sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Por que existem tão poucos partidos dispostos a ser oposição no Brasil?

Com o objetivo de atingir uma maioria numérica confortável no Legislativo, suficiente para aprovar reformas constitucionais, o presidente Lula convidou mais dois partidos para sua coalizão: PP e Republicanos. Vale salientar que esses partidos do Centrão eram, até recentemente, leais fiadores do governo de Jair Bolsonaro no Congresso.

Se as negociações se confirmarem, serão agora 16 partidos, além dos 14 (PT, PV, PCdoB, MDB, PSB, PSD, PDT, Rede, PSOL, União Brasil, Podemos, Avante, Solidariedade e PROS), que farão parte da coalizão do governo Lula 3.

Será a coalizão com o maior número de siglas e ideologicamente mais heterogênea da história do presidencialismo multipartidário brasileiro. Nessa salada partidária, tem legendas de extrema esquerda, de centro e de direita. A fonte de agregação não é ideológica nem programática, mas fundamentalmente busca pela sobrevivência.

Os únicos partidos que, até o momento, ficaram de fora da supercoalizão governista de Lula 3 foram PL, Novo, PSC, Patriota e a federação PSDBCidadania. Por que existem tão poucos partidos dispostos a ser oposição no Brasil?

Ser oposição não é para qualquer um. Seus legisladores têm de estar preparados, pelo período que durar essa condição, para “comer o pão que o diabo amassou”. Terão menos acesso a recursos de poder e financeiros controlados e alocados de forma discricionária pelo governo. Tais recursos serão primordialmente direcionados para os partidos aliados como uma espécie de bônus de ser governo.

Isso tornará os partidos de oposição menos competitivos no curto prazo e com mais dificuldades para sobreviver eleitoralmente. Por outro lado, pode ser também interpretado como um investimento. Por exemplo, o PT jogou o jogo de oposição de forma consistente por mais de 20 anos: desde sua fundação, em 1980, até 2003, quando finalmente ocupou a Presidência pela primeira vez. O investimento parece ter valido a pena, afinal já vão no 5.º mandato presidencial.

No presidencialismo multipartidário brasileiro, só tem incentivo para ser oposição o partido que tem ambições e condições de lançar um candidato competitivo à Presidência nas próximas eleições. Do contrário, vale muito mais a pena aceitar a oferta do presidente de plantão. Todos os incentivos, portanto, são para ser governo e não oposição.

Ainda não há certeza se essa supercoalizão de Lula 3 vai funcionar de forma coesa e disciplinada e se vai ser estável e sustentável ao longo do governo. De qualquer forma, o jogo do presidencialismo multipartidário voltou ao “business as usual”.l

Carlos Pereira, o autor deste artigo, é cientista político. Publicado originalmente n'O Estado de S. Paulo, em 04.08.23

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