das cortes brasileiras; integrantes do STF, em particular, recorrem tão amiúde a esses instrumentos que fazem da exceção uma regra perniciosa a serviço de seus próprios interesses. Daí por que não cabe na PEC o figurino que os ministros reservaram para ela.
Ao mesmo tempo, cumpre ressaltar, se a proposta acerta nos vícios, não o faz por virtude de seus proponentes. A despeito do discurso dos senadores, estes se mexeram sobretudo por revanchismo.
Com Pacheco e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) à frente, parte dos congressistas joga para satisfazer setores conservadores da política e da opinião pública, em particular aliados e seguidores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que tomaram o Supremo e o Judiciário como antagonistas.
Deve-se atentar para o risco de que prosperem propostas absurdas de retaliação política, como a que dá aos parlamentares a capacidade de anular decisões judiciais —ao arrepio do sistema de freios e contrapesos entre os Poderes.
Mas ao STF, que tem razão de se orgulhar de sua atuação no governo Bolsonaro, falta humildade para perceber que, sem autocontenção, continuará fornecendo a melhor munição a seus inimigos.
Editorial da Folha de S. Paulo, em 24.11.23 (editoriais@grupofolha.com.br)
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