quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Bolsonaro critica ação da PF por medo de faltar patrocínio a atos golpistas

O presidente da República saiu, nesta quarta (24) em defesa de empresários bolsonaristas que foram alvo de operação da Polícia Federal, autorizada pelo STF, em meio à investigação do financiamento de ataques à democracia. 

Mostra-se, assim, preocupado com o patrocínio às micaretas golpistas que ele planeja para o 7 de Setembro.

Para tanto, cutucou os signatários da carta e do manifesto pela democracia e em defesa do sistema eleitoral brasileiro, que foram lançados na Faculdade de Direito da USP, em 11 de agosto, reunindo sociedade civil, acadêmicos e empresários.

"Somos ainda um país livre. Eu pergunto a vocês: 'O que aconteceu no tocante aos empresários agora?' Esses oito empresários. Dois eu tenho contato com eles, o Luciano Hang [Havan] e o Meyer Nigri [Tecnisa]. Cadê essa turminha da carta pela democracia? A gente sabe que, época de campanha, continuam lobos em pele de cordeiro. Acreditar que eles são democratas e nós não somos? Cadê a turminha da carta pela democracia?", afirmou em comício em Betim (MG).

Como escrevi aqui, nesta terça, a operação da PF é fundamental para entender se há ricos empresários apoiando ações antidemocráticas a serem realizadas no Bicentenário da Independência da mesma forma que houve aqueles que as bancaram no 7 de Setembro do ano passado. De aluguel de ônibus para transporte de manifestantes, fornecimento de carros de som e produção de material de divulgação - além de impulsionamento dos convites em redes sociais.

Vale ressaltar que golpismo deve ser investigado e, caso detectado, desarticulado no momento em que está sendo construído. Da última vez, isso não foi feito, e tivemos uma noite que durou 21 anos.

Por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, além de mandados de busca e apreensão, também ocorreram o bloqueio de contas bancárias, a suspensão de contas em rede sociais, a quebra de sigilo bancário e a tomada de depoimentos.

Entre os alvos da operação, além de Hang e Nigri, estão José Isaac Peres (Multiplan), Ivan Wrobel (W3), José Koury (Barra World Shopping), André Tissot (Grupo Seerra), Marco Aurélio Raimundo (Mormai) e Afrânio Barreira (Coco Bambu).

A série de reportagens de Guilherme Amado, Bruna Lima e Edoardo Ghirotto, no portal Metrópoles, mostrou as entranhas do grupo "Empresários & Política", confirmando que uma parte da elite econômica está agarrada ao capitão não apenas para garantir vantagens econômicas, mas por cumplicidade ideológica. No grupo, houve de tudo, de defesa de golpe de Estado até sugestão de compra de votos.

A pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, Moraes arquivou o inquérito dos atos antidemocráticos que corria no Supremo, em 2021, e atingia em cheio apoiadores e aliados do presidente Jair Bolsonaro, inclusive empresários. Mas determinou a abertura de uma outra investigação sobre a existência de uma organização criminosa que opera na disseminação de notícias falsas na forma de milícias digitais.

As ações contra os empresários beberam nesse inquérito e também devem subsidiá-lo. Caso a investigação descubra que houve transferência de recursos ou pagamento de fornecedores, os empresários devem ser corresponsabilizados pela violência gerada. A ação, em si, contudo, já tem poder de reduzir o financiamento a um 7 de Setembro golpista.

Aras, amigo de Nigri e aliado de Bolsonaro, entrou em embate público com Moraes por conta da operação da PF.

É pitoresco, por fim, que o presidente da República chame "a turminha da carta pela democracia" para ajuda-lo no momento em que seus aliados empresários são investigados por atacar a democracia. Convoca, assim, quem defende a tolerância para ajudar a garantir tolerância à intolerância.

Basicamente apela para o "paradoxo da tolerância". O problema é que se uma sociedade tolerante aceita a intolerância como parte da liberdade de expressão ela pode vir a ser destruída pelos intolerantes. Como analisou o filósofo Karl Popper, a liberdade irrestrita leva ao fim da liberdade da mesma forma que a tolerância irrestrita pode levar ao fim da tolerância.

E defesa de golpe e de golpistas é algo que não pode ser tolerado, pelo bem da tolerância e da democracia.

Leonardo Sakamoto, o autor deste artigo, é colunista do UOL. Publicado originalmente em 24.08.22. às 18h17. Atualizado em 25.08.22, às 07h15.


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