quarta-feira, 31 de maio de 2023

Lula tapa o sol com a peneira

 Lula pediu que fosse cobrado; pois vamos cobrá-lo


Maduro e Lula no encontro da Unasul - (Ueslei Marcelino/Reuters)

Ao ver Lula e Maduro na maior confraternização, não há como não pensar: cadê um amigo para dar um toque? Não tem. Apoiadores e aliados políticos tratam o presidente como uma criança mimada que não deve ser contrariada. Imaginam que, com o silêncio, conseguem falsear apoio irrestrito do eleitorado às ações do presidente, quando, de fato, servem de trampolim para que ele se jogue na fogueira.

Lula, por sua vez, usa a Presidência em situações delicadas para fazer seu próprio cercadinho para o militante incondicional. Sabemos o que acontece com quem governa assim. Não pegou bem nem entre os líderes no encontro de sul-americanos. O uruguaio Luís Lacalle Pou, por exemplo, estranhou o encontro bilateral antecipado e o endosso de Lula de que a crise democrática na Venezuela é "narrativa": "É tapar o sol com a mão", disse Pou.

O festerê em torno do ditador venezuelano é um vexame mundial, mas principalmente um escárnio diante dos brasileiros que só apertaram 13 contra a ameaça de que o Brasil virasse exatamente o que foi feito no país vizinho, uma ditadura. A bajulação com a qual Maduro foi recebido parece desdém em relação a um momento em que os alicerces da nossa própria democracia ainda estão fragilizados depois do último governo e sua agenda golpista.

Os eleitores preferem tapar o sol com a peneira e se calam, porque criticar Lula seria engrossar o coro da oposição, que deita e rola. Mas silenciar diante do enaltecimento de um ditador é assumir a própria falta de compromisso com o fortalecimento de nossas instituições.

Em dezembro, ao anunciar seu ministério, Lula pediu que fosse cobrado. "Não deixem de cobrar, porque se vocês não cobram, a gente pensa que tá acertando. Quero dizer em alto e bom som: nós não precisamos de puxa-saco. Um governo não precisa de tapinha nas costas. Um governo tem que ser cobrado todo santo dia."

Pessoal, está liberado.

Mariliz Pereira Jorge, a autora deste artigo, é jornalista e roteirista de TV. Publicado originalmente na Folha de S. Paulo, edição impressa, em 30.05.23, às 19h15.

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