Começo o dia cedo, mas já devendo à vida seis quilômetros de caminhada. Vem chuva muita aí. Então, definitivamente, não vai dar. Sair de casa agora para fazer a caminhada, nem pensar.
À tarde, quando venço aquelas urgências que os outros inventam e nos impõem, e muitas delas até que caberiam melhor em algum outro relógio no dia seguinte, e se não há chuva, me alegro muito.
Alcanço o sol poente e em passos rápidos vou deixando que o mar com sua língua de cão imenso, língua de ondas que se diluem em espumas brancas, alcance os meus pés descalços.
Voltando, meia hora depois, terei pagado à vida mais seis quilômetros de caminhada. Ao todo, doze quilômetros.
Ontem o radiologista me telefonou apreensivo dizendo que a chapa que ele bateu semana antes indicava alguma anormalidade no meu pulmão esquerdo. Na conclusão dele, é claro.
No tira – teima a tomografia computadorizada, mostrando agora os pulmões coloridos, bacanas, parecendo uma pintura moderna, expressionista, dando vontade até de colocá-la numa moldura e pendurá-la num lugar nobre da parede, essa tomografia agora me tira um pouco do sério.
Na pior das hipóteses, imagino, não consigo me imaginar respirando só pela direita. E olha que há mais de quarenta anos odeio cigarro.
A nicotina me pegou quando logo nos primórdios do golpe militar me levaram preso. Eu sofria de um amor platônico pela irmã de um amigo e deu que ela um dia, na companhia da mãe, numa tarde de visitas, me apareceu deixando-me de presente, adivinha aí, um pacote de cigarros.
Cigarro aceso entre o indicador e o polegar, pensando nela, quanta sorte eu tenho, vejo hoje, me sentia o próprio Fernando Pessoa nestes versos:
“E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria. / (...) Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando. / ( Ah se eu casasse com a filha da minha lavadeira... Talvez fosse feliz.) /Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou á janela.”
Depois, no poder, numa noite num jantar, o Lula me ofereceu um charuto, eu recusei gentilmente, ele me disse que era menos ofensivo, eu acrescentei, porém mais caros, ele me disse que caros que nada e me deu a pista. Quando souberem que gostas, receberás de presente. Não deu outra.
Até de Cuba ganhei caixas de charutos. O Emerson Fittipaldi me visitando uma vez me presenteou com charutos de sua grife. Todos os charutos que me davam, eu os repassava ao Lula.
Há mais de quarenta anos que eu me libertei do tabaco. Há mais de quarenta anos que tenho horror a fumaça de cigarro, a bafo de nicotina e tenho pena dessas meninas que eu vejo por aí fumando e das mulheres no geral de voz grossa que até são fortes noutros embates, menos nesse de largar de fumar.
O que eu devo ter no pulmão esquerdo é um resto de tango argentino que eu aspirei numa noite na Avenida Corrientes, tango o qual, na volta ao Maranhão, um dia ainda acabarei de cantar.
Agora aqui da janela do meu quarto eu vejo as nuvens trazendo as chuvas, mas por decreto estamos no verão. O horário é de verão.
Agora na Ilha do Amor, São Luis do Maranhão, onde chove quase o ano inteiro, os movimentos sociais anunciam o começo da primavera. Uma primavera tipo carnaval fora de época. Com muitas emoções fortes e esperanças bastante verdes. Que nem essa que ultimamente vem derrubando ditaduras e oligarquias no mundo árabe.
À tarde, quando venço aquelas urgências que os outros inventam e nos impõem, e muitas delas até que caberiam melhor em algum outro relógio no dia seguinte, e se não há chuva, me alegro muito.
Alcanço o sol poente e em passos rápidos vou deixando que o mar com sua língua de cão imenso, língua de ondas que se diluem em espumas brancas, alcance os meus pés descalços.
Voltando, meia hora depois, terei pagado à vida mais seis quilômetros de caminhada. Ao todo, doze quilômetros.
Ontem o radiologista me telefonou apreensivo dizendo que a chapa que ele bateu semana antes indicava alguma anormalidade no meu pulmão esquerdo. Na conclusão dele, é claro.
No tira – teima a tomografia computadorizada, mostrando agora os pulmões coloridos, bacanas, parecendo uma pintura moderna, expressionista, dando vontade até de colocá-la numa moldura e pendurá-la num lugar nobre da parede, essa tomografia agora me tira um pouco do sério.
Na pior das hipóteses, imagino, não consigo me imaginar respirando só pela direita. E olha que há mais de quarenta anos odeio cigarro.
A nicotina me pegou quando logo nos primórdios do golpe militar me levaram preso. Eu sofria de um amor platônico pela irmã de um amigo e deu que ela um dia, na companhia da mãe, numa tarde de visitas, me apareceu deixando-me de presente, adivinha aí, um pacote de cigarros.
Cigarro aceso entre o indicador e o polegar, pensando nela, quanta sorte eu tenho, vejo hoje, me sentia o próprio Fernando Pessoa nestes versos:
“E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria. / (...) Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando. / ( Ah se eu casasse com a filha da minha lavadeira... Talvez fosse feliz.) /Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou á janela.”
Depois, no poder, numa noite num jantar, o Lula me ofereceu um charuto, eu recusei gentilmente, ele me disse que era menos ofensivo, eu acrescentei, porém mais caros, ele me disse que caros que nada e me deu a pista. Quando souberem que gostas, receberás de presente. Não deu outra.
Até de Cuba ganhei caixas de charutos. O Emerson Fittipaldi me visitando uma vez me presenteou com charutos de sua grife. Todos os charutos que me davam, eu os repassava ao Lula.
Há mais de quarenta anos que eu me libertei do tabaco. Há mais de quarenta anos que tenho horror a fumaça de cigarro, a bafo de nicotina e tenho pena dessas meninas que eu vejo por aí fumando e das mulheres no geral de voz grossa que até são fortes noutros embates, menos nesse de largar de fumar.
O que eu devo ter no pulmão esquerdo é um resto de tango argentino que eu aspirei numa noite na Avenida Corrientes, tango o qual, na volta ao Maranhão, um dia ainda acabarei de cantar.
Agora aqui da janela do meu quarto eu vejo as nuvens trazendo as chuvas, mas por decreto estamos no verão. O horário é de verão.
Agora na Ilha do Amor, São Luis do Maranhão, onde chove quase o ano inteiro, os movimentos sociais anunciam o começo da primavera. Uma primavera tipo carnaval fora de época. Com muitas emoções fortes e esperanças bastante verdes. Que nem essa que ultimamente vem derrubando ditaduras e oligarquias no mundo árabe.
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