segunda-feira, 19 de junho de 2023

Brasil fez acordo sigiloso com Arábia Saudita para suprir fábrica de explosivo

Governo brasileiro elevou autorizações de exportação de tecnologia militar para Arábia Saudita, durante gestão Jair Bolsonaro

Bolsonaro com Mohammed bin Salman, príncipe da Arábia Saudita (José Dias / PR)

Plantas devem atender toda a demanda militar do regime saudita por explosivos e espoletas de detonação de bombas.

O governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) consolidou um acordo sigiloso de exportação de produtos e tecnologias para a Arábia Saudita construir a sua primeira fábrica própria de explosivos militares. As plantas foram criadas por uma empresa brasileira sob demanda do regime saudita que pretende, até 2030, “suprir toda a demanda militar” do país por explosivos e espoletas de detonação de bombas, itens que podem ser úteis em guerras e conflitos no Oriente Médio.

A autorização para a venda de equipamentos e serviços ao regime de Mohammed Bin Salman foi concedida no segundo semestre de 2018, na reta final da gestão de Michel Temer. As principais etapas da construção se desenvolveram sob o governo Bolsonaro. Em paralelo, ele aumentou autorizações para exportação de tecnologia militar aos sauditas.

Com Bolsonaro, cresceu o interesse da indústria militar em negócios com a Arábia Saudita. A emissão de autorizações pelo governo brasileiro também. Os dados obtidos pelo Estadão são inéditos. Em 2019, 2020 e 2021 houve 21 pedidos de empresas à gestão Bolsonaro, dos quais 17 foram deferidos. Eram contratos para venda de armas, blindados, bombas e serviços. Nos anos anteriores, o interesse brasileiro no país foi menor. Entre 2017 e 2018, houve dez pedidos, sendo oito autorizados. Em 2015 e 2016, nenhum.

A empresa que pediu e recebeu autorização do governo brasileiro para fechar o contrato é a Mac Jee, com sede em São José dos Campos (SP). A estrutura montada tem cerca de 500 mil metros quadrados e fica dentro da Saudi Chemical Company Limited (SCCL), maior empresa de produção de energia civil e militar do país.

COMPONENTES. A fábrica produz TNT e RDX, componentes usados para determinados tipos de bombas. Todo o processo de autorização e de contratação é protegido por sigilo. Procurados, os ministérios que lidam com o tema informaram que não poderiam comentar motivações ou condições do acordo da Mac Jee. O valor do contrato é desconhecido.

Por serem armas consideradas de alto poder destrutivo, o governo brasileiro não poderia permitir a exportação em razão de acordos internacionais. Em 1995, o País assinou o Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis (MTCR), de não proliferação de armas de destruição em massa. Assim, o Brasil deveria ter pedido garantias da Arábia Saudita de que isso não ocorreria, sob pena de sanções. O governo diz não poder se manifestar. 

Contexto

O Estado de S. Paulo.19 Jun 2023

• O perigo do RDX

Em 2021, agências de inteligência americanas descobriram queoauditas estavam produzindo mísseis balísticos com a ajuda da China. O RDX poderia equipar ogivas.

• Viagens e joias

No período da construção da fábrica, várias comitivas foram a Riade. Em uma delas, joias avaliadas em R$ 5 milhões foram entregues ao ministro Bento Albuquerque, que tentou entrar com elas ilegalmente no Brasil.

Vinicius Valfré , o autor desta matéria, é Jornalista. Publicado originalmente n'O Estado de S. Paulo, em 19.06.23

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